A função pedagógica da mídia se materializa em imagens, textos e sons que influenciam mentes e comportamentos. Influência sutil, que será relativizada ou reforçada por parentes, amigos, professores, líderes culturais e religiosos, colegas no trabalho etc.
A pedagogia da cerveja está no ar. Carnaval, Copa do Mundo, feriados ou simples fins de semana (que começam na quinta-feira…), tudo é ocasião para uma ‘cerva’, a bebida mais consumida por adolescentes e jovens brasileiros, porta aberta para outras experiências de vertigem. Não faz muito tempo, a Rádio Jovem Pan teve a coragem de navegar contra a corrente, divulgando o depoimento de um rapaz que começou a tomar cerveja aos 11 anos e depois foi para a maconha, a cocaína e o ecstasy.
Os jovens se sentem invulneráveis. Seu fígado é de aço. E os sucos não têm o mesmo valor ‘nutritivo’ da cerveja estupidamente gelada. A bebida alcoólica como sinal de que a criança entrou para o mundo dos adultos. Leite então, nem pensar! No Brasil, consome-se mais álcool per capita do que leite. A cerveja tem pouco teor alcoólico e por isso é consumida em maior quantidade do que outros tipos de bebida. Desce redonda, fácil, tranqüila. Vai envolvendo aos poucos, sedutora.
Os bares próximos a faculdades e escolas deveriam, pelo menos, pedir a carteira de identidade, e vender apenas refrigerantes aos menores de 18 anos. Mas vem o colega mais velho e compra cerveja para a galera. Um brinde ao Brasil!
Respeito ao touro
A pedagogia da cerveja que a mídia veicula deveria ser criticada pela mídia não-alienante. A falta da crítica se chama conivência. Moralismo não, basta informação: os danos cerebrais causados pelo álcool ingerido desde a adolescência, o déficit de memória, riscos no trânsito, riscos de uma vida sexual desregrada geralmente associada bebedeiras, seqüelas irreversíveis a médio e longo prazos.
Ficar chapado nas festas, beber todas, beber, beber até cair… estas são algumas ‘habilidades’ e ‘competências’ sugeridas pela animada pedagogia da cerveja. Os programas de saúde pública condenam o abuso do álcool, e a mídia deixa transparecer que a bebida é fator de inclusão no mundo, caminho de auto-afirmação.
Na propaganda que o povo começou a chamar de ‘Brahmatouro‘, Ronaldo driblou o animal e abriu a garrafa no chifre do adversário vencido. Triste fenômeno! E ainda houve gente que só se lembrou de reivindicar mais respeito ao touro!
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Doutor em Educação pela USP e escritor (www.perisse.com.br)