Monday, 23 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

A França e a crise da imprensa européia

NO VERMELHO

Leneide Duarte, de Paris

Quem são, onde trabalham e quanto ganham os jornalistas franceses?

As mulheres representam apenas um pouco mais de um terço dos profissionais de imprensa da França. Apesar disso, existe uma tendência ao que se chama de feminização da profissão, que tem profissionais com idade média de 42 anos. Três quartos do total de jornalistas ? 31.903 profissionais no ano 2000 contra 26.614 dez anos antes ? têm menos de 15 anos de profissão.

Esse perfil dos profissionais de imprensa franceses, publicado na semana passada em um livro chamado Les journalistes français à l’aube de l’an 2000, sob o selo do IFP (Instituto Francês de Imprensa), mostra que hoje há 20% de profissionais de imprensa a mais do que em 1990. Desse total de pouco mais de 31 mil profissionais, 78,1% trabalham como assalariados e os outros são free lancers. Essa categoria aumentou e ? coisa que não surpreende ? entre eles a maioria é constituída por mulheres e jovens. Um jornalista free lancer francês ganha em média 10.700 francos mensais (cerca de 1.500 dólares), enquanto a média dos salários dos que têm emprego assalariado varia em torno de 18.700 francos mensais (cerca de 2.600 dólares). Os grandes salários são, como no Brasil, reservados aos que fazem televisão e podem atingir cifras astronômicas.

A imprensa escrita é a principal empregadora da mão de obra assalariada: 72,8% dos jornalistas trabalham para jornais ou revistas. Em seguida vêm os jornalistas dos meios audiovisuais: 12,4% trabalham na televisão, 8,5% trabalham no rádio e apenas 0,2% fazem jornalismo na internet.

À guisa de consolo

Mas esses empregos estão cada vez mais ameaçados pela crise causada pela diminuição das verbas publicitárias. Não são poucos os jornais e revistas que passam por grandes dificuldades na França e em toda a Europa. O jornal Libération é um deles. Apesar de ter tido um aumento de 40% em suas vendas no mês de setembro deste ano em relação ao mesmo período do ano passado (graças às edições sobre os atentados e seus desdobramentos), o prestigioso tablóide de esquerda ? fundado em 1973 por Jean-Paul Sartre e Serge July ? vem acumulando prejuízo durante todo este ano. Depois de três anos de lucros, as perdas de 2001 já são calculadas em 40 milhões de francos.

A crise do Libération não é, contudo, um fato isolado. Toda a imprensa escrita francesa vem sofrendo perdas substanciais do volume de publicidade e nem mesmo as tiragens em alta depois dos atentados de setembro nos Estados Unidos puderam compensar a balança. Devido às dificuldades, o Libération ? que já começara um regime de contenção de despesas há alguns meses ? anunciou, na semana passada, a supressão de mais 18 postos de jornalistas, sobretudo no site da internet. Até agora as visitas à edição diária eram gratuitas, mas este e outros serviços de consulta poderão vir a ser pagos para compensar os custos.

Com leitores e publicidade em queda, o diário Financial Times (tiragem média de 454 mil exemplares em setembro) também anunciou, semana passada, a demissão de 150 jornalistas, num total de 900. E a culpa, como sempre, é da receita publicitária aquém das necessidades do jornal. E quando a crise chega aos jornais de economia ? geralmente considerados ilhas de tranquilidade, protegidos das tormentas que afligem os outros ? é porque o panorama é grave. Ao anunciar a redução de sua redação, a presidente do grupo Pearson, Marjorie Scarino (que edita o Financial Times), anunciou que os lucros em 2001 foram 40% inferiores ao ano passado. E, para agravar o problema, a cobertura dos acontecimentos de Nova York e suas conseqüências ocasionaram um aumento dos custos do jornal. Além disso, o lançamento de suplementos econômicos do Guardian e do Daily Telegraph roubaram leitores do FT, como é conhecido o tradicional jornal econômico britânico. A crise é também atribuída à falta de investimento do FT no jornalismo investigativo e às posições pouco críticas do jornal em relação ao governo de Tony Blair.

Quando a crise atinge os jornais diários, as agências de imprensa não ficam imunes. A agência Reuters anunciou, há poucos dias, a supressão de 500 empregos, apesar de um crescimento de 4% este ano. O anúncio vem apenas três meses depois da demissão de 1.100 outros funcionários da agência, que emprega cerca de 15 mil pessoas em todo o mundo. Principal fornecedor mundial de informações e dados financeiros, a agência Reuters tem nos bancos, grandes empresas, sites internet e ministérios sua principal fonte de renda. Nesse oceano de informações dirigidas sobre as Bolsas, os mercados de matérias-primas e outras informações econômicas, a mídia só garante à Reuters 5% de seu volume de negócios.

Essas notícias ? que revelam uma crise relativamente grave na mídia européia ? podem servir de consolo para os jornalistas brasileiros. A realidade dos países ricos mostra que o declínio nas vendas e no orçamento publicitário não são uma especificidade da imprensa dos países subdesenvolvidos.

    
    
                     

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