Movidos por um novo estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), os principais jornais do país revelam na quinta-feira (9/6) que, se for aplicado o texto aprovado na Câmara dos Deputados, o futuro Código Florestal vai impossibilitar o cumprimento dos compromissos assumidos pelo Brasil na cúpula de Copenhague, em 2009.
Segundo esse estudo, a adoção de medidas como a redução do rigor no controle do desmatamento, anistia e isenção para recuperação de matas devastadas – e outras flexibilidades propostas na versão aprovada – vai fazer com que mais de 3 bilhões de toneladas de carbono deixem de ser retidos pelas florestas.
As perdas com o desmatamento, a partir da dispensa da preservação de reserva legal de matas para propriedades com até 4 módulos fiscais, associadas a outras propostas incluídas no projeto, deverão provocar uma destruição de coberturas florestais equivalente a quase 30 milhões de hectares, área maior do que todo o estado do Rio Grande do Sul.
Esse seria o território somado de todas as propriedades beneficiadas com a anistia incluída no texto do relator, deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP). Segundo especialistas, o impacto poderia ser ainda maior, por causa do efeito de estímulo ao desmatamento ilegal produzido pela percepção de impunidade.
Sem respaldo
Na opinião de um dos autores do estudo do Ipea, citado pelos jornais, seria melhor manter o Código Florestal como está, cheio de emendas e desatualizado, do que estimular o desastre previsto com a flexibilização excessiva da lei.
Criada em 1965, a legislação atual sofreu muitas emendas para se adaptar a mudanças no perfil da agricultura brasileira e também para agregar as mais recentes exigências de defesa do patrimônio ambiental.
Com base nessas normas, o Brasil assinou uma série de compromissos internacionais que têm forte repercussão em questões econômicas e diplomáticas. Por essa razão, os debates sobre o tema não podem depender apenas do interesse do agronegócio – e esse é um ponto que a imprensa não tem abordado.
O interesse específico do setor agrário, de expandir indefinidamente as extensões de terras agrícolas ou destinadas à pecuária, não encontra respaldo na realidade física nem nos interesses futuros da sociedade brasileira.
Chantagem eleitoral
Os jornais afirmam também, na quinta-feira, que os relatores do Código Florestal no Senado, Jorge Viana (PT-AC) e Luiz Henrique (PMDB-SC), estão conduzindo uma série de encontros para buscar um ponto comum, com a alteração do texto aprovado na Câmara dos Deputados e a manutenção de reivindicações do agronegócio.
Mas faltam parâmetros para esse debate. Embora a presidente da República tenha declarado mais de uma vez que não admitirá uma lei que permita aumentar o desmatamento, na prática ela terá que lidar com muitas divergências no seu próprio ministério e na bancada multipartidária que lhe dá apoio no Congresso Nacional. A começar de sua nova ministra da Casa Civil, senadora Gleisi Hoffmann, eleita pelo estado do Paraná, Dilma Rousseff tem em torno de si muitos auxiliares importantes que se posicionaram a favor do texto aprovado na Câmara.
Com a desculpa demagógica de que é preciso apoiar os pequenos proprietários, infiltra-se no governo o elemento eleitoral, que ameaça com retaliações nas urnas qualquer movimento mais rigoroso do governo contrário à anistia para desmatadores.
Os jornais ainda não afirmam explicitamente, mas os debates antes da votação no Senado podem ser organizados pela bancada ruralista no sentido de se configurarem como uma chantagem.
Garantia de futuro
Nesse caso, resta saber como a imprensa irá se comportar. Se mantiver o noticiário e os comentários presos ao aspecto político, estará desviando o debate de outras questões importantes, como a obrigatoriedade de o Brasil cumprir as metas anunciadas no acordo de Copenhague, que prevêem a redução de 668 milhões de toneladas de gás carbônico por ano com a contenção do desmatamento no Cerrado e na Amazônia.
Segundo o estudo do Ipea, a proposta aprovada na Câmara pode causar um atraso de oito anos no cumprimento dos compromissos assumidos pelo Brasil.
A imprensa deve observar que, muito além dos resultados eleitorais de 2014, a presidente da República precisa estar atenta às consequências de longo prazo que a flexibilização do Código pode trazer. Não apenas para sua biografia, mas principalmente para o direito das futuras gerações de brasileiros.