Notícia publicada na página do jornal britânico The Guardian no dia 24 de janeiro dá o que pensar ao jornalismo ambiental. Ela apresenta o resultado de um estudo feito por uma empresa e uma agência de comunicação no Reino Unido mostrando que apenas um quarto das pessoas interrogadas compreendia claramente o termo “verde” e aproximadamente o mesmo número conseguia descrever com precisão o que significava “sustentável”. Mesmo termos considerados de uso generalizado pelas empresas, como “amigo do ambiente” e “cultivado localmente”, são compreendidos apenas por uma minoria de pessoas. A dificuldade de compreensão também atinge as iniciativas políticas governamentais orientadas para a redução de resíduos, como a proibição de talheres e pratos de plástico descartáveis.
A notícia, informa que, apesar da confusão em torno de alguns dos termos-chave, a investigação mostra um apoio extremamente amplo às questões: “nove em cada 10 consumidores consideraram importante que as empresas e marcas falassem sobre as suas iniciativas de sustentabilidade e 68% dos inquiridos eram mais propensos a comprar de uma empresa que tinha uma estratégia ambiental clara em vigor”.
A notícia cita ainda a opinião de Jamie Peters, da Friends of the Earth, para quem palavras-chave ambientais estão sendo sequestradas e mal utilizadas por empresas de petróleo e gás, que as utilizam para truques de marketing, e também pelo governo.
Aqui no Brasil, o Ministério do Meio Ambiente desenvolvia, desde 1992, a pesquisa “O que o brasileiro pensa do meio ambiente e do consumo sustentável”, mas a última foi em 2012. Naquele ano, o indicador mais relevante foi o número de pessoas que, 20 anos antes (1992), não sabiam mencionar sequer um problema ambiental na sua cidade ou no seu bairro, número que diminuiu para 10% em 2012, em relação aos 46% de 1992.
É possível extrapolar o dado colhido no Reino Unido para interesses empresariais para discutir a escrita jornalística sobre a relação entre sociedade e natureza. A realidade brasileira não deve ser diferente da britânica, com boas chances de se apresentar ainda pior se a pesquisa fosse realizada aqui.
As pautas do jornalismo ambiental giram em torno de conceitos/práticas sobre a crise climática, a sustentabilidade, o mercado de carbono, e há um imenso ponto de interrogação sobre o entendimento, por parte de leitores, ouvintes e telespectadores, das notícias e reportagens sobre essas temáticas.
Um caminho para a resposta aponta para o entendimento de que a palavra no e do jornalismo precisa nascer do cotidiano e da experiência do corpo vivida no espaço. O pensador francês Henri Lefebvre afirma que, a partir da vida cotidiana, mudam a língua e as linguagens, nascem palavras novas, gírias, muitas vezes marginais em relação à linguagem oficial (LEFEBVRE, 1978, p. 94). Estudar a linguagem na vida cotidiana, afirma o autor, implica tomar também o que ela não diz, o que evita dizer, o que não pode nem deve dizer.
Para ele, uma revolução precisa dar lugar a um novo espaço, a um novo cotidiano e a uma nova linguagem: Uma revolução que não dá lugar a um novo espaço não chega a realizar todo seu potencial; trava e não gera mudanças de vida, apenas modifica as superestruturas ideológicas, as instituições, os aparatos políticos. Uma transformação revolucionária se verifica por sua capacidade criativa, geradora de efeitos na vida cotidiana, na linguagem e no espaço, embora seu impacto não tenha que acontecer necessariamente no mesmo ritmo e com intensidade semelhante (LEFEBVRE, 2013, p. 112).
Hoje, premido pelas mudanças nas rotinas de trabalho, o jornalismo mal estuda e pouco se alimenta da linguagem da vida cotidiana, do repertório de falas e fazeres das ruas. Ali, no espaço geográfico, com seus conflitos e tensões, onde os jargões, inclusive ambientais, fariam sentido na experiência do corpo, ausentam-se o jornalismo e os jornalistas.
Há então que revolutear a pesquisa, o ensino e o fazer, recuperar a rua, embrenhar o corpo no espaço para dali alimentar o texto. A um jornalismo comprometido com a emancipação humana cabe a tarefa de, pela linguagem, tornar visíveis as práticas criadoras que, no espaço e no cotidiano, podem levar à transformação social, em especial nas pautas que nos são caras no jornalismo ambiental.
Reportagem publicada originalmente em Observatório de Jornalismo Ambiental
Referências:
LEFEBVRE, Henri. De lo rural a lo urbano. Barcelona: Penísula, 1978.
LEFEBVRE, Henri. La producción del espacio. Espanha: Capitán Swing, 2013.
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Míriam Santini de Abreu é jornalista, doutora em Jornalismo, mestre em Geografia e especialista em Educação e Meio Ambiente.