NOTAS DE UM LEITOR
Luiz Weis
Sob o título "Obtenção de visto pode gerar novo atrito", a Folha alertou na sexta-feira, 9:
"Além de deixarem suas impressões digitais e serem fotografados nos postos de imigração dos EUA, os cidadãos brasileiros serão obrigados a passar pelo mesmo procedimento nos consulados norte-americanos no Brasil para conseguir um visto de entrada. A medida deve ser implementada ainda neste ano (…) Com essa informação, as autoridades norte-americanas poderão comparar as características físicas fichadas no visto com as recolhidas nos postos de imigração".
Dois dias antes, em despacho procedente de Washington sobre a conversa entre Amorim e Powell, e publicado pelo New York Times sob o título "Powell tenta acalmar as tensões no Brasil", a AP atribuiu ao secretário de Estado a declaração de que "esperamos tornar as coisas mais fáceis", permitindo que as digitais e a foto sejam tomadas quando alguém pede um visto.
Ora, se Powell disse o que lhe foi atribuído ? e se valerá o que ele teria dito ? os brasileiros (e, presumivelmente, os nacionais dos 26 outros países dos quais os Estados Unidos exigem visto) não precisão deixar fotos e impressões ao entrarem nos EUA, quando esses dados biométricos já constarem dos vistos obtidos nos consulados americanos e registrados nos seus passaportes.
Se a Folha estiver certa, a repetição do procedimento sem dúvida deverá "gerar novo atrito". Se a AP estiver certa, o sistema ficará "mais fácil" e o atual atrito entrará para a história.
Já o colunista Igor Gielow (Folha), ao criticar os ares patrióticos que o país tem respirado desde que os americanos foram obrigados a tocar piano nos portos e aeroportos nacionais, mencionou, no sábado, como "motivo de orgulho" pela "altivez" que o brasileiro estaria demonstrando, "o fato de o jornal The New York Times, o mais importante do mundo, ter citado que Powell colocou o Brasil ao lado da Coréia do Norte e Sudão como países que ?atormentam? os EUA".
Este leitor concorda com a crítica do colunista ? e não só dele; Luiz Garcia, por exemplo, escreveu no Globo o artigo "A capivara que ruge". Mas não é exato que o Times teria informado que Powell, na coletiva de quinta-feira, equiparou o Brasil à Coréia do Norte e ao Sudão.
O que o repórter Christopher Marquis, que cobriu a entrevista, escreveu foi isto:
"Numa rara e abrangente conferência de imprensa, Mr. Powell expressou algum otimismo em relação a várias outras questões que têm atormentado a administração Bush, incluíndo Coréia do Norte, Sudão e Brasil".
Ou seja, o secretário de Estado se referiu aos três países, mas em momentos diferentes da coletiva, e sem colocá-los no mesmo saco.
No domingo, enfim, a Folha publicou breve resumo da matéria saída na véspera no Times, de autoria de Larry Rohter, seu correspondente no Rio de Janeiro, sobre a crise do fichamento. ("Está escapando das mãos?", pergunta o título.)
Pelo resumo da Folha, "o NYT afirma que ?diplomatas brasileiros e autoridades do governo são isentos da inspeção? [nos EUA], diferentemente do que acontece no Brasil, com diplomatas [americanos] e até um senador do Kansas, Pat Roberts, sendo forçados a passar pelo procedimento".
E em seguida:
"Diplomatas e políticos estão excluídos do US-Visit. Mas em janeiro de 2002, o chanceler brasileiro Celso Lafer, o russo, Igor Ivanov, e a chilena María Soledad Alvear, tiveram seus sapatos revistados ao desembarcar em Miami".
Mas, diferentemente do que sugere a Folha, a história dos três diplomatas não consta da matéria de Rohter ? que deve ser criticado pela omissão unilateralista. A referência foi um adendo da Folha ? que deve ser criticada por fazer de forma errada a coisa certa.