Thursday, 26 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Google começa a aplicar o ‘direito ao esquecimento’

O Google já recebeu mais de 70.000 petições de internautas para retirar assuntos que os afetam em aplicação do direito ao esquecimento reconhecido pelo Tribunal Europeu. Em 30 de maio publicou um formulário para que os usuários europeus possam solicitar a eliminação dos resultados do buscador ligados a seus nomes. Conforme anuncio o Google, cada pedido será analisado de forma individual.

A britânica BBC foi a primeira a receber uma notificação do Google, sobre uma postagem de 2007 sobre um antigo chefe de investimentos da Merrill Lynch. Robert Peston, autor da matéria, demonstra seu mal-estar e considera que a sentença obriga o Google a apagar dados “insuficientes, irrelevantes ou que não são relevantes” quando alguém solicita. O jornalista argumenta que o artigo sobre Stan O’Neal, ex-diretor da firma de investimentos, mantém seu interesse e não merece desaparecer: “Um financista de alto nível, que segue no espectro público e que teve papel relevante em uma das piores crises financeiras que se teve notícia tem que aparecer nos resultados”. Na sua opinião esta medida servirá para podar a liberdade de expressão.

O caso do The Guardian, com seis petições, é variado. Três têm a ver com a reputação de um árbitro escocês, Dougie McDonald, que em 2010 pediu demissão após mentir sobre um pênalti. Os outros três são de matéria do comentarista de comunicação Roy Greenslade, a tentativa de fraude de um político em 2002 em uma curiosa história de alguns funcionários franceses que dedicaram-se a dar asas à imaginação com os post-its no escritório.

Nenhum dos meios de comunicação recebeu explicação a respeito. O curioso é que os resultados das buscas continuam aparecendo no site google.com. Por outro lado, se as buscas são feitas no site google.co.uk, a versão britânica, as notícias já não estão mais. Outra opção para acessar as notícias é buscar em inglês os termos “árbitro escocês que mentiu” ou “funcionários franceses com post it”. Desta forma, as notícias aparecem. Ou seja, o Google elimina dos resultados caso apareça o nome da pessoa afetada que efetuou a petição, mas não se é feita uma referência ao caso ou notícia.

“Julgamentos difíceis”

Martin Clarke, diretor do Daily Mail, jornal que também recebeu a notificação do Google a respeito de várias matérias sobre o já citado árbitro, vai além: “É como entrar em uma biblioteca e queimar os livros de que não se gosta”. Na Espanha, o El Mundo recebeu um aviso sobre uma notícia de 2008 sobre o processo judicial contra diretores da investidora Riviera Coast.

Dos EUA, o Google não quis fazer comentários sobre estes casos concretos. Larry Page, co-fundador e conselheiro designado do buscador, explicou ao Financial Times que este tipo de medida freia a inovação: “Somos uma grande empresa e podemos responder este tipo de assunto, gastar dinheiro nele e chegar a um acordo. Este não é o problema. A questão é que se a internet for tão regulamentada vamos deixar de ver avanços”.

Estes primeiros casos estão conseguindo o efeito contrário ao desejado pelos afetados. No lugar de desaparecer, estão retornando aos meios de comunicação. É certo que o caso inicial já não aparece no buscador do Google, mas continua, por exemplo, no Bing, da Microsoft, que conta com 18,4% do mercado dos buscadores nos EUA ou o Yahoo!, com 10,3% de acordo com a empresa de medição ComScore em fevereiro deste ano.

O Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) emitiu um parecer em meados de maio que os buscadores de internet como o Google devem retirar as referências sobre informações publicadas no passado se ficar comprovado que são lesivas para alguma pessoa ou são irrelevantes. A sentença respondeu uma demanda do advogado espanhol Mario Costeja, que exigia que o buscador retirasse uma informação publicada em 1998 e que o vinculava a um embargo por dívidas com a Previdência Social já solucionado. A Agência Espanhola de Proteção de Dados (AEPD) também pediu durante anos que o buscador oferecesse mecanismos que garantissem a vida privada dos cidadãos.

“A sentença obriga o Google a fazer julgamentos difíceis sobre o direito do indivíduo de ser esquecido e o direito público de saber”, segundo declarou o gigante da internet. O buscador conta com um comitê de especialistas para esclarecer em quais casos a sentença se aplica e decidiu criar o formulário para as petições de apagamento de dados pessoais. Em apenas um dia recebeu 12.000 solicitações e em pouco mais de um mês elas superam 70.000.

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Rosa Jiménez Cano, do El País, em San Francisco