JORNALISMO CULTURAL
“Pedras que rolam, suspiros que voam”, copyright Comunique-se (www.comunique-se.com.br), 24/06/03
“No meu apanhado de bons exemplos desta rara espécie, o jornalismo cultural, não deu espaço para mencionar as revistas. Corrijo a falha.
Sinto falta de consistência nelas (mais uma vez estou falando daqui dos EUA – acrescento lá no finzinho minhas tênues constatações brasileiras. Atirem à vontade, como sempre). Ótimas matérias se misturam aos habituais bolos de noiva – fofinhos, doces demais, vistosos por fora, vazios por dentro – que costumam ser, neste dias dominados por celebridades, as chamadas de capa.
A Vanity Fair é um exemplo perfeito. É preciso passar por uma verdadeira artilharia de suspiro para chegar ao que interessa. A quem puder pôr as mãos na edição de julho, recomendo um café forte e amargo para contrabalançar o pico de insulina causado pela capa – um bando de ninfetas apregoando, na verdade, o novo lançamento da casa, Vanity Fair Teen – seguido por uma ligação direta com o excelente perfil, assinado por Mark Seal, de Mike Fleiss e Mike Darnell , os mais ativos produtores de ?reality shows? dos Estados Unidos, Algumas páginas adiante, Sam Kashner – um sujeito que tem um ego-gigante, moléstia que aliás aflige quase todos os colaboradores da VF – consegue ver além de si mesmo numa ótima narrativa de uma saborosa nota de pé de página da história do cinema, a filmagem de ?The V.I.Ps?, uma película de 1963 que reuniu um verdadeiro zoológico de monstros sagrados: Elizabeth Taylor, Richard Burton, e Orson Welles.
Gostaria de relatar que a Rolling Stone, que foi minha cartilha-mestra nos anos 70, continua sendo a pedra de toque do setor cultural. Mas não é. Ela está tentando correr atrás da concorrência, uma tática sempre arriscada, ainda mais quando a concorrência são os ?filhos? da própria RS. A conexão música-imprensa merece um capítulo à parte (que virá em breve) mas, para os propósitos deste arrasoado, digo que muito raramente algo que a RS tem publicado ultimamente me salta aos olhos como original, surpreendente, divertido ou profundo.
Para informação musical pura e simples – mas nem por isso chata ou incompleta – prefiro muito mais a Mojo inglesa. E para o olhar esperto sobre as sempre intrigantes implicações sócio-políticas dos produtos musicais, frequentemente acho as melhores contribuições na concorrência – a Vibe, por exemplo, publicou, no final do ano passado, uma das melhores matérias sobre a cena hip hop brasileira que eu já li em qualquer lugar.
Resta dizer que a Premiere francesa me parece consistentemente superior à americana, mas que sua colega ianque tem achados isolados – a cobertura fotográfica do Oscar, os textos de William Goldman sobre roteiro – de grande brilho. Que a Rolling Stone espanhola é a melhor de todas as edições da revista, até mesmo sua nave-mãe. Que a nova edição da Radar tem dois terços de bobagem e um terço de belas matérias, inclusive o perfil dos intelectuais de direita que construiram – e constroem – o que se poderia chamar de ?Doutrina Bush?. E que a Entertainment Weekly deve ser a revista mais bem editada do mundo – e um exemplo perfeito de como um conceito editorial baseado exclusivamente na agenda (por definição) não precisa se limitar a ela.
No Brasil, peço indulgência para não falar da Bravo!, para a qual colaboro há muitos anos. E admito que muito raramente a Trip não me surpreendeu, agradavelmente, com as melhores sacadas do que é cultura, como ela é feita e consumida no Brasil.”
TELEJORNALISMO
“A morte da imagem”, copyright Comunique-se (www.comunique-se.com.br), 27/06/03
“Esta semana a imagem nos nossos telejornais sofreu uma grande perda. José Dantas, 62, um dos nossos mais antigos, talentosos e desconhecidos cinegrafistas morreu e foi enterrado discretamente aqui no Rio de Janeiro. José Dantas era um digno representante de uma categoria quase em extinção. Fazia parte de uma velha tradição de profissionais da imagem que, apesar de todas as tentativas de mudanças semânticas, ainda são conhecidos e anunciados pelos colegas repórteres de TV simplesmente como ?o meu cinegrafista?. Assim mesmo, sem nome e sem reconhecimento, um mero acessório na escalada do sucesso de tantas estrelas do nosso telejornalismo.
Apesar de uma longa carreira na TV, cinegrafistas como o mestre Dantas, tiveram o privilégio de serem formados na escola do cinema e exceleram nos mistérios da luz e da película cinematográfica. Mas também são profissionais sem qualquer reconhecimento do público. Aqui entre nós, fico pensando o que teria acontecido, imagino as homenagens que teriam sido prestadas se tivesse morrido um fotógrafo como Sebastião Salgado ou Evandro Teixeira. Mas cinegrafista não é conhecido ou reconhecido pelo grande público. É considerado um jornalista de segunda classe, ganha pouco, não tem nome, de origem humilde, nunca precisou de diploma e ninguém jamais se importou muito com isso. Entre tantas injustiças, garante à TV o que ela tem de melhor, aquela imagem que jamais esquecemos.
O cinegrafista só é mesmo lembrado quando morre, só na guerra do Iraque, cinco cinegrafistas foram mortos, inclusive uma cinegrafista argentina. Eles perderam suas vidas tentando nos trazer as imagens que garantem a verdadeira ?mágica? do nosso principal e tão criticado meio de comunicação, a televisão. Mas os cinegrafistas, em sua maioria, são profissionais ?silenciosos?. Convivem de maneira muito próxima com a notícia pelas lentes de suas câmeras e com a hipocrisia das acusações constantes de sensacionalismo. Eles nem sempre podem ou se dispõem a defender o produto de seu trabalho. Num cenário profissional onde a escala de valores é uma escala de ?vaidades? medida pela capacidade de se defender com ?palavras?, o jornalista da imagem leva grande desvantagem. Em sua defesa, a única imagem que conta é a imagem que tantas vezes representa a sua própria morte na frente de outras câmeras.
Apesar de existirem grandes profissionais, figuras lendárias, conhecidos pelos especialistas do meio televisivo, nomes como o pioneiro Ortiz, da Tupi, o velho Cabreira, Orlando Moreira ainda brilhando em Nova York ou o José Andrade, para citar somente alguns mestres, a verdade é que esses jornalistas da imagem tendem a ser antes de tudo ?anônimos?.
E o pior é que muitas vezes seu trabalho, tão importante, chega a ser confundido com o trabalho de ?amadores?. É muito comum assistirmos extasiados às últimas imagens produzidas por aqueles destemidos ?cinegrafistas amadores?. É certo que dificilmente encontramos ou aceitamos notícias produzidas por ?repórteres amadores? em nossos telejornais, mas damos grande destaque aos recorrentes ?cinegrafistas amadores?. Muitos deles são, em verdade, profissionais não-credenciados que produzem imagens à qualquer custo, sem qualquer monitoração de origem ou qualidade, mas sempre regiamente disputadas pelas ávidas agências de notícias ou TVs. Cinegrafia sem nome rende dinheiro para alguns poucos profissionais, mas sem dúvida enriquece as televisões e hipnotizam o público.
Aproveitei a oportunidade e considerando que como ex-cinegrafista, seria suspeito para falar do assunto e convoquei ou provoquei um testemunho de uma colega jornalista, correspondente de guerra da agência APTN, Cristiana Mesquita.
Como não chorar a morte de um velho cinegrafista como o Dantas quando sabemos que a perda é irrecuperável? Dantas era da escola de outros ilustres profissionais da imagem que faziam a diferença. Me explico: O Dantas , assim como Orlando Moreira, Toninho Marins, Flavio Alexim, para mencionar apenas alguns dos monstros sagrados com quem trabalhei, vinham de uma escola de cinema em que cada pé de filme era precioso e cada cena tinha que contar uma história. Além da habilidade técnica na captação das imagens eles também já tinham visto tudo, ou quase tudo, e para o ?foca?, ainda preocupado em decorar o texto e arrumar o cabelo para a passagem, se tornavam o olho atento do repórter.
Quantas vezes não fui cutucada por um desses cinegrafistas que dizia ?Olha lá, aquele é fulano de tal, vai em cima que ele sabe o que está acontecendo? e nós partíamos de microfone e câmera em punho para fazer as perguntas. Ainda assim, poucas vezes vi o trabalho desses caras ser reconhecido. Ouvia sempre que televisão é trabalho de equipe e que todos são importantes mas na realidade, o trabalho do cinegrafista só era comentado quando ele perdia alguma cena ou o foco.
Ninguém dizia nada quando belas imagens eram arruinadas por textos e edições medíocres. Mas tudo bem, os caras costumam apenas sacudir os ombros, ir tomar um chopp na Seculo XX (tradicional bar próximo à Globo no Jardim Botânico, no Rio de Janeiro) e pensar, ?pelo que eles me pagam não vale a pena reclamar.? Um repórter que não ouve e aprende com o cinegrafista é um tolo. E a empresa que não dá o valor merecido a esses profissionais deveria fazer rádio.
Eu costumava mostrar em palestras algumas edições que eu fazia com imagens da guerra da Bosnia sem texto e perguntava a platéia do que eles se lembrariam daqui há 20 anos; das imagens que eu tinha acabado de
mostrar ou das milhares de palavras que haviam sido escritas sobre o assunto? No fim de uma dessas palestras, o cinegrafista Daniel Dantas (outro Dantas) veio falar comigo com lagrimas nos olhos para dizer obrigado. Eu é que agradeço. Assim como as imagens que me emocionaram não vou esquecer dos cinegrafistas que as gravaram – jamais.
Agradeço a preciosa contribuição da Cristiana Mesquita. Hoje, apesar de lutar com as palavras, ainda tenho muito orgulho da minha formação em TV como cinegrafista. Mais do que nunca, acredito que as palavras e as imagens, em verdade, se complementam para produzir que há de melhor na Televisão. Tudo mais é rádio com imagens!”
LALAU vs. TV GLOBO
“Juíza nega indenização para filhas e neta de Nicolau”, copyright Revista Consultor Jurídico (www.conjur.com.br), 26/06/03
“As filhas e a neta do juiz aposentado Nicolau dos Santos não conseguiram, em primeira instância, indenização por danos morais em ação movida contra a TV Globo. A juíza Cintia Adas Abib considerou de ?interesse público? imagens e informações veiculadas no ?Jornal da Globo? e no ?Fantástico? sobre o patrimônio da família do juiz aposentado. Ainda cabe recurso.
Maria Inês Bairão dos Santos, Maria Cristina Bairão dos Santos, Maria Virgínia Bairão dos Santos e Roberta dos Santos Castelli, filhas e neta do juiz respectivamente, não gostaram da exibição das imagens do apartamento em Miami e da casa de praia de Iporanga — Guarujá. As imagens foram obtidas pelo jornalista Caco Barcellos. As autoras da ação alegaram que ?não existia interesse público que pudesse justificar a veiculação das imagens?. O argumento foi rejeitado pela juíza.
De acordo com ela, é ?fato notório? o processo de investigação instaurado para a apuração das denúncias contra o juiz aposentado sobre corrupção e desvio de verbas públicas. ?Assim, a constatação da condição patrimonial do investigado extrapola sua esfera particular e atinge o interesse público, tendo em conta as denúncias referentes à obtenção de patrimônio mediante indevido uso do dinheiro público?, afirmou. Segundo Cintia, não houve abuso no exercício do direito de liberdade de informação.
As filhas e a neta de Nicolau queriam receber R$ 5 milhões de indenização por danos morais e requereram justiça gratuita. A TV Globo impugnou o valor da causa. A primeira instância manteve o valor e deferiu o pagamento das custas para o final do processo. O Tribunal de Justiça de São Paulo reduziu a quantia e fixou o valor da causa em R$ 20 mil. Elas também não conseguiram justiça gratuita.
A emissora foi representada pelo escritório Camargo Aranha Advogados Associados e as autoras pelo Oliveira Neves Advogados Associados.
Leia a íntegra da sentença:
Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo
Comarca da Capital
Consulta de Processos – 1? Instância
Processo: 000.00.634202-7
Classe: Indenização (ordinário)
Área: Cível
Distribuição: 13/11/2000 às 11:12 – Foro Central / 19? Vara Cível
Requerente: Maria Inês Bairão dos Santos
Requerido: TV Globo Ltda. (Rede Globo de Televisão)
Incidentes e Recursos:
Não há Incidentes ou Recursos vinculados a este processo.
Movimentações (Últimas 5 movimentações)
Data Movimento
24/06/2003 Sent. Compl.: Pedido Julgado Improcedente
Vistos. MARIA INÊS BAIRÃO DOS SANTOS, MARIA CRISTINA BAIRÃO DOS SANTOS, MARIA VIRGÍNIA BAIRÃO DOS SANTOS e ROBERTA DOS SANTOS CASTELLI, qualificadas nos autos, moveram ação de indenização, sob o rito ordinário, em face de TV GLOBO LTDA. onde alegaram, em síntese, que nos programas jornalísticos transmitidos pela Ré ?Jornal da Globo? e ?Fantástico?, veiculados em 11/08/2000 e 13/08/2000, respectivamente, houve exposição pública de suas imagens, por conta da reprodução de uma fita obtida por repórter da Ré, onde estavam registradas situações da intimidade familiar do Juiz aposentado Nicolau dos Santos Neto, pai das três primeiras Autoras e avô da última, incluindo as imagens das Autoras e de imóveis da família, sem a devida autorização.
A transmissão das referidas imagens, sem o consentimento das Autoras lhes causou danos morais, tendo em conta a repercussão nas esferas social e profissional, o que autoriza a respectiva indenização, conforme o pedido de fls. 25/26. Alegam as Autoras que não existia interesse público que pudesse justificar a veiculação das imagens, sem autorização dos respectivos titulares, não restando caracterizado o interesse puramente jornalístico da matéria, porquanto o referido procedimento da Ré teve como único escopo seus próprios interesses comerciais, relacionados ao aumento de sua audiência.
Ademais, as acusações que foram veiculadas na ocasião em relação ao Juiz aposentado Nicolau dos Santos Neto acabaram, indevidamente, sendo transferidas às Autoras, o que lhes causou sério comprometimento da imagem e violação de bens jurídicos indisponíveis relacionados aos direitos da personalidade. Juntaram documentos (fls.27/57). Citada (fls. 171), a Ré apresentou contestação (fls. 192/216) e protestou pela improcedência do pedido inicial, tendo em conta que não evidenciada a ilicitude de sua conduta, pois a reprodução das imagens das Autoras não ocorreu como um fato isolado, destituído de motivação, mas emergiu do contexto onde eram apuradas denúncias relacionadas ao Juiz aposentado Nicolau dos Santos Neto, pai das primeiras Autoras e avô da última. Notórias as informações, naquela ocasião, acerca das denúncias de corrupção e desvio de verbas públicas envolvendo o referido Juiz aposentado e o aprofundamento das investigações acabou por envolver, de forma inevitável, a constatação de seu patrimônio e de seus familiares próximos, o que conferiu interesse público à matéria reproduzida por meio da fita noticiada na petição inicial. Por fim, formulou considerações acerca do eventual montante da pretensão indenizatória das Autoras. Apresentada réplica (fls. 261/280). Realizada audiência de instrução, onde foram colhidos os depoimentos de fls. 331/372.
Oferecidas alegações finais, onde as partes reiteraram as teses anteriormente apresentadas (fls. 408/420 e 422/446). É o relatório. Decido. O pedido inicial das Autoras é improcedente, tendo em conta o conjunto probatório existente nos autos. A matéria central e relevante ao desfecho da presente ação reside na aferição da ocorrência ou de abuso no exercício do direito de liberdade de informação. Entretanto, não ocorreu o referido abuso por parte da Ré. Na lição de Darcy Arruda Miranda, em sua obra ?Comentários à Lei de Imprensa?, 3?. Edição, página 104, editora Revista dos Tribunais, temos que: ?A procura de informações significa o interesse jornalístico em correr em busca de notícias que representem interesse público, a fim de que sejam oportunamente difundidas. Corresponde a um trabalho magnífico de esclarecimento da opinião pública, de aperfeiçoamento dos meios de intercomunicação social, de intermediação cultural ou política e de combate ao intolerantismo. É a busca da verdade em sua própria fonte. O recebimento de informações ou de idéias é o acolhimento que se dá a todos quantos tenham algo a oferecer em beneficio da coletividade. São notícias, comunicações, relatos, opiniões, idéias levadas às redações, às estações de radiodifusão, às agências noticiosas.
A difusão dessas informações ou idéias, procuradas ou recebidas, é feita através da publicação ou transmissão. Por qualquer meio, na expressão legal, deve-se entender por qualquer dos veículos de divulgação que são colocados sob a égide da Lei de Imprensa?. A caracterização ou não do abuso do exercício do direito/dever de informação reside na aferição da efetiva utilidade e destinação da matéria veiculada pelos meios de divulgação, cujos contornos legais encontram-se regulamentados no Capítulo III da Lei n. 5.250/67. Inexiste abuso da Ré no presente caso, tendo em conta o caráter público das informações contidas na fita mencionada na petição inicial, em virtude do direito da sociedade ter conhecimento das questões referentes à utilização do dinheiro público.
Constitui fato notório, amplamente divulgado nos meios de comunicação, o processo de investigação instaurado para a apuração das denúncias que envolveram o Juiz aposentado Nicolau dos Santos Neto, relacionadas à corrupção e desvio de verbas públicas, por conta das funções administrativas desempenhadas junto à Justiça do Trabalho. Assim, a constatação da condição patrimonial do investigado extrapola sua esfera particular e atinge o interesse público, tendo em conta as denúncias referentes à obtenção de patrimônio mediante indevido uso do dinheiro público. Portanto, evidenciado o absoluto interesse público da matéria. Na medida em que foi veiculada a possibilidade de constituição de patrimônio com o uso de dinheiro público, pertencente ao povo brasileiro, a matéria não mais se restringe à esfera privada dos envolvidos, mas adquire relevância social. Também constitui fato notório, que prescinde de outras provas, nos termos do artigo 334, inciso I do Código de Processo Civil, que referidos bens eram desfrutados pelo Juiz aposentado Nicolau dos Santos Neto e por seus familiares, o que tornou inevitável a veiculação das imagens das Autoras, à luz do mencionado enfoque pública da matéria, como direito da coletividade à obtenção de informações acerca da destinação e uso do dinheiro público.
Acentuada relevância a atuação dos meios de comunicação da imprensa na fiscalização e formação das estruturas culturais e éticas da sociedade. O sério trabalho da imprensa contribui para o desenvolvimento da transparência da atividade pública e efetivo conhecimento da coletividade acerca da administração das receitas públicas, contribuindo para o aprimoramento do Estado. A liberdade de imprensa, como meio de controle das atividades dos agentes públicos – o que constitui direito dos cidadãos – se fortaleceu através da consagração do direito de informação, dotado de maior amplitude, à luz da garantia constitucional inserta no artigo 5?., incisos IV, IX, XIV, da Constituição Federal. Portanto, a matéria reproduzida pela Ré, através da divulgação da fita mencionada pelas Autoras, não teve como objetivo central a veiculação das imagens das Autoras, mas sim informar a sociedade acerca discussão que se estabelecia, por conta das denúncias de indevida utilização do dinheiro público relacionadas ao Juiz aposentado Nicolau dos Santos Neto, o que incluía, como conseqüência natural, a divulgação de hábitos familiares, caracterizando o caráter jornalístico da reportagem. Neste sentido os depoimentos de fls. 331/339 e 359/372, onde restou confirmado que não eram as Autoras as protagonistas da matéria, mas o objetivo era informar a sociedade acerca dos fatos dotados de relevância pública.
Cumpre consignar o seguinte ensinamento: ?Indenização-Responsabilidade Civil-Publicação, em jornal local, de carta de deputado estadual criticando os desmandos do Executivo municipal no trato com o desvio de verbas com ?funcionários fantasmas?-conduta regular que apenas buscou assegurar o direito constitucional à livre manifestação do pensamento-verba indevida? (RT 756/211). Os danos mencionados às fls. 340/358 não autorizam o acolhimento da pretensão inicial, posto que não caracterizado e elemento constitutivo da responsabilidade civil atinente à conduta ilícita da Ré. Ademais, cumpre registrar que não restou evidenciada qualquer responsabilidade civil da Ré, no que tange ao conteúdo da mencionada fita, pois o repórter da Ré teve acesso ao referido material através de terceira pessoa e, portanto, a Ré não teve participação nas filmagens. Portanto, a divulgação jornalística de fatos, com a preservação da autenticidade das imagens e informação originais, obtidos de forma lícita, confirma a impossibilidade de acolhimento da pretensão inicial das Autoras.
Diante do exposto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido inicial, no tocante à presente ação de indenização movida por MARIA INÊS BAIRÃO DOS SANTOS, MARIA CRISTINA BAIRÃO DOS SANTOS, MARIA VIRGÍNIA BAIRÃO DOS SANTOS e ROBERTA DOS SANTOS CASTELLI em face de TV GLOBO LTDA. e condeno as Autoras no pagamento em favor da Ré das custas, despesas processuais e honorários advocatícios que fixo em 20% do valor atribuído à causa, tendo em conta as diretrizes impostas pelo artigo 20, parágrafo terceiro do Código de Processo Civil, observando-se a alteração decorrente do V. Acórdão de fls. 157/160, dos autos do Agravo de Instrumento n. 254.769-4/1. No mais, julgo extinto o processo, com apreciação do mérito, nos termos do artigo 269, inciso I do Código de Processo Civil. P.R.I. São Paulo, 20 de junho de 2.003. CINTIA ADAS ABIB Juíza de Direito
Revista Consultor Jurídico, 26 de junho de 2003.”