Desde 1988, profissionais e pesquisadores acadêmicos que lidam com Comunicação Social no Brasil esperam por uma definição clara sobre os sistemas de radiodifusão inseridos no artigo 223, caput, da Constituição Federal: privado, público e estatal. Aliás, esse é um dos muitos dispositivos constitucionais que os parlamentares se esqueceram ou não se interessaram em regulamentar.
Até então, o significado de público ainda se confundia com o estatal. Ou seja: se pertencia ao aparato da instituição Estado, então era considerado público, pois ali era aplicado dinheiro público.
Esse entendimento foi revigorado em abril de 2019 com a decisão do governo federal de unificar as emissoras da TV Brasil (considerada por muitos uma TV pública) e a puramente estatal, NBR.
Já o sistema privado dispensa apresentações, uma vez que tradicionalmente tem a hegemonia no modelo brasileiro. Dele fazem parte aquelas emissoras de rádio e televisão que funcionam por concessão estatal de exploração, com recursos próprios arrecadados com propaganda e prestação de serviços variados.
Mas o que teria feito o constituinte inovar, ao destacar o sistema público do estatal? E, afinal, o que é um sistema de radiodifusão público?
As entidades representativas que, durante a Assembleia Constituinte (1987-88), defendiam a democratização da Comunicação Social, depois de mais de duas décadas de regime de exceção, lutaram arduamente para que o Brasil privilegiasse o caráter público, em detrimento do privado, já que a radiodifusão utiliza o espectro eletromagnético – que é patrimônio público -, por onde trafegam as informações geradas pelas emissoras.
Porém, os representantes das empresas privadas de comunicação (cerca de onze famílias) astutamente conseguiram que, em lugar de serem forçadas a adotar uma linha mais voltada aos interesses públicos em detrimento do lucro comercial, fosse criado o conceito de um sistema público, independente e autônomo financeiramente.
Mais de trinta anos depois, percebemos que o que parecia um avanço se constituiu uma armadilha fatal. A radiodifusão pública já nasceu morta.
Como ainda não foi regulamentada, não há formas dela se financiar. Se recebe verba estatal, fica dependente dos mandatários de plantão. Se apelar para a propaganda (seja ela qual for), sempre vai dar motivo para desconfiança.
Do ponto de vista do modelo de gestão e financiamento, podemos concluir que, pelas regras atuais, nosso país ainda não conta com um sistema público de radiodifusão.
Engraçado que, alguns anos depois, aquelas entidades da iniciativa privada usaram o mesmo modus operandi em relação à Lei de Cabodifusão (8.977/1995).
Elas “aceitaram” que as operadoras de TV a cabo cedessem canais gratuitos nos pacotes básicos para que universidades, associações comunitárias e parlamentos pudessem transmitir conteúdos próprios.
Dessas novas emissoras, só as legislativas vingaram, por ter verba do orçamento público. As demais ficaram no caminho, entre a boa intenção, o discurso democratizante e a crônica falta de recursos que não as deixam usar esse direito.
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Luiz Carlos Santana de Freitas é jornalista, mestre em Comunicação Social (UNB) e professor.