CASO TIM LOPES
Chico Bruno (*)
Ao enfocar de maneira desapaixonada, com intervenções seguindo vários rumos e atalhos, o assassinato de Tim Lopes, a edição anterior do OI traz novamente à tona a necessidade de se aprofundar a discussão sobre a imprensa brasileira. O momento é muito oportuno para reflexão, pois a imprensa está sob censura e é alvo tanto do poder constituído como do marginal.
Já se escreveu aqui sobre a conivência dos poderes constituídos com o jogo do bicho e com a falsificação de CDs. Infelizmente, a imprensa também é conivente com essas práticas ilegais. No caso do jogo do bicho, a situação é grave, pois hoje eles se tornaram grandes anunciantes da mídia. Na Bahia, sempre na Bahia infelizmente, os resultados das três extrações diárias do jogo do bicho, bancado por uma associação legalmente constituída por 43 banqueiros, são publicados na primeira página da Tribuna da Bahia. Isso se repete em outros estados.
Modernos, os bicheiros têm até sítio na internet: o do jogo do bicho baiano pode ser acessado no endereço <www.paratodos-ba.com.br>, onde os internautas poderão conhecer online as duas sedes, uma administrativa, que funciona na Praia da Boca do Rio, e a outra instalada no Comércio, onde são realizadas extrações públicas, no mesmo estilo dos da Caixa Econômica, com meninas e meninos uniformizados cantando as bolinhas ? tudo pode ser acompanhado, também, online. Ainda, no sitio o internauta sabe o que é necessário para abrir uma loja franqueada da Paratodos, como é conhecido o jogo do bicho em todo o Norte/Nordeste do país.
Lamentar não basta
Em relação aos tais bailes funk, Tim Lopes não precisava se arriscar e perder a vida, bastava ir a uma locadora de vídeo e alugar fitas com as imagens que ilustrariam sua matéria. Aliás, Cristina Mesquita testemunha, no OI passado, que arriscou a vida para captar imagens de um baile funk com uma microcâmera, e acabou usando na reportagem as imagens de fitas alugada ? pois eram idênticas às captadas por ela, só que com melhor qualidade.
São dois exemplos de que não é necessário usar equipamentos eletrônicos sofisticados para fazer reportagens sobre esses assuntos. O que se precisa fazer, e esta é uma tarefa da imprensa, é cobrar diariamente das autoridades estaduais que acabem definitivamente com a conivência e a promiscuidade do relacionamento com o crime organizado.
Aliás, o crime organizado, já faz tempo, vem elegendo representantes, tanto no Executivo como no Legislativo, com o olhar complacente da imprensa. Um bom número de jornalistas, principalmente os mais antigos, sabe muito bem que foi a partir dessa tolerância com o jogo do bicho que nasceu esta grande rede nacional de narcotráfico, contrabando de armas, máquinas de videopôquer e falsificação de CDs instalada no país do Oiapoque ao Chuí. Tudo começou com a concorrência imposta pelas loterias oficiais, que fez a receita do bicho cair e seus chefões enveredarem por outros ramos criminosos.
Lamentar o assassinato do Tim Lopes e a censura togada não basta, É preciso lamentar, também, a conivência da imprensa brasileira.
(*) Jornalista