FOLHA DA TARDE, RS
Walter Galvani (*)
Texto da orelha de Olha a Folha ? amor, traição e morte de um jornal, de Walter Galvani, 206 pp., Editora Sulina, Porto Alegre, 2002; <www.editorasulina.com.br>, e-mail <ed.sulina@via-rs.nte>
Fui o último diretor da Folha da Tarde, de Porto Alegre. Coube-me, portanto, a inglória tarefa de fechar a porta e apagar as luzes. Assim escrevia, ainda com a mágoa no peito e a frustração do acontecimento, “uma enorme amargura de que não me livrei ainda” – quando da primeira edição deste livro, em 1996. Hoje, passados quase vinte anos do fechamento, vê-se que o título continua vivo e disputado, o que motivou ações objetivas e procedentes de proprietários e dos concorrentes.
Depois do resgate feito, posso encarar em paz recortes e coleções de jornais e acompanhar com orgulho todos os que passaram por aquela valiosa escola que lançou tantos profissionais no jornalismo local e nacional.
Posso confirmar o que defendo desde os velhos tempos de sua circulação: tal era sua força que marcou toda a imprensa que até então se fazia no Rio Grande do sul e que se continuou a fazer. O formato, por exemplo, o tablóide, tornou-se norma aqui, já alcançou Santa Catarina e é padrão praticamente universal no mercado gaúcho. Seu estilo de jornalismo com notas curtas, pequenos tópicos e grandes reportagens, característicos dos vespertinos do seu tempo, também predominam.
O que não se faz mais é jornal vespertino, isso não, premidos por circunstâncias que analisamos neste livro, que vão do trânsito ao estresse, passando pelo desenvolvimento do jornalismo eletrônico.
No mais, os seus antigos redatores continuam se reunindo no mínimo duas vezes por ano, relembrando a força daquele jornal e a unidade de propósitos daquelas redações que se sucederam. Mas continuamos achando que perdemos para nós mesmos e que as mudanças equivocadas e a crise financeira que a antiga empresa viveu é que trouxeram a nossa derrota. E que faltou um pouco de reação da cidade, que assistiu atônita e paralisada, o desfecho que abateu o império Breno Caldas.
Foi um caso de amor, traição e morte e a lógica não funciona em acontecimentos deste tipo. Porto Alegre perdeu e a falta que faz a Folha da Tarde é tão grande que é suficiente olhar para ver que, aqueles que não a imitam ou trazem até seu nome à baila, procuram apresentar produtos que assinalam o velho estilo vitorioso que começa no tamanho e vai até o tratamento das matérias.
Ainda haveria lugar para a Folha da Tarde nos dias de hoje? Os desafios são a característica da atividade jornalística. Quando um repórter sai da redação, indo para a rua em busca da informação, inicia uma corrida de obstáculos que precisa vencer, um a um, para concretizar seu trabalho. Quando um redator reúne imenso material e precisa reduzi-lo a uma coluna de 10 centímetros, é o espírito da velha Folha que sobrevoa e ainda pulsa nas ruas da capital dos gaúchos.
(*) Jornalista e escritor. Trabalhou na Folha da Tarde, Folha da Manhã e Correio do Povo (onde atualmente é colaborador); escreve nos jornais ABC Domingo e Diário de Canoas, e na Rádio Guaíba apresenta um programa cultural diário; autor de Brasil por linhas tortas, Um século de poder ? os bastidores da Caldas Júnior e Nau Capitânia ? Pedro Álvares Cabral, como e com quem começamos ? este com o prêmio Casa de Las Américas.