PICADEIRO
Deonísio da Silva
O presidente Fernando Henrique Cardoso não é um nefelibata, nem pernóstico em língua portuguesa, mas quando utilizou o adjetivo soez para qualificar o terrorismo provocou na repórter que o ouvia uma rara combinação de ignorância, falta de intuição e perda de oportunidade de aprender uma nova palavra e melhorar seu universo vocabular, muito rarefeito, ao que parece (Folha de S.Paulo, 3/10/01). A Folha fez a correção posteriormente, mas não fez referência alguma ao editor da repórter por cujos olhos o texto também passou. Ou não?
Como a palavra lhe fosse desconhecida, a moça confundiu soez com Suez. Porém o mais espantoso é a forma como entendeu e explicou a falta presidencial: “FHC se referia aos combatentes egípcios que lutaram contra os israelenses na região de Suez, em 1973, e atacavam seus oponentes por meio de túneis subterrâneos abandonados, de surpresa”.
O Estado de S.Paulo também escorregou em matéria sobre o porta-aviões Nimitz, em exercícios ao largo do Rio de Janeiro. O repórter escreveu que localização do navio era segredo… embora um fotógrafo do jornal estivesse a bordo. Na mesma matéria, o autor se refere a um “contra-almirante da Marinha”. Queria que fosse o quê? Da força aérea? E que entre os marujos houvesse alguma apreensiva aeromoça em parceria de algum brigadeiro-do-(m)ar?
Ó dor! Justo dois de nossos maiores jornais!
Assim, no Brasil, a primeira vítima da cobertura do terrorismo descomunal que assombrou os EUA vem sendo a língua portuguesa. Naturalmente, depois da indiferença dos apresentadores de telejornais quando noticiaram os atentados.
Ah, a segmentação! Título secundário do diário Valor no dia seguinte ao primeiro ataque americano ao Afeganistão (8/10): "Mercado teme novos atentados". Por que o mercado e não o governo, o país, a sociedade, o mundo? Só para dizer que é a visão especializada? (A.D.)