Monday, 23 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

A velha discussão das fontes

BBC SOB TIROTEIO

Ninguém duvidava de que a discussão sobre fontes voltaria à tona com a morte do informante da BBC, David Kelly. Quando o cientista se suicidou, a BBC declarou oficialmente que ele era sua fonte, antes guardada a sete chaves. A questão agora é se a promessa de anonimato se estende à condição póstuma.

"A proteção de fontes é de importância enorme ao que fazemos", disse Paul Slavin, vice-presidente sênior da ABC News. "Sem fontes que confiam que você cumprirá sua promessa, os jornalistas desse país estarão em maus lençóis". Em circunstâncias normais, uma promessa de anonimato é honrada mesmo se a fonte morrer, diz Slavin. O vice-presidente, no entanto, não quis comentar o caso específico da BBC.

A BBC, prevendo possíveis reações adversas, se adiantou em um comunicado oficial. "Depois de sua morte, acreditamos que, para encerrar essa especulação, seria importante revelar a informação o mais rápido possível."

Alex Jones, apresentador do programa Media Matters, da PBS, pensa diferente de Slavin. Para ele, jornalistas devem fazer promessas sérias de confidencialidade, mas devem revê-las se a pessoa morre ou se a história muda dramaticamente, como foi o caso da BBC. Os repórteres, segundo Jones, também não têm obrigação de manter a promessa se a fonte mudar sua história.

"Acho que [a BBC] o protegeu, sim", disse Jones. "Proteção, a partir de certo ponto, não faz sentido. Você não vai prejudicar sua carreira. Não acho que uma revelação gratuita de fonte faz sentido, mas acho que [Kelly] estava envolvido em uma situação muito importante."

David Bauder [AP, 21/7] conta que o único caso passível de comparação nos EUA, em termos do anonimato da fonte ser crucial em uma reportagem de grande interesse ao governo, é o do famoso "Deep Throat" ("Garganta Profunda"), a fonte do Washington Post para as reportagens sobre a investigação do caso Watergate. Os repórteres do Post, Bob Woodward e Carl Bernstein, mantiveram a promessa de confidencialidade por três décadas, a despeito de especulações infindáveis sobre a fonte. Os dois disseram que só revelam a identidade de Garganta Profunda após sua morte.

Os jornais do magnata americano Rupert Murdoch estão em ótima forma para criticar a BBC. Tanto que seus principais jornais britânicos, The Times, Sun e News of the World, foram acusados no dia 22/7 de serem usados para prejudicar a emissora. De fato, segundo Tom Leonard [The Telegraph, 23/7], os veículos de Murdoch foram bem mais dedicados que outros jornais em apoiar Tony Blair na briga contra a BBC. E a ferocidade se intensificou na semana passada.

Em resposta a um artigo do Times, a BBC considerou entrar com ação legal se não recebesse pedido de desculpas de um parlamentar que disse ao jornal que Gavyn Davies, presidente da BBC, deu pistas falsas aos governantes sobre a identidade da fonte do dossiê.

Especula-se que alguém superior aos editores do News of the World interveio, uma vez que a equipe do jornal ficou surpresa com a mudança súbita na linha editorial em relação à crise entre BBC e Downing Street.

Enquanto o Sunday Times é o único veículo de Murdoch a adotar uma postura mais moderada, os dois diários do magnata deixaram bem claro na semana passada para quem suas simpatias estão direcionadas. No dia 21/7, o Sun disparou a manchete "You Rat" (algo como "Seu rato"), em referência a Andrew Gilligan. Um artigo dentro do jornal carregava o título "Cabeças devem rolar na BBC", enquanto perguntava "como poderemos confiar na BBC de novo?", em coluna ao lado de um artigo simpático ao primeiro-ministro. No mesmo dia, a primeira página do Times seguia linha semelhante, contrastando a história sobre a BBC "em crise" com um texto comovente sobre o exaustivo reerguer-se de Blair.

Funcionários da BBC acham que Murdoch ficou furioso após Greg Dyke, diretor-geral da BBC, fazer um discurso, este ano, alertando para o prejuízo provacado à TV britânica caso as emissoras americanas consigam assumir estações na Grã-Bretanha. Murdoch é dono da conservadora Fox News.

Um porta-voz da News International, de Murdoch, disse que a idéia de seu proprietário ou algum de seus representantes ter interferido na linha editorial dos jornais é "besteira". "Essa é uma questão que diz respeito aos editores… Não assumimos posições pela companhia."

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