DIRET?RIO ACAD?MICO
CURRÍCULO
Rosana Cabral Zucolo (*)
A herança de 1984 é muito recente em termos de tempo histórico e constituição de realidades. É impossível deixar de refletir que ela não pode ser dissociada de outra herança, que a antecede em 20 anos, e hoje se concretiza numa sociedade dividida no seu quadro de valores, fragmentada nas referências que poderiam constituir um projeto nacional. Isso preocupa quando se fala em novos rumos, na busca/construção de referências sólidas num contexto em que a universidade brasileira vive uma crise grave e profunda: a de identidade, representação e rumos futuros.
Na questão específica dos cursos de Jornalismo, é inevitável que o currículo mínimo de 1984 continue como matriz inspiradora dos novos cursos. A resolução n? 002 estabeleceu a divisão do currículo meio a meio, em disciplinas teóricas e as específicas das habilitações, e a exigência detalhada de instalações laboratoriais. Definiu um tronco comum, com a criação de disciplinas optativas à escolha do aluno, e deu ênfase aos projetos experimentais. Por muito tempo, foi ela a referência mais concreta do ensino de Jornalismo.
Nilson Lage, um dos relatores do currículo de Comunicação à época, já refletia que a resolução era um passo no sentido de abrir as escolas à realidade, "criando contradições que permitissem a superação do academicismo e da ineficiência". Passados 20 anos, continuamos enfrentando problemas da mesma ordem. Não se trata de dualidade, mas sim de inevitabilidade. Em tempos de história, estamos na curta duração.
Os cursos de Comunicação Social formaram docentes nos modelos anteriores. Muitos deles hoje ocupam postos-chave, seja na academia, nas comissões de avaliação ou na superestrutura do ensino superior. Nem todos "arejados" e com mobilidade propositiva. Permanecem, em muitas comissões, exigências extremamente legalistas e inflexíveis na constituição e no reconhecimento dos cursos. São os mesmos que para rejeitar propostas distintas recorrem ao argumento de que as novas diretrizes da LDB ainda não foram aprovadas. E não falo aqui de propostas muito ruins ou inconsistentes.
Desafio, a questão-chave
No contexto da política educacional brasileira, sempre é bom lembrar que a institucionalidade tem sido fundamental, e nem sempre os jogos de interesse são favoráveis às melhores propostas. Sem entrar na questão dos lobbies, basta remeter ao quadro em que a avaliação do ensino superior transformou-se num ranking de melhores e piores, escondendo informações fundamentais à análise do próprio ensino superior no país e das ações do MEC.
Num contexto de disputas de poder trata-se, sim, de assegurar caminhos claros. No caso dos cursos de Jornalismo, hoje, o trabalho da comissão se constitui numa exceção, cujos resultados da adoção de critérios claros já se fazem sentir. Com certeza, o investimento na visibilidade e na democratização do acesso aos resultados é um deles. Isso é inédito ? lamentável que o seja ? e fundamental. Deveria ser prática das demais comissões de avaliação.
Por outro lado, a questão-chave do ensino do Jornalismo ? a organicidade dos cursos para atender a complexidade da função jornalística na sociedade ? continua sendo o desafio.
(*) Jornalista e professora na Unisinos/RS
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