O questionamento instalou-se imediatamente após a divulgação das primeiras informações — por que a cobertura da chacina promovida pelos terroristas do Estado Islâmico em Paris impôs-se ao noticiário da catástrofe em Mariana ocorrida dez dias antes?
A contagem das vítimas, o número de ações em tão limitado lapso de tempo, o horror dos testemunhos, a gigantesca caçada aos assassinos, as imagens ao vivo repetidas incessantemente e as providências das autoridades francesas desativaram a instalação de uma segunda celeuma, mais técnica, menos emocional – os terroristas foram bem-sucedidos, cumpriram todos os objetivos, mostraram competência no planejamento, preparo e execução da missão assassina e organização da fuga?
Apesar do derramamento de sangue, dos imensos estragos e da tremenda repercussão, tudo indica que a operação ficou muito aquém do que pretendia. Está claro que o Alvo-1, o objetivo prioritário era produzir algo que chegasse muito perto da pessoa do presidente François Hollande que assistia ao amistoso França-Alemanha no estádio nacional. em St. Dennis. Não foi encontrado armamento de precisão para atingi-lo de longe, nem esta era a intenção dos terroristas.
Num estádio com oitenta mil pessoas a arma mais letal e efetiva para atingir ou assustar determinada pessoa é justamente esta multidão. Desde que tomada pelo pânico e convertida em uma irracional e incontrolável horda.Três homens-bomba explodiram-se na porta e imediações da arena desportiva sem maiores consequências e o narrador brasileiro que descrevia o jogo pela TV referiu-se a “rojões”, sem atribuir-lhe maior importância. Mas nas investigações foi encontrado apenas um ingresso para o jogo provavelmente destinado ao suicida que derrubaria o portão, abrindo caminho para os demais que se introduziriam junto ao público para provocar o estouro da boiada. Hollande certamente sairia ileso. Mas humilhado.
Não é necessário convocar o falecido Sherlock Holmes nem o cético ex-detetive Mario Conde (criatura do cubano Eduardo Padura), para comprovar que o objetivo mais ostensivo da operação terrorista era a pessoa do presidente francês. Basta organizar o cronograma e reconstituir todas as suas fases até a destruição do esconderijo do suposto mentor do atentado também em St. Dennis, para verificar que apesar das proporções da barbárie seus executantes comportaram-se como aprendizes.
Pés-de-chinelo ou treinadíssimos guerrilheiros, não importa: para vencer a paranoia dos terroristas só levando-a a sério.