Os jornalistas Lucas Mendes (GloboNews, Brasil), Simon Romero (The New York Times, EUA), Raúl Peñaranda (Página Siete, Bolívia) e Mark Stevenson (Associated Press, EUA) foram os vencedores da 77ª edição do Prêmio Maria Moors Cabot de Jornalismo, que reconhece o trabalho de profissionais da área para um maior entendimento e integração entre as Américas. Ernesto Londoño (The New York Times, EUA) recebeu menção especial. A cerimônia de premiação foi realizada nesta quarta (14/10), na Low Memorial Library, na Universidade de Columbia, em Nova York.
O mineiro Lucas Mendes acabou indo parar no jornalismo por acaso – queria ser diplomata, mas quando estava no Rio de Janeiro surgiu a oportunidade de trabalhar como repórter nas revistas Fatos & Fotos e Manchete, da Bloch Editores. Em 1968, ganhou uma bolsa do World Press Institute para ficar um ano nos EUA. Desde então vem contribuindo para “traduzir o Norte para o Sul”, nas palavras do presidente da Universidade da Columbia, Lee C. Bollinger, que apresentou os vencedores na cerimônia. Durante sua carreira, Mendes cobriu eventos históricos, como a Revolução Sandinista, na Nicarágua, a explosão do ônibus espacial Challenger, o caso Watergate, o atentado às Torres Gêmeas, dentre outros. Além disso, entrevistou personalidades e figuras públicas como o cineasta Woody Allen, o pugilista Muhammad Ali e o líder palestino Yasser Arafat. Há 23 anos comanda o programa semanal Manhattan Connection, exibido atualmente na GloboNews.
Em seu discurso, Mendes fez um retrospecto das mudanças que testemunhou desde sua viagem, em 1969, para o sul dos EUA com um grupo de jornalistas internacionais, quando o proprietário de uma lanchonete recusou-se a lhes servir café porque no grupo havia um negro. “Passados 45 anos, um presidente negro pode ter seu café servido na Casa Branca. Essa foi uma das mudanças mais poderosas e positivas que vi na minha vida”, disse. “Hoje estou aceitando esta honra durante um ciclo eleitoral quando há a possibilidade da primeira mulher presidente suceder o primeiro presidente negro”.
Mendes também lembrou o jornalista Paulo Francis, que participou da primeira formação do Manhattan Connection e denunciou a corrupção na Petrobras nos anos 90. Dois meses após ser processado em US$ 110 milhões, morreu de ataque cardíaco sem nunca ter revelado suas fontes. “Hoje a Petrobras está na mira do maior escândalo da história brasileira, conhecido como Lava-Jato. De um modo, Francis foi um profeta”, afirmou.
Simon Romero é atualmente chefe do escritório do New York Times no Brasil, sendo responsável pela cobertura de outros países da América do Sul, como Argentina, Chile, Paraguai e Uruguai. Há mais de duas décadas vem cobrindo a América Latina nos mais variados temas, incluindo coberturas politicamente sensíveis na Venezuela, Bolívia e Colômbia.
No painel realizado no dia anterior à cerimônia de premiação para alunos da Escola de Jornalismo da Columbia, Romero falou sobre sua paixão por reportagens mais aprofundadas e revelou que, se não fosse jornalista, teria sido antropólogo. Ele comentou, ainda, sobre o destaque cada vez maior que o Brasil vem recebendo na mídia mundial. “O apetite pela leitura sobre o Brasil aumentou nos últimos anos e o momento político atual é muito interessante de se acompanhar. Quando assumi o cargo de chefe do escritório do NYTimes no Brasil, em 2011, nada poderia dar errado, outros países da América Latina o viam como um exemplo. Testemunhar essa mudança radical, especialmente neste último ano, é algo singular”, afirmou. “Uma das coisas fascinantes sobre cobrir o Brasil, por exemplo, é que os grandes jornais brasileiros leem cada palavra do que escrevo e acabam fazendo matérias sobre as minhas matérias, ou até mesmo editoriais. Isso me deixa sempre alerta”.
Raúl Peñaranda foi o terceiro boliviano na história do Maria Moors Cabot a ser laureado com o prêmio. Ele criou três veículos de mídia independentes na Bolívia: Nueva Economia, La Época e Página Siete. O último, planejado enquanto estava na Universidade de Harvard, financiava iPads para leitores a fim de construir uma audiência e aumentar o acesso à web. Sua posição crítica ao governo de Evo Morales fez com que ele fosse perseguido pelo regime. “Para muitos bolivianos, Morales é um herói, o primeiro presidente de origem indígena em um país de maioria indígena. Quando você escreve algo crítico a ele, a maior parte da população não acredita”, disse no painel.
Mark Stevenson cobre o México há mais de duas décadas, tendo ido aos locais mais perigosos do país. “Dos 64 jornalistas mortos no México desde 2000, todos eram mexicanos. A imprensa mexicana deu grandes passos nas últimas décadas, mas eles não podem fazer o trabalho se têm de se preocupar sobre a possibilidade de serem mortos”, lamentou, em seu discurso. Stevenson doou o valor do prêmio (US$ 5 mil) para o Comitê de Proteção a Jornalistas (CPJ).
Ernesto Londoño é o membro mais jovem do conselho editorial do NYTimes e recebeu menção especial por sua série de editoriais sobre Cuba. Após ter trabalhado na última década como repórter, nunca tinha pensado em escrever nas páginas de opinião do jornal. “Quando me ligaram para fazer o convite, achei que era um engano. Começamos com uns testes e, para minha surpresa, gostei muito. As pessoas não têm noção do quanto de reportagem está envolvido ao fazer um editorial”, contou ao grupo de estudantes no painel.
O prêmio Maria Moors Cabot foi criado em 1938 pelo empresário e filantropo Godfrey Lowell Cabot em memória à sua esposa, com o objetivo de promover a causa da liberdade de imprensa e democracia nas Américas. Cabot trabalhou em diversos países da América Latina, incluindo México, onde conheceu sua mulher, e Brasil, onde nasceu John G. L. Cabot, filho do casal. É considerada a premiação de jornalismo internacional mais antiga do mundo, sendo conferida anualmente pela Escola de Jornalismo da Universidade de Columbia. Os vencedores desta edição receberam uma medalha de ouro e US$ 5 mil.
Confira os brasileiros premiados em edições anteriores:
Mauri König, (Gazeta do Povo, 2013), Merval Pereira (O Globo, 2009), José Hamilton Ribeiro (TV Globo, 2006), Miriam Leitão (O Globo, Rede Globo, Rádio CBN, 2005), João Antônio Barros (O Dia, 2003), Clóvis Rossi (Folha de S.Paulo, 2001), Ricardo Arnt (Folha de S.Paulo, 1991), Gilberto Dimenstein (Folha de S.Paulo, 1991), Otavio Frias Filho (Folha de S.Paulo, 1991),Carlos Eduardo Lins da Silva (Folha de S.Paulo, 1991), Roberto Civita (Veja, 1988), Luiz Fernando Levy (Gazeta Mercantil, 1987), Roberto Muller (Gazeta Mercantil, 1987), Paulo Sotero (Gazeta Mercantil, 1987), Carlos Castello Branco (Jornal do Brasil, 1978),Fernando Pedreira (O Estado de S.Paulo, 1974), Alberto Dines (Jornal do Brasil, 1970), Alceu Amoroso Lima (ensaísta e crítico literário, 1969), M.F. Nascimento Brito (Jornal do Brasil, 1967), Roberto Marinho (O Globo, 1957 e 1965), Hernane Tavares de Sá (Visão, 1959), Herbert Moses (ABI, O Globo, 1957), Breno Caldas (Correio do Povo, 1955), Danton Jobim (Diário Carioca, 1954), Carlos Lacerda (Tribuna da Imprensa, 1953), Belarmino Austregésilo de Athayde (Diário da Noite, 1952), Elmano Cardim (Jornal do Commercio, 1951), Orlando Ribeiro Dantas (Diário de Notícias, 1948),Francisco de Assis Chateaubriand (Diários Associados, 1945), Paulo Bittencourt (Correio da Manhã, 1941), Sylvia Bittencourt (Correio da Manhã, 1941).
Leia mais
* **
Larriza Thurler é jornalista freelancer , doutoranda em Ciência da Informação e analista em Gestão do Conhecimento