Ao assistir ao Bom Dia Brasil de quinta-feira (11/5) refleti sobre as muitas incoerências embutidas no discurso dos meios de comunicação brasileiros. Em uma das matérias em destaque no telejornal, médicos alertavam mais uma vez para os perigos da automedicação, em especial a de remédios para combater gripes e resfriados, os chamados antigripais.
De acordo com os médicos, a ingestão de antigripais deve ser feita com cautela e sempre com prescrição. OK, mais um belo serviço do jornalismo a serviço do bem público. Contudo, nos intervalos comerciais de qualquer emissora de TV brasileira (a Globo incluída) saltam aos olhos as propagandas de remédio ‘incitando’ as pessoas à automedicação. Quando se trata de antigripais então, a festa é completa.
Nos anúncios, o médico é facilmente substituído por uma celebridade (atrizes de novelas, por exemplo) ou por um ator no papel de um amigo prestativo. Somente ao final surge uma tarja informativa orientando a pessoa a procurar um médico em caso de não desaparecerem os sintomas.
Tudo com a conivência e anuência do Conar (Conselho Nacional de Autoregulamentação Publicitária), uma entidade mantida pelo mercado publicitário, cuja missão seria proteger o consumidor de propagandas lesivas e enganosas. Incentivar o público a comprar remédio como se fosse ‘bala de chocolate’ me parece bem danoso, ainda mais com opiniões contrárias de quem mais entende de saúde: os médicos.
Cabe também perguntar: onde está o poder do CFM (Conselho Federal de Medicina), ao não pressionar o governo federal e o Conar contra a manutenção dessa prática nos meios de comunicação? Ainda que a responsabilidade direta do conteúdo da propaganda seja do anunciante, os meios de comunicação são de certa forma coniventes e responsáveis ao permitirem a veiculação maciça desse tipo de publicidade (lucrativa em termos comerciais).
Os princípios éticos, morais, tão propalados, cobrados e difundidos pela mídia deveriam ser sobretudo aplicados a ela própria. Condenar erros alheios (automedicação) ao mesmo tempo em que erra (veicular propaganda de automedicação) me remete àquele velho clichê: ‘Faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço’.
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Jornalista, São Luís do Maranhão