CORÉIA DO NORTE
Giulio San Martini (*)
O governo da Coréia do Norte certamente é o mais fechado do planeta. Quando da divisão da península em Norte e Sul (1948) o poder ficou com Kim Il Jog, com a morte deste passou para seu filho Kim Il Sung. O país tem pouco mais de 20 milhões de habitantes, ocupa o 75? lugar no índice de desenvolvimento humano (32? para a Coréia do Sul). A diferença entre as duas nações é abissal; vamos a um só dado: renda per capita de US$ 680 para o Norte, contra US$ 9.700 para o Sul.
Num regime ditatorial muito fechado como a Coréia do Norte, é interessante saber como funciona a mídia no país:
Mídia impressa
Editorial
Existem pouquíssimas livrarias em Pyongyang, os únicos livros disponíveis, são os escritos pelos dois "líderes" (pai e filho), existem ainda manuais e guias turísticos. Esses livros são distribuídos nas escolas e nas bibliotecas, onde podem ser retirados por empréstimo. A maioria dos livros em circulação foi escrita ou é atribuída a Kim Il Sung, que tem um catálogo de mais de 1.100 obras tratando de todos os assuntos: ideologia, história, agricultura, hidráulica, mecânica, engenharia etc.
Os poucos livros estrangeiros só podem ser consultados nas bibliotecas e são de assuntos exclusivamente técnicos. Outros livros estrangeiros são guardados pelo governo, com acesso somente às altas autoridades, assim como livros coreanos de antes do regime, pois estes são perigosos. Por exemplo: na biografia do "líder" consta que ele participou da guerra contra o Japão, contudo, nessa época ele tinha somente três anos.
Jornais e revistas
Existe praticamente um diário, o Nodong sinmun, com uma tiragem de um milhão de exemplares. É exposto em muitos locais públicos mas quase não é lido. Em suas seis páginas as notícias não mudam: homenagens, declarações de estima e telegramas de felicitações para o "líder" Kim Il Sung, notícias sobre os fantásticos resultados econômicos do país. Do exterior, críticas ferozes aos EUA e à Coréia do Sul. A publicidade, que é inexistente no paíiacute;s, nesse jornal tem um pequeno espaço no fundo das páginas.
As revistas são duas, Pyongyang Times e Korea Today. O sistema é o mesmo do jornal: nas capas e nas páginas, sempre fotos de Kim Il Sung. É ele abraçando a pátria, inaugurando fábricas e obras, e assim vai.
Internet
Há um único "internet cafè" em Pyongyang, no bairro das embaixadas, mas a navegação custa US$ 10 a cada meia hora. Mesmo com esse preço proibitivo à maioria da população, o acesso a notícias é proibido ao cidadão norte-coreano.
Somente os oficiais do Partido e do Exército e os dirigentes podem dispor de fontes de informações normais, mas esse acesso só é possível no Ministério do Exterior e em outras quatro repartições.
Cinema
Existem alguns cinemas em Pyongyang, mas sua freqüência é restrita a um pequeno núcleo da população. O assunto principal dos filmes é, obviamente, a propaganda, que veicula suas mensagens de ódio ao Ocidente e aos inimigos do Sul. Também exaltam a pátria através de uma mitologia criada pelo Estado, da qual faz parte a história oficial de que o primeiro homem sobre a Terra tenha surgido na Coréia.
Rádio
Somente 30% das casas norte-coreanas possuem rádio, mas estes estão sempre presentes no metrô, nas fábricas, em locais de encontros e até nos campos, onde carros de som transmitem slogans e cações militares. Segundo o Regime, isso faz com que a produção aumente. Existem duas principais estações: Radio Pyongyang e a Estação Central da Coréia, a programação alterna músicas com blocos de informações, ou seja, propaganda do regime. A cada hora há um noticiário, que consiste na leitura do principal jornal. Entre marchas e canções militares, ouvem-se notas sobre a filosofia Juque (teoria do ditador Kim Il Sung), sobre a situação interna do país e, como não poderia deixar de ser, contra a Coréia do Sul.
Televisão
Os filmes na televisão têm o mesmo sistema daqueles do cinema. Existem os telejornais, mas seguem sempre a mesma rotina. Como primeira e muitas vezes única notícia do dia, fala-se da visita do "querido líder Kim Il Jong" a uma nova fábrica, a uma cooperativa, à cerimônia de lançamento de pedras fundamentais e inauguração de obras.
A montagem do serviço é sempre o mesmo: Vê-se o ditador chegar no local acompanhado de uma dúzia de colaboradores, duas moças estão a seu lado e lhe ilustram os prodígios e as características daquilo que verá. O "líder", sempre vestindo um uniforme bege, assume um ar ausente e desinteressado. Jamais diz uma palavra (recusa-se a falar em público), olha em volta, até que se detém em algo que lhe interessa, nesse ponto assume sua posição preferida: cruza os braços, curva as costas e estufa a barriga, seu seguidores fazem o mesmo, prontos para receber algum sinal do "líder", que nunca acontece, e assim a visita continua.
A câmera agora focaliza uma longa fila de operários, que em perfeita sincronia continuam a trabalhar felizes "ignorando" a presença do "líder". Uma voz de mulher comenta o serviço, o emotivo tom de voz parece com o de quem está incitando um exército a fazer o decisivo ataque. As palavras são gritadas e depois interrompidas num ritmo veloz e cadenciado, aí entende-se que o objetivo não é a fábrica, mas a celebração da grandeza de Kim Il Jong. Este é, salvo acontecimentos extraordinários, o telejornal norte-coreano.
Algumas vezes são apresentados lançamentos de mísseis (nunca focalizado quando estão em terra), encontro entre líderes locais, festas e paradas militares e cenas em escolas, geralmente das atividades esportivas dos alunos.
As notícias do exterior são raras. Mostram cenas de violência urbana, de guerra, um mundo caótico. A mensagem, naturalmente, é de que a Coréia do Norte é o único país onde reina a paz e a tranqüilidade, enquanto o resto do mundo é o inferno.
Sobre o assunto o jornalista e escritor Tiziano Terzani, que esteve no país, escreve "(…) a gente verdadeiramente está convencida que o muro de 240 km que corre junto à zona desmilitarizada entre Norte e Sul, tenha sido construído pelos terríveis americanos para impedir que os sul coreanos venham viver no esplêndido Norte, que Seul é uma cidade de miséria, corroída pela prostituição e pelo turismo, que as condições de vida no resto do planeta são assustadoras e que os povos do mundo, não desejam outra coisa que estudar e aprender as lições do Chefe Supremo, Kim Il Sung".
Texto de apoio
Morelli, Gieri ? Dossier Corea. Viaggio nel paese piu isolato del mondo ? 2003
(*) Pesquisador, escritor e jornalista