UNIVERSIDADE DE COLÚMBIA
Norma Couri (*)
A guerra surda travada nos bastidores de uma das maiores universidades americanas está produzindo tantos seminários e palestras quanto os que discutem o papel da imprensa pós-11 de setembro. Matriz e celeiro de prêmios Pulitzer, considerada uma das melhores do mundo, a Faculdade de Jornalismo da Columbia University está acéfala ? e ficará sem reitor até que a universidade (membro da prestigiada Ivy League em companhia das melhores do país, Harvard entre outras) e a faculdade chegarem a um acordo. O ponto polêmico: o curso de mestrado da faculdade de Jornalismo deve ou não tornar-se mais acadêmico?
O mestrado da famosa J-School (Journalism School) é composto de aulas essencialmente práticas aliadas a uma boa dose de teorização ? jamais o contrário. A aula de abertura já dá o tom, atirando os alunos na rua para fuçar matérias; de preferência, furos. As provas exigem trabalhos profissionais de reportagem, fotografia, radiojornalismo ou documentários. E a tese trará a evidência de que o mestrando incorpora um jornalista e não um compilador de citações, surrupiador de teses passadas ou exibidor da sabedoria de compêndios. Mestres em teoria podem procurar outro curso. Não se iludam: os alunos da J-School são bombardeados com teorias e regras que devem conhecer de cor. O segredo é jamais revelar o que sabem ao leitor ? mesmo que esse leitor seja o orientador, com poderes de determinar sua aprovação no final do ano. O comportamento deve ser idêntico ao de um jornalista tarimbado fechando uma enorme, bem apurada, inovadora, investigativa e ótima reportagem.
Caso contrário, bomba ? que acontece com freqüência. A carga horária é pesadíssima, o estresse ultrapassa o ponto máximo ? um mestrando da J-School é facilmente identificado nas ruas de Nova York onde Columbia está secularmente instalada: ele exala tensão. O filtro de admissão é apertadíssimo, a conclusão do curso é quase uma sorte.
Guia maior
Daí o impacto do artigo do presidente da Columbia University, Lee Bolinger, publicado semana passada no The New York Times. Ele suspendia a nomeação de um novo reitor para a Faculdade de Jornalismo. Motivo de tanta controvérsia: “as várias visões sobre o que uma Faculdade moderna de Jornalismo deve ser”. Bolinger admite: “Embora algumas coisas estejam claras, a Columbia School of Journalism dele continuar a ser líder no mundo inteiro”. E conclui: “Mas não podemos esquecer (…) o fenômeno da globalização (…). Vivemos numa era em que o sistema de comunicações sofre mudanças constantes e revolucionárias, sendo, ao mesmo tempo, um elemento crítico na formação de democracias, mercados, cultura (…). Ensinar o ofício do jornalismo é um objetivo valioso mas claramente insuficiente neste novo mundo e dentro dos padrões de uma grande universidade”.
O Conselho de Professores reagiu: “Podemos assegurar que o ato de escrever, reportar, entrevistar e editar continuarão a ser os pilares do nosso programa”.
Neste momento, o coração dos mestrandos balança entre o academicismo que reina nas outras faculdades e, como o próprio Bolinger reconheceu, a marca que fez da J-School quase a única no mundo.
Esta decisão pode mudar radicalmente o rumo na profissão num país pautado pela reportagem investigativa, e que tinha até então na Columbia University o seu maior guia: os melhores jornalistas do país passaram pela J-School tal como ela era até agora. Uma faculdade com foco estritamente acadêmico, atendendo aos apelos da globalização, produzirá jornalistas capazes de derrubar um presidente como aconteceu com o caso Watergate?
(*) Mestre em Jornalismo pela Columbia University