Monday, 30 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

O que as pesquisas de opinião não esclarecem

Existem temas que permeiam o nosso dia-a-dia (por exemplo, aquecimento global, efeito estufa, mudanças climáticas), mas que, para muitos de nós, são identificados como termos ouvidos na mídia (repetidos sistematicamente), mas que, realmente, não sabemos (em essência) ao que eles se referem. Ou seja, temos na lembrança os termos ouvidos, mas não sabemos a que exatamente estes se referem e qual o reflexo na vida de cada um de nós. Digamos que somos alimentados pelos nossos ouvidos, mas não temos a real noção do que estes temas realmente são.

Um bom momento para analisar resultados de uma pesquisa realizada em âmbito nacional, nos atendo não apenas aos resultados, mas procurando ir além dessa análise. Um dos questionamentos era sobre se o entrevistado estava preocupado com o aquecimento global. Na pesquisa, realizada em 2010, o resultado foi de 80%, evoluindo para 94% em 2011. Outra pergunta era sobre a gravidade das mudanças climáticas. Em 2012 os entrevistados indicaram (65%) que o problema deveria ser considerado como muito grave. Outro questionamento procura saber a opinião da participação do homem em relação ao aquecimento global. Em 2010, os entrevistados confirmaram o efeito do homem em 78%, sem mudança significativa em relação a 2011, quando o valor foi de 79%.

Aquecimento global / Foto Flickr / CC

Mapa do aquecimento global em 2015  / Foto NASA, via Flickr / CC

Analisados estes números – plenamente respaldados por uma pesquisa séria – cabe avaliar que tipo de entrevistado atendeu aos pesquisadores que foram às ruas obter as informações. Seriam do tipo “sei o que é e posso explicar a que o assunto se refere” ou do tipo “sei o que é, dado que escuto diariamente falar sobre eles”. No primeiro grupo estão aqueles que conhecem o assunto e, portanto, têm condições de assumir posições no que diz respeito ao debate decorrente da procura de soluções que possam minimizar os efeitos do aquecimento global. No segundo grupo, os que não têm condição de participar dessa discussão, pois, a priori, não sabem o que se está discutindo. Um bom momento para perguntar: em que categoria você está inserido?

Uma operação de conscientização/sensibilização

Estamos tratando de um assunto que efetivamente está relacionado à saúde e a qualidade de vida das futuras gerações. Nesta linha de raciocínio, foi desenvolvida uma pesquisa em 2010, no âmbito da Grande Vitória, que procurou separa os dois grupos explicitados acima. De início, o entrevistado explicitava se tinha ou não preocupação com o aquecimento global. Em seguida, era entrevistado por outro pesquisador que pedia que o entrevistado explicasse, com as suas palavras, o que ele entendia por aquecimento global. Para simplificar a explicação, tal comparação demonstrou que pouco mais da metade dos entrevistados conseguiu explicar aquilo que, na pergunta anterior, havia explicitado ter preocupação com o mesmo. Ou seja, será possível que o grupo que não conseguiu, com suas próprias palavras, explicar em que consistia o termo mudanças climáticas, esteja realmente preocupado com o assunto e, sobretudo, preparado para uma discussão que a sociedade já deveria estar envolvida há algum tempo?

Tenho minhas dúvidas se a maioria da sociedade sabe a diferença entre aquecimento global (origem do problema), efeito estufa (processo que explica o fato) e mudanças climáticas (efeitos que são percebidos da ocorrência do problema). Não quero que este artigo desponte como uma visão pessimista para o fato em discussão, mas, sobretudo, que seja um alerta indicativo para os gestores públicos (federal, estaduais e municipais) que precisam dar condições à sociedade para que possa entender e participar das discussões em andamento. Esta operação de conscientização / sensibilização deve passar pelos nossos educadores (em todos os níveis de ensino), especialistas em proposição de políticas públicas, órgão gestores da política ambiental e também das pessoas que são formadoras de opinião na sociedade.

***

Roosevelt S. Fernandes é pesquisador e membro do Conselho Estadual de Meio Ambiente – Consema e do CERH