Thursday, 09 de January de 2025 ISSN 1519-7670 - Ano 25 - nº 1320

Agonia e morte de Tancredo Neves

Bem-vindos ao Observatório da Imprensa.

Não foi uma tragédia brasileira. Foi a tragédia brasileira. A maior de todas, em todos os tempos. Desenrolada diante de milhões de telespectadores, ao longo de 38 dias, com todos os ingredientes das tragédias clássicas – euforia, surpresa, angústia, esperança, desespero e o desenlace: uma vítima fatal, as demais em prantos, de luto fechado.

1985 começa sem pressentimentos, tudo preparado para dar certo. A ditadura militar de 21 anos será encerrada com a eleição e a posse de um querido e prudente líder oposicionista. Houve a eleição, indireta porém legítima: Tancredo Neves derrotou o detestado Paulo Maluf por esmagadora maioria, 480 a 118 com 26 abstenções, a maioria do PT.

Mas não houve posse. Há algumas semanas, o doutor Tancredo sentia fortes dores no abdômen, disfarçava, tomava antibióticos às escondidas. Não queria ir a um hospital para fazer exames, temia que os militares da linha dura sabendo que estava doente tentassem desesperados um golpe de mão.

O presidente Ernesto Geisel e o seu braço direito, Golbery do Couto e Silva, haviam preparado um cronograma preciso: lançaram a "distensão gradual e segura" para evitar radicalizações, escolheram um general populista, João Figueiredo, como o último ditador e imaginaram que, em seguida, seria possível uma transição para a democracia. sem traumas e revanches.

Na véspera da posse, Tancredo capitulou às dores, internado às pressas num hospital de Brasília.

O país queria ir às ruas para festejar o fim da ditadura e os primeiros ares da democracia. Teve que recolher-se e contentar-se com a agonia de seu presidente pela telinha da televisão.

Vinte e cinco anos depois da morte de Tancredo, justamente no ano em que se celebra seu centenário de nascimento, os bastidores desta tragédia começam a ser remontados e entendidos. Só agora o país consegue avaliar o quanto sofreu e o quanto cresceu. Mas, uma coisa torna-se cada vez mais clara, evidente, inquestionável: Tancredo imolou-se para garantir a legalidade. Ditadura nunca mais.