Thursday, 19 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1318

O demiurgo desenhista

O nosso espaço, que nós não jornalistas também ocupamos eventualmente sem muita cerimônia, muitas vezes não pode ficar restrito ao jornalismo. Muitas vezes as idéias são as que permeiam a sociedade e que o jornalista acaba dando eco. Dando voz. E para tal, nunca é demais abordar conceitos deste tipo.


O professor e pesquisador em História da Ciência Enézio Eugênio de Almeida Filho, Campinas-SP – em comentário enviado em 18/4/2009 às 10:16:04 AM, pede para ‘apontar onde neste OI houve alguma intervenção minha defendendo o fundamentalismo bíblico na sociedade e na ciência?’


Parece que são duas coisas indistintas, como fala o professor de história da ciência. Uma, a Bíblia, e outra a idéia de que exista um, agora chamado por novo nome, desenhista, que alegam os seus proponente, que seja inteligente, esquecendo os tantos erros. Eu declino desta qualidade, pois existem tantos erros, tantas doenças, tantas extinções, que atribuir isto a uma inteligência configura-se improvável.


‘Se não puder apontar isso no OI ou no meu blog … o sr. é encontrado em descompasso com a verdade, e me deve desculpas aqui neste espaço.’ (Suprimi a propaganda do blog).


Então temos o desafio de buscar alguma parte científica no discurso do pós-darwinismo. Se ele de fato é um avanço proposto pelos especialistas na academia, pelos naturalistas, pelos biólogos, paleontólogos, arqueólogos, antropólogos, geólogos, médicos, zoólogos, evolucionistas etc…


Inteligência discutível


O professor Enézio Eugênio faz uma interessante análise usando conceitos de Popper. Mas única e exclusivamente na ciência, em Darwin, nos achados arqueológicos. Mas, interessante, jamais nas suas propostas. A de que exista na verdade algo de novo, algo genuinamente pós-darwinista. Ele não apresenta uma explicação, como é necessário, para que uma teoria comece a tomar corpo. Ela não cria nenhum conhecimento alternativo que amplie o entendimento dos fatos. Ele não aplica os conceitos de falseabilidade nas suas bases de alegação.


O que nos propõe os defensores do desenhista inteligente de novidade? Recapitulando a história da humanidade, da religião e da ciência, sempre o homem atribuiu aos espíritos, o animismo, ao invisível, aos seres sobrenaturais. O demiurgo, o artífice ou criador, em alguns sistemas de crenças, é a deidade responsável pela criação do universo físico. Esta foi a primeira explicação para o mundo e a primeira maneira dele negociar com a natureza para tentar dominá-la, mais precisamente negociar por processos mágicos os seus favores e proteção. As primeiras explicações do funcionamento do vento, do rio, das marés, da existência das montanhas ou os habitantes da floresta escura que acreditava existir, mas não enxergava. Na história da humanidade estes seres intervencionistas obtiveram uma infinidade de nomes. Milhares. Nomes muitos perdidos no tempo, outros ainda adorados em recantos escuros, alguns ainda em livros de crianças e catecismos.


Voltando então ao desafio do professor Enézio Eugênio, podemos afirmar que não é uma entidade nova que eles estão propondo. Não é uma ‘nova’ explicação que leva a pretensão do darwinismo ser refutado. É na verdade uma muito antiga, muito surrada, muito desmentida na história da ciência (note que ele é mestre nela).


Mudar os nomes não muda as teorias. Chamar demiurgo, grande arquiteto do universo, o maior médico, o criador, o rei dos reis, o grande engenheiro não cria uma entidade diferente. Todas são a mesma coisa que um desenhista, de inteligência, como já disse, discutível.


Dificuldade em desvendar os mecanismos


Quais indícios desta entidade que foram achados pelos adeptos do neocriacionsimo? Simplesmente mais uma vez nenhuma. Qual o mecanismo que só poderia ter sido criada por esta entidade sem provas? Também não sabem explicar, não sabem como, aonde, por que… E, por justamente não terem prova alguma de nada, alegam que só pode ter sido criada por um ser organizador inteligente. Lembra no início do texto para como se explicava a montanha? A mesma prova tirada do baú neanderthal agora usada pelo professor de história da ciência. Que agora sim, agora é definitivo, agora é chegada à hora de ver Ele, o Desenhista que ele negava quando marxista. Por desconhecermos como se dá agora este mecanismo, que já não sabíamos há cinco mil anos, que não conhecíamos há cem anos, agora é a prova de que Ele se revelou entre nós. Fora da academia, é claro! Por que lá, ele mais de uma vez reclamou, não lhe deram importância pelas suas faltas de evidências que ele alega ser a prova de existência d’Ele.


De onde vem esta idéia de seres invisíveis que agem no mundo natural, que são inteligentes, que não podemos vê-los, mas estão agindo nas nossas costas, para o nosso sucesso ou nossa infortúnio? Está apenas no imaginário mitológico e na religião. Filosoficamente e cientificamente é um conceito insustentável. Já se recorreu por milhares de anos, por milhares de fórmulas mágicas, por milhares de textos e nunca passou de alegações apenas.


William Paley (14 de julho de 1743-25 de maio de 1805), teólogo e filósofo britânico, já fez argumento parecido trocando as palavras de ratoeira para relógio ‘Não posso imaginar que este relógio exista e não haja relojoeiro’. Parece lógico a princípio se nós que conhecemos relógio, o víssemos. Mas nenhum nômade do deserto há cinco mil anos diria isto. Ele não faria a mínima idéia o que era, o que seria um relojoeiro, e nem como materiais como aqueles poderia ter sido criados, polidos, montados, lustrados, que uso poderia vir a ter para pessoas. Muitas ferramentas que hoje possuímos, materiais que desenvolvimentos e uso que conhecemos lhe dão sentido. Mas não daria sentido para eles de algo que levou cinco mil anos para se gerar além do seu tempo. Entender mecanismo que levaram milhões de anos também contam com esta dificuldade de entendimento. Não temos as ferramentas, os materiais adequados, o tempo necessário ainda para desenvolvê-los e conhecimento do que ocorreu com tudo no passado de milhões de anos. Quanto mais passamos da ocorrência dos eventos, mais dificuldades encontramos em desvendá-los e entender os seus mecanismos.


Nomenklatura científica


Veja exemplos claros disto na prática de alguns polinésios terem desenvolvido imagens de palha e madeira imitando aviões, que pensavam ser deuses. Os americanos receberam sem restrições aqueles seres brancos vindo em veículos divinos (as caravelas) imponentes inacessíveis ao entendimento humano.


Não se pode dizer com bom censo que ‘não é possível’! Que as coisas naturais se comportassem como não naturais no passado, e necessitassem d’Ele, do desenhista para fraudar a natureza de vez em quando. O fato mais normal, os fatos da história da ciência, de que ignoramos os mecanismos, não nos autoriza a defender a intervenção divina como solução coringa.


Não é uma idéia pós-dawinista, mas uma idéia pós-Pitecantropos Erectus quando os neanderthais e os Homens de cro-magnon já começavam a enterrar seus mortos num prototeísmo. E que encontramos no ocidente elaborado na Bíblia. Visto que outras religiões se compatibilizam com a idéia de evolução.


O uso de Popper, da teoria da ciência, não pode ser usado apenas para as hipóteses em vigor, como defendem os autoproclamados pós-darwinistas. Elas devem ser usadas em todas as hipóteses. As novas também. E, no caso, nem mesmo nova possuímos ao apelarmos apenas para o argumentum ad ignorantia pela milionésima vez.


Em ‘MÍDIA & CRIACIONISMO – O debate científico que ainda não ocorreu’, no OI, em 23/2/2009, o professor de história da ciência, chama os seus colegas: biólogos, paleontólogos, arqueólogos, antropólogos, geólogos, médicos, zoólogos, evolucionistas, de nomenklatura científica e a GMT (Grande Mídia Tupiniquim) que instalaram uma kulturkampf no Brasil.


O fim da bandarrice


Junto com seus correligionários não acadêmicos e teólogos, no OI ‘Rivalidade ou mal entendido?’ http://www.teste.observatoriodaimprensa.com.br/artigos.asp?cod=525MOS001, da jornalista Ágatha Lemos, ‘A Darwin o que é de Deus’ http://www.teste.observatoriodaimprensa.com.br/artigos.asp?cod=525MOS003, do pastor Douglas Reis, ‘Endeusando Darwin em clima de guerra’ http://www.teste.observatoriodaimprensa.com.br/artigos.asp?cod=525MOS004, do jornalista Michelson Borges, estudante de teologia.


A ‘Grande Mídia Tupiniquim (GMT)’ ‘Polarizaram novamente a questão como sendo apenas ciência (racional) versus religião (irracional),’ cita o professor Enézio.


‘Nesse ponto, cabe citar as palavras de Stengers, na passagem em que ela se refere à frase de Butler anteposta aqui como epígrafe. Escreve ela: ‘Nada é mais temível […] que […] o convertido que se volta ferozmente ou devotamente contra aqueles que permaneceram na ilusão da qual ele acaba de se afastar’ (citação tirada de MÍDIA & RELIGIÃO Réplicas a críticas – http://www.teste.observatoriodaimprensa.com.br/artigos.asp?cod=534MOS002). Cabe muito bem no pensamento e nas palavras do confesso marxista arrependido e ex-ateu, o professor Enézio Eugênio de Almeida Filho, ao atribuir o totalitarismo marxista na academia pelos seus pares, que são, afinal, realmente afeitos ao tema que não lhe pertence na sua especialidade, e que me solicita que diga aonde ele defende a Bíblia em algum lugar. Academia esta que Maurífico Tuffani chamou de Torre de Marfim, pois lá que se dão as discussões entre os entendidos e estudiosos, em contrapartida para onde os criacionistas apelam para a conversão, junto ao populum, aos jornalistas leigos (como tem teólogos!), junto a população não acostumada a estes temas exaustivos e áridos.


Desconfortável com a minha oposição mostrando isto, e para mostrar que tipo e nível de dialogo o mesmo tenta impor na verdade, cabe verificar no seu blog a matéria: Será o fim da bandarrice no Observatório da Imprensa? (http://pos-darwinista.blogspot.com/2009/04/sera-o-fim-da-bandarrice-no.html ) Inclusive nos brinda com informações sobre as acepções da palavra Bandarra, meu sobrenome. Decerto considerado pertinente ao assunto pelo professor Enézio Eugênio. Vale a pena conferir.


Em busca das pegadas


Para mostrar que realmente a religião produz cidadãos mais tolerantes, seu colega e concidadão, professor de História, filósofo de Campinas, nos dá um exemplo como isto é realidade aqui no OI em duas matérias, primorosos pela profundidade filosófica e pela capacidade de estimular idéias:


MÍDIA & RELIGIÃO – Intolerância religiosa e intolerância anti-religiosa


por Pedro Eduardo Portilho de Nader em 7/4/2009


(http://200.226.127.23/artigos.asp?cod=532MOS001 )


Texto este amplamente divulgando entre blogs de criacionistas e religiosos.


MÍDIA & RELIGIÃO – Réplicas a críticas


por Pedro Eduardo Portilho de Nader, em 21/4/2009


( http://www.teste.observatoriodaimprensa.com.br/artigos.asp?cod=534MOS002)


No primeiro se excedeu, no segundo partiu para a briga. E, entre pessoas civilizadas, aquelas, como o meu caso, que não concordam com o sacrifício animal por motivo religiosos, procuram resolver as suas diferenças em outro local mais apropriado.


Realmente nada mais chato do que ex-fumante. Nada mais ‘cacete’ do que médico que vive mandando parar de fumar, de beber, falando contra o uso de drogas, contra comer demais. Um membro do exército da salvação pregando na porta do prostíbulo. É um cara antipático mesmo. Mas isto não muda o mal que se faz mesmo em moderados e que deixem de ser drogas que iludem. Não é porque o publicitário é um grande sujeito, um amigo batuta, um devoto, que a sua propaganda deixará de ser apenas propaganda. Quem não lembra daquele amiginho chato que vivia estragando o Natal contando que Papai Noel não existia? Ninguém gostava dele. Era um tempo feliz. Sem preocupações. A comida aparecia. Não se tinha obrigações. Não tínhamos que trabalhar. Tudo era nos dado de graça. Muitas pessoas não conseguem se livrar desta vida emocional. Reúnem-se e procuram reconstruir uma casinha para ele voltar. Enfeitam-na toda. Constroem do maior tamanho pensando que as recompensas serão retribuídas em igual fartura. Para trazer presentes de novo. Para dar uma vida garantida. Para solucionar os problemas. Para que a vida nunca acabe, e se viva eternamente. Nesta busca vã, se busca na natureza as pegadas daquele ser que iria proporcionar este final feliz para a vida.

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Médico, Porto Alegre, RS