ASPAS
Ethevaldo Siqueira
Copyright O Estado de S.Paulo, 15/9/02
"Não importa que pareçamos quixotescos, mas é preciso lutar incessantemente pela melhoria do conteúdo ético da TV aberta no Brasil. Como tantos outros cidadãos interessados na elevação do nível e dos padrões de qualidade desse poderoso meio de comunicação de massa, sentimos que o País está cada dia mais próximo de iniciar a transformação sonhada por milhões de brasileiros.
E temos agora um motivo a mais de otimismo, ao registrar a companhia de um novo movimento, identificado pela frase ?Quem financia a baixaria é contra a cidadania?, criado pelos parlamentares integrantes da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados.
Alguns leitores talvez se recordem de que propusemos nesta coluna, há quase dois anos, a criação um movimento com finalidade semelhante, com o nome de NovaCom (Nova Comunicação), sugerindo, entre diversas outras providências, o boicote publicitário dos programas da TV aberta de baixo nível, excessivamene violentos ou pornográficos.
Sem censura ? Reiteramos que o caminho não é a censura. Como agir, então? Nossa proposta sugere que o primeiro contato com a emissoras de TV abertas e seus produtores se faça com muito diálogo, apelos e todas as formas de pressões democráticas legítimas, visando a sensibilizá-los para o problema.
Ao mesmo tempo, temos que estabelecer o debate mais amplo possível com a televisão e seus patrocinadores e anunciantes, o Congresso, a Justiça, a imprensa e o governo. Caso não haja resposta positiva, parece lícito que, em defesa do cidadão, façamos propostas mais duras e mais enérgicas, denunciando os abusos, identificando os piores programas e divulgando seus nomes e veículos, numa espécie de ranking da baixaria, num site especializado da internet, infernizando as emissoras e seus responsáveis, apontando-os à execração pública, repudiando seus patrocinadores e mostrando os males que causam.
Na coluna publicada dia 4 de abril de 2001, com o título de ?Uma proposta: mudar a TV brasileira?, lembrávamos a preocupação do saudoso governador Mário Covas, ao considerar o excesso de violência da TV como uma das possíveis causas do aumento da criminalidade no Brasil. Mesmo sem ser conclusivo nem acusatório, Covas perguntava: ?Que influência poderão ter, dia após dia, ano após ano, programas tão violentos e sem qualquer conteúdo ético sobre mentes infantis, ou sobre pessoas de personalidades mal formadas??
Pensando na mesma direção, não apenas saúdo como me disponho a colaborar para a consecução dos objetivos desse novo movimento nascido na Câmara dos Deputados, pois seus propósitos parecem estar muito próximos das melhores aspirações da grande maioria de pais e educadores, com relação à TV aberta brasileira.
Para os leitores que nos têm perguntado sobre os eventuais resultados daquela nossa proposta, informamos que sua repercussão foi incomum. Mas, por mais que tenhamos tentado consolidar o núcleo inicial da NovaCom, a entidade ainda não se transformou na organização não-governamental (ONG) com que sonhamos. Descobrimos, no entanto, que há dezenas de estudiosos dispostos a trabalhar, a participar diretamente desse debate e a apoiar a iniciativa, bem como projetos similares, como o movimento ?Quem financia a baixaria é contra a cidadania?.
Uma nova TV ? É claro que não queremos uma televisão água-com-açúcar, amordaçada, estúpida ou sem graça. Não. Pelo contrário, sonhamos com uma TV criativa, formativa e informativa, crítica e cidadã, que divirta e, ao mesmo tempo, difunda a cultura no sentido mais amplo da termo. Uma televisão que dê a melhor contribuição para a formação das crianças e da juventude. Em resumo: uma televisão que não deseduque, que não abuse da violência gratuita, do sensacionalismo primário, da pornografia ou da linguagem chula. São essas mazelas que fazem hoje da TV aberta brasileira uma das piores do mundo.
Reconhecemos, também, que a televisão brasileira tem feito programas de boa qualidade, embora eles sejam minoria ou quase exceção. De todas as redes, apenas a TV Cultura e sua rede de emissoras públicas se destacam na preocupação com o conteúdo ético e educacional de seus programas. Deveríamos incluir também a Rede Vida que, embora profundamente confessional, tem pautado sua programação numa linha de respeito à sociedade e seus valores mais caros.
Esperamos, finalmente, que o recém-instalado Conselho de Comunicação Social do Congresso Nacional não seja ignorado nem posto à margem do novo movimento da Comissão de Ética da Câmara, pois essa é uma das melhores oportunidades para que esse organismo cumpra, efetivamente, suas finalidades."