Saturday, 23 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

A mídia e a transição democrática

BASTIDORES DA POLÍTICA

Lilian Andrade (*)


Mídia e Política no Brasil ? Jornalismo e Ficção, de Alzira Alves de Abreu, Fernando Lattman-Weltman e Mônica Almeida Kornis, 184 pp. Editora FGV, Rio, 2003; R$ 32,00. Lançamento em 24/4/03, a partir das 20h, na Livraria Travessa, rua Visconde de Pirajá, 572 ? Ipanema ? Rio


Um estudo sobre os efeitos da repressão e da censura sobre a mídia no Brasil ? e como o jornalismo sobreviveu a isso, quase duas décadas depois ?, será lançado pela Editora FGV em 24/4. Trata-se de Mídia e Política no Brasil ? Jornalismo e Ficção, que aborda o tema sob três ângulos diferentes: profissionalização e especialização, construções narrativas e institucionalização política.

O núcleo de mídia do Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil (CPDOC), da Fundação Getulio Vargas, vem se especializando num tema que, na verdade, é um grande desafio: falar da mídia e de sua história, especialmente da mídia atual. Alzira Alves de Abreu, junto com os pesquisadores Fernando Lattman-Weltman e Mônica Almeida Kornis ? os autores da obra ?, apresentam o resultado de uma pesquisa que ajudará a compreender melhor a atuação da mídia em um período recente da história brasileira.

No capítulo "Jornalistas e jornalismo econômico na transição democrática", Alzira analisa as respostas dadas pela imprensa escrita ao regime não-democrático e o padrão de trabalho forjado nesse período. Explica como os jornalistas se organizaram e influenciaram a sociedade civil na transição e também mostra as características que definiram o trabalho jornalístico para driblar a censura. E ainda: como se posicionou o jornalismo econômico na época, como as editorias de Economia ganharam notoriedade, mantendo essa posição até hoje, e como se tornaram espaços de influência política na luta pela redemocratização.

Com base na minissérie Anos Dourados, escrita por Gilberto Braga e exibida pela Rede Globo, em 1986, Mônica Almeida Kornis demonstra como esse produto ficcional estabelece uma relação alegórica entre o governo Juscelino Kubitschek ? período no qual transcorre a ação, em meados dos anos 50 ? com a retomada democrática da então chamada "Nova República", ambas conjunturas identificadas por um clima de otimismo e de esperança.

Fernando Lattman-Weltman discute a reestruturação da imprensa e, em particular, como a mídia interfere diretamente na prestação de contas dos ocupantes de cargos públicos e o impacto da intervenção da mídia sobre a qualidade do exercício da cidadania na democracia brasileira. A seguir, trechos da entrevista com os pesquisadores.

Qual importância desse estudo para o leitor e os profissionais de comunicação?

Alzira Alves de Abreu ? Nossa pesquisa busca ampliar o conhecimento do comportamento da mídia na fase de transição democrática. Nossa perspectiva é histórica e sociológica. Para os interessados nesse tema o livro acrescenta novos dados e informações que permitem questionar algumas idéias cristalizadas sobre o assunto.

Como a avalia o desempenho das editorias de economia hoje?

A.A.A. ? Elas continuaram o processo de melhor informar os leitores, todos os jornais atualmente contam com várias páginas dedicadas à economia e os jornalistas procuram se especializar na área.

O que poderia ser feito para melhorar a informação econômica dos jornais?

A.A.A. ? A própria mídia deveria se esforçar no sentido de propiciar cursos especializados para melhor formar os seus profissionais. As faculdades formam generalistas e é na prática que os jornalistas se formam em determinados temas ou áreas de conhecimento. Um outro aspecto que deve ser lembrado é a forma como os jornalistas trabalham para obter informações econômicas e como constroem essas informações.

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Qual o principal enfoque da sua pesquisa?

Fernando Lattman-Weltman ? A pesquisa está voltada para a reestruturação e inserção política da mídia na fase de transição democrática. Estou preocupado em trabalhar com um modelo teórico que dê conta dos mecanismos de interferência da mídia no processo de accountability, como ela atua no sentido de obrigar os governantes ou ocupantes de cargos públicos a prestar contas de suas ações perante a opinião pública, como a mídia pode interferir para assegurar maior transparência nas tomadas de decisão e na condução de políticas públicas.

Acredita que o leitor confia na investigação da imprensa e faz dela o seu porta-voz?

F.L.-W. ? Alguns acontecimentos recentes parecem indicar que a mídia é mais confiável, para uma parcela da população, que o poder Judiciário, por exemplo.

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A teledramaturgia pode ser uma boa referência para o público entender como se operam as mudanças no processo político brasileiro?

Mônica Almeida Kornis ? A teledramaturgia no Brasil, sobretudo na programação da Rede Globo, vem se pautando desde o início dos anos 70 por uma preocupação realista, sintonizada com transformações políticas, sociais e culturais do mundo contemporâneo. No caso da programação ficcional cuja ação transcorre em diferentes momentos da história brasileira, como é o caso de Anos Dourados, essa operação igualmente ocorre, pois é o olhar do presente que reconstrói esse passado. Nesse sentido, a teledramaturgia é sem dúvida um importante território no qual se movem questões não só de ordem política, mas também de caráter social e cultural. E daí a importância em analisá-la no interior de sua construção narrativa.

(*) Assessora de imprensa da Editora FGV; e-mail <edassimp@fgv.br>; tel. (21) 2559-5550