Estou longe do Brasil, mas procuro me manter informado. Sei, por exemplo, ter começado um movimento pelo impeachment, impedimento ou destituição desse presidente responsável pela atual desmoralização internacional do Brasil. Nosso país que, durante décadas, foi elogiado na ciência, na arquitetura, na música, na literatura, no futebol e pela sua própria natureza, vive hoje seu pior momento. É alvo de escárnio, de acusações, de piadas e passou a ser ignorado até mesmo pelas organizações internacionais.
A cultura não é o forte dos ministros e nem as relações internacionais. Quando todo o mundo se organizava e lutava para enfrentar um inimigo comum, o coronavírus, o presidente brasileiro ria, falava em gripezinha e, não qualificado em medicina, mandava o povo tomar remédios inadequados e mesmo capazes de provocar enfartes. Essa irresponsabilidade impediu ao Brasil se preparar para proteger a população, evitar a propagação da disseminação do vírus e uma contaminação geral.
Até há pouco — parece agora ter sido aconselhado a mudar de atitude — ainda era um empecilho a uma proteção da população por uma utilização geral de vacinas. Essa sua arrogante ignorância acabou por levar muitos brasileiros a desconsiderarem o risco grave e mesmo fatal do vírus, causa de mais de duas centenas de milhares de mortes. Em todo o mundo, os outros países já prepararam seus planos urgentes de vacinação, mas o Brasil deixou de comprar seus estoques de vacinas a tempo, enquanto alguns governadores isolados tentam desesperadamente se aprovisionar para proteger seus cidadãos.
A situação é dramática mas não deixa nenhuma dúvida quanto à incapacidade administrativa do presidente e sua equipe para enfrentar e solucionar essa crise. Como se não bastasse esse despreparo do presidente para a proteção da população, um grupo de fanáticos religiosos a ele ligados, ilude o povo com afirmações mentirosas de que a fé e a oração curam e destroem o vírus, transformando suas igrejas em focos de contaminação e propagação do vírus.
É imprevisível o desenrolar deste ano no Brasil, nas mãos de incapazes e farsantes. Quantos deverão ainda morrer antes de uma mobilização geral?
Porém, isso não é tudo. Enquanto o povo se contamina com o risco de morrer, o mais importante partido de esquerda ignora o movimento popular nascente pela destituição e impeachment do dirigente incapaz, e decide apoiar o candidato do presidente para a eleição da presidência do Senado. Ora, isso aborta toda e qualquer iniciativa em direção de um pedido de impeachment. Que esquerda é essa?
Talvez este nem seja um comentário adequado e na medida de meus anteriores, aqui no Observatório, mas o articulista nem sempre pode manter seu sangue frio. No caso, foi a leitura de uma entrevista do líder do PT no Senado, Rogério Carvalho, ao Terra, falando sobre o apoio ao candidato Rodrigo Pacheco, o candidato do presidente Bolsonaro. Diante de tanto cinismo, se eu fosse do PT, queimava minha carteirinha.
***
Rui Martins é jornalista, escritor, ex-CBN e ex-Estadão, exilado durante a ditadura. Criador do primeiro movimento internacional dos emigrantes, Brasileirinhos Apátridas, que levou à recuperação da nacionalidade brasileira nata dos filhos dos emigrantes com a Emenda Constitucional 54/07. Escreveu Dinheiro Sujo da Corrupção, sobre as contas suíças de Maluf, e o primeiro livro sobre Roberto Carlos, A Rebelião Romântica da Jovem Guarda, em 1966. Vive na Suíça, correspondente do Expresso de Lisboa, Correio do Brasil e RFI.