Tempos atrás escrevi neste Observatório um texto (‘Cegos, surdos e sem imaginação‘) sobre a briga publicitária entre as grandes cervejarias do país. Falava da falta de originalidade e qualidade criativa dos profissionais envolvidos, não apenas os publicitários, mas também os executivos das empresas-cliente, que aprovavam aquelas infelicidades.
Agora, mais uma vez, a batalha volta a fazer vítimas (considerando-se como vítimas as pessoas com algum bom senso e bom gosto e o público feminino) e resulta em punição. Segundo notícia divulgada recentemente, o Procon de São Paulo emitiu notificação à cervejaria Skol por publicidade abusiva no caso da campanha ‘Musa do Verão’, pois entendeu que o anúncio tratou a mulher como um ‘objeto de consumo’.
A peça publicitária mostra a atriz Bárbara Borges sendo ‘entregue’ de porta em porta a diversos homens. Independentemente das fantasias que possam ser despertadas pela peça ou da imensa discussão que seria tentar chegar a um consenso sobre ser o anúncio de bom ou mau gosto, o fato é que qualquer mané um pouco mais ligado perceberia, de antemão, que um comercial assim causaria problemas.
Nada de novo
Se isso foi proposital, então, pior ainda: além da falta de criatividade, usar celeuma e proibições de veiculação como publicidade ‘extra’ é uma tática velha, arcaica, demodée, cafona (tanto quanto essas expressões) e, nesses nossos tempos, politicamente incorreta. Não que sinta simpatia pelo corretismo atual; contudo, o tal do ‘falem mal, mas falem de mim’ saiu de moda há tanto tempo quanto o ‘levar vantagem em tudo, certo?’.
Obviamente, um comercial de cerveja – até que alguém quebre esse paradigma – deve ser alegre, bem-humorado, mostrar reuniões de amigos, calor, Sol, praia e, de quebra, mulheres ‘voluptuosas’ (dizer gostosas seria politicamente incorreto?…) com pouca roupa. Parece ser esse o ‘clima’ que os tomadores de cerveja buscam em suas mentes quando se reúnem em torno de uma garrafa, mesmo que no inverno e dentro de um pub. Já houve também a tentativa de caipirizar a cerveja, atrelando sua imagem aos rodeios, com adultos infantilizados fantasiados de caubói (eu também tinha chapéu, botas e calças daquelas aos 10 anos de idade…).
Pararam, talvez porque nem só de jecas é composto esse mercado. De um modo ou de outro, o fato é que nada de realmente novo surgiu nas campanhas de cervejas nos últimos 10, talvez 20 anos: continuam apelando para a idéia de ‘gostosa’ fazendo uma espécie de metáfora por aproximação entre a bebida e a mulher da vez. Talvez não haja mesmo nada para mudar, pois não deve ter mudado a cabeça do bebedor de cerveja, mas em vista do acirramento da disputa entre as cervejarias, não era a hora de usarem de um pouco mais de esforço criativo, sair dessa mesmice (apesar das gostosas) e se sobressair com algo inovador que seja lembrado por muito tempo e leve seu cliente à liderança do setor?
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Publicitário, São Paulo