Tuesday, 03 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1316

Resistências e negociações à exploração de combustíveis fósseis

(Foto: Instituto Arayara)

Além de ser o principal ponto de impasse no acordo final da conferência global sobre o clima (COP-28), assinado na quarta-feira (13/12), em Dubai, os combustíveis fósseis também foram pauta no Brasil, devido a um leilão de mais de 600 blocos de petróleo e gás em diferentes partes do país. Enquanto o acordo final, sugeriu uma transição energética, em que os países devem se “afastar dos combustíveis fósseis nos sistemas energéticos, de uma forma justa, ordenada e equitativa”. O Brasil teve 197 novos blocos para exploração de petróleo sendo arrematados.

imprensa reforçou a contradição do governo brasileiro, que participou com sua maior comitiva na COP 28, que apresentou números de redução de desmatamento, que teve no discurso do presidente cobranças de ações para que o mundo se torne menos dependente dos combustíveis fósseis. E que, por outro lado, deseja pular da oitava posição de exportador de petróleo para a quarta. Detalhe: o leilão da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) aconteceu no mesmo dia que o acordo foi assinado, e a imprensa local já sinalizava isso: “O leilão de petróleo do Brasil um dia depois da COP28″ (Nexo Jornal) e “Leilão de petróleo pós-COP28 é bomba de emissões, diz ONG” (Folha de S.Paulo).  A contrariedade do governo já havia sido abordada no observatório da semana passada.

A abordagem dos temas polêmicos e contraditórios pela imprensa é interessante, por permitir a compreensão contextualizada das temáticas, em suas perspectivas ambientais, econômicas e sociais, entendendo conflitos, interesses e prejuízos, para assim o leitor formar uma opinião sobre o assunto.  O programa Como é que é?, da TV Folha, na quarta-feira, entrevistando a editora de Ambiente do jornal, Giuliana Toledo, promoveu exatamente essa reflexão sobre os interesses do Brasil em explorar petróleo, criticando as posições do governo e mostrando a força do poder econômico sobre o ambiental. O Globo destacou que mais de 80% das emissões de gases do efeito estufa são provocadas pelo petróleo, gás e carvão. Mas, esses combustíveis também representam grande parte da energia que o planeta consome diariamente, além de ser um negócio global que gera lucros diários superiores a R$ 15 bilhões.

Assim, se compreende porque a assinatura do acordo em Dubai, não foi nada fácil, inclusive atrasou em um dia o final do evento, pois enquanto alguns países queriam uma linguagem direta sobre a eliminação dos combustíveis fósseis, os países exportadores de petróleo, como Arábia Saudita e Iraque, cujo desenvolvimento está ligado aos combustíveis não aceitaram. O consenso foi pelo termo “transition away”, por apresentar uma ambiguidade que agradou os países mais resistentes, pois indica mudança com flexibilidade.

A imprensa brasileira ressaltou essa ambiguidade, deixando evidente que o acordo aprovado na COP 28 não prevê o fim dos combustíveis fósseis, mas sugere uma transição das “energias que provocaram o aquecimento do planeta”. O texto propõe “triplicar a capacidade energética renovável” e “dobrar a eficiência energética média” até 2030. A imprensa mostrou que o acordo, como diz o site G1, foi positivo, mas ineficiente em medidas concretas para reduzir os efeitos das mudanças climáticas.  O site G1, que foi didático, explicando aspectos positivos e negativos de todos os pontos acordados.

No Brasil, a resistência foi das organizações ambientais, quilombolas e indígenas, que realizaram mobilizações contra o leilão. O Instituto Internacional Arayara pautou a imprensa sobre a quantidade de carbono emitida na atmosfera brasileira (2,3 milhões toneladas de carbono na atmosfera anualmente) e quanto os novos blocos aumentariam essas emissões.  O leilão foi apelidado de “leilão do fim do mundo”, porque além do seu potencial poluidor, dezenas das áreas oferecidas estão sobre unidades de conservação, terras indígenas e territórios quilombolas. O Instituto ajuizou ações públicas contra o leilão de 77 blocos, que contradiziam as diretrizes da ANP.

Conforme notícia no site do Instituto dos blocos ajuizados, 94% não tiveram ofertas e apenas 4 foram adquiridos. “Os 11 blocos da cadeia de montes submarinos de Fernando de Noronha não receberam ofertas. Territórios Quilombola ameaçados não receberam ofertas. 5.617 habitantes seriam impactados. Três blocos arrematados colocam em risco 5 territórios indígenas”.

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Patrícia Kolling é Doutora em Comunicação pela UFRGS, docente no curso de Jornalismo da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), Campus do Araguaia, integrante do Grupo de Pesquisa Jornalismo Ambiental (CNPq/UFRGS). E-mail: patikolling@gmail.com.