OFJOR CI?NCIA
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SCIENCE VS. AVANÇA BRASIL
Luiz Antonio Magalhães
"Meu café brasileiro já foi para a lata do lixo", escreveu um leitor inglês, após ler uma reportagem do jornal The Independent sobre as conseqüências do programa Avança Brasil na Amazônia. O desabafo veio acompanhado de um apelo para que as autoridades e o povo inglês boicotem os produtos brasileiros.
Colin Hingston, autor da mensagem publicada na seção de cartas do Independent, certamente não foi a única pessoa a ficar indignada com os projetos do governo brasileiro para a Amazônia. Nas últimas semanas, leitores dos principais jornais do planeta ? Le Monde, The New York Times, The Guardian inclusos ? ficaram sabendo que a maior floresta tropical do mundo corre "enormes riscos".
A polêmica começou com o artigo "The Future of the Brazilian Amazon", publicado na revista Science e baseado em estudo liderado por William Laurance, do Smithsonian Tropical Research Institute do Panamá.
Segundo Laurance, o programa Avança Brasil, que destina US$ 40 bilhões para o desenvolvimento da região amazônica, poderá causar a destruição total de algo entre 28% e 42% da floresta brasileira até o ano de 2020.
O estudo, como era de se esperar, foi contestado por autoridades brasileiras.
Sem entrar no mérito da questão ? se as previsões do artigo publicado na Science são ou não corretas ?, a verdade é que toda vez que se fala na destruição da Amazônia brasileira, a imprensa internacional age de forma irracional. Ou muito racional.
Senão vejamos. Dos jornais analisados por este Observador, nenhum ofereceu aos seus leitores uma dosagem equilibrada de opiniões das duas partes envolvidas na contenda ? o pesquisador e as autoridades brasileiras, em especial José Paulo Silveira, gerente do Avança Brasil. A rigor, a opinião do brasileiro só virou notícia quando comunicou que os investimentos projetos do Avança Brasil na região passarão por uma avaliação ambiental. Palavra de "derrotado", portanto.
O jornal The Independent conseguiu um belo título para a sua primeira matéria sobre o assunto, em 19 de janeiro: "Death sentence for the Amazon" (ou "Sentença de morte para a Amazônia"). Além da porcentagem de destruição "total" na região, o jornal britânico destacou a previsão de que 95% da floresta perderá, até 2020, o status de mata virgem. O que isto significa é obscuro, mas a taxa é alta e chama bastante atenção.
Já o influente NYT gostou da declaração de "um porta-voz" (assim mesmo, sem identificar) do Ministério da Ciência e Tecnologia do Brasil: "a maior floresta tropical do mundo não pode se transformar num ?santuário intocável?". A citação praticamente virou título: "Brazil Says It Will Not Let Amazon Become a ‘Sanctuary’" (Brasil diz que não vai deixar a Amazônia se transformar em santuário).
Esta matéria, produzida pela agência Reuters e publicada no NYT na edição de 23/01, é um espanto. O artigo flui de tal forma que é praticamente impossível discordar dos argumentos do autor do estudo que vaticina a destruição da floresta brasileira. Ainda neste texto, há um erro infantil: "Sometimes considered the lungs of the Earth due to the vast amounts of oxygen produced there, the Amazon loses an area equivalent to the size of Rhode Island each year to loggers and other destruction" (Algumas vezes considerada o pulmão da Terra por causa da grande quantidade de oxigênio ali produzido, a Amazônia…), escreveu o autor, que sabiamente não assinou a matéria. Ou descrever a Amazônia com "Pulmão da Terra" tem perdão?
É interessante notar que a repercussão do artigo da Science foi muito maior no exterior do que no Brasil. Por aqui, o assunto não comoveu: além de algumas notas e reportagens de pé de página, só mereceu maior destaque n?O Estado de S. Paulo, que tratou do tema em editorial.
Independente do mérito da questão, resta saber se a atitude dos jornais estrangeiros se deve à onda "politicamente correta" e preservacionista ou se existe uma questão política de fundo.
No Brasil de hoje, quem denuncia a idéia de internacionalização da Amazônia é visto como integrante da espécime nacionalista-xenófoba-paranóica que insiste em continuar existindo ? muito infelizmente, para os que se encontram no poder. Se a imprensa estrangeira continuar tratando a questão da floresta amazônica do jeito que tratou no último mês, pode apostar, a paranóia vai crescer. Talvez não sem motivos.
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