EUA
"Imprensa poupou o governo, diz Rather", copyright Folha de S. Paulo/ The Independent, 19/5/02
Dan Rather, um dos mais respeitados e conhecidos homens de mídia dos EUA, disse que o clima de extremo patriotismo que envolve o país desde os ataques de 11 de setembro impede a imprensa de fazer as perguntas difíceis aos líderes do país. Ele se disse também culpado pela autocensura.
?Pode parecer uma comparação obscena, mas, você sabe, houve uma época na África do Sul em que as pessoas colocavam pneus em chamas nos pescoços dos que discordavam?, disse Rather. ?De alguma maneira, o medo aqui é de que ponham o ?pneu em chamas? da falta de patriotismo em seu pescoço. É esse medo que impede os jornalistas de fazer as perguntas mais duras sobre os assuntos mais sérios. Eu devo humildemente dizer que não me excluo dessa crítica?, afirmou.
O jornalista ainda acrescentou: ?Temo que o patriotismo se transforme numa fúria assassina que atropele os valores que este país procura defender?.
Desde os ataques terroristas de setembro, Rather, 70, âncora veterano da rede de TV CBS, tem muitas vezes personificado o próprio patriotismo americano.
Uma semana depois dos atentados, ele se desmanchou em lágrimas enquanto falava no programa de entrevistas de David Letterman. Depois disso, quando esteve no centro dos acontecimentos ao receber uma carta com antraz, ele declarou: ?Nosso maior problema não é o antraz. Nosso maior problema é o medo?.
Agora, Rather afirma crer que tentar trazer transparência aos atos do governo seja realmente o seu maior dever patriótico. ?Falta de patriotismo é não se levantar, olhá-los nos olhos e fazer as perguntas que eles não querem ouvir -?eles?, digo, são aqueles que têm a responsabilidade maior em nossa sociedade, a responsabilidade de mandar nossos filhos, nossas mulheres e nossos maridos, nosso sangue para enfrentar a morte.?"
"Retrato devastador da violência americana", copyright O Globo, 19/5/02
"Desde o fim do ano passado, o documentarista e apresentador de TV americano Michael Moore é o escritor mais lido dos Estados Unidos, e já ocupa tal posto também no Canadá e na Inglaterra. Seu livro ?Stupid white men? (?Estúpidos homens brancos?), um retrato evidentemente nada abonador da América governada por George W. Bush, está no primeiro lugar de todas as listas de best-sellers (na frente de John Grisham e companhia) e já vendeu 500 mil cópias desde o o lançamento.
Tal sucesso, totalmente inesperado – ?Depois do 11 de setembro os editores disseram que todos passaram a idolatrar Bush e eu mostrei que eles estavam errados?, diz Moore – vai ajudar e muito a distribuição mundial de seu novo documentário, o igualmente explosivo ?Bowling for Columbine?, que está em competição no Festival de Cannes.
– Se tem uma coisa que funciona nos Estados Unidos, é o capitalismo – diz o gordo Moore ao GLOBO entre gargalhadas, vestindo o boné de beisebol que se tornou sua marca como apresentador do programa ?TV Nation?. – O sucesso do livro foi um mergulho sem precedentes no mainstream americano, o que vai ajudar o filme. Por mais que as pessoas do sistema não queiram tocar em certos assuntos, o capital fala mais forte.
Os tais assuntos que as pessoas não querem tocar, no caso de ?Bowling for Columbine?, são o poder de fogo e as conseqüências trágicas da indústria de armamentos nos Estados Unidos. Moore faz um documentário demolidor provando que, enquanto num país desenvolvido médio há cerca de 200 assassinatos por arma de fogo por ano, nos Estados Unidos eles chegam a 11 mil. E ele explica isso pela proliferação das armas num país, segundo ele, criado ?sob a teoria do medo?.
?Estados Unidos foram fundados no medo?
– Essa violência está no DNA do nosso país – diz Moore. – A primeira linha da História americana é que os peregrinos ingleses vieram para a América com medo de serem perseguidos. O país foi fundado no medo.
Seu trabalho, baseado no humor, é sempre ferino e desconfortável. No caso de ?Bowling for Columbine?, ele parte do massacre de 12 alunos e um professor (fora as dezenas de feridos) que dois estudantes perpetraram na escola Columbine, no estado do Colorado. Com imagens de arquivo e depoimentos de sobreviventes, Moore começa se embrenhar na teoria do medo e da paranóia que defende: mostra como a TV manipula as estatísticas e a cobertura da violência, sobretudo praticada por negros e hispânicos, ou como a National Riffle Association, liderada pelo ator Charlton Heston, incentiva o uso de armas justamente nas cidades que sofreram com malucos em colégios (numa entrevista aterradora, o galã de ?O planeta dos macacos? e ?Ben-Hur? diz que a violência na América é devido ?à miscigenação excessiva?). Em cenas impressionantes, ele vai com dois feridos no massacre de Columbine à rede de lojas K-Mart, onde os assassinos compraram a munição, devolver as balas de 17 centavos alojadas em seus corpos e acaba, com a mobilização que seu estilo entrão gera, conseguindo que a rede suspenda sua venda de armas e munição.
– Eu acredito no cinema para mudar as coisas, sou militante mesmo – diz Moore, quebrando a regra dos principais documentaristas de hoje, sobretudo americanos, que se ambicionam apenas testemunhas.
Em outra cena impressionante, ao som irônico de ?What a wonderful world?, ele mostra com números de mortos as ações orquestradas pelo governo americano nos últimos 50 anos que resultaram em massacres de civis, como o golpe no Chile e o Vietnã.
– É impossível achar que essa violência do Estado não tem relação com a violência. Ao lado da Escola Columbine, fica a maior fábrica de mísseis do país, que, um dia antes do massacre, bateu recorde de produtos jogados em Kosovo.
Apesar da seriedade do tema, Moore e seus filmes são engraçadíssimos. Lembram o humor de um Buster Keaton, o homem que nunca ria diante das misérias humanas que, em geral, nutrem as comédias.
No fundo, com fama de anarquista, Moore se define como um social-democrata lutando por um mundo mais justo.
– Quando falo contra a influência americana, não falo que as pessoas devam deixar de comer no McDonald?s. Mas que não devem deixar acontecer nos seus países o que aconteceu nos Estados Unidos: o centro deixar lugar para a direita, o sistema de previdência social desaparecer, a solidariedade sumir.
Moore ficou famoso por filmes como ?Roger and me?, no qual registrou sua perseguição ao presidente da General Motors para saber por que ele fechara uma fábrica em sua cidade natal, e por ?The big one?, sobre os efeitos da globalização na exploração de trabalho escravo no Terceiro Mundo. Seu trabalho está em ascensão, tanto que seu filme rompeu uma regra em Cannes: desde os anos 50, é o primeiro documentário a buscar a Palma de Ouro."
VENEZUELA
"Hugo Chávez elogia Media Watch e pede imprensa livre e imparcial", copyright Agência Carta Maior, 17/5/02
"Em um gesto que demonstra a relevância do debate sobre a imprensa no atual cenário de crise institucional da Venezuela, o presidente Hugo Chávez convidou os fundadores do Media Watch Global – o observatório internacional de imprensa, criado durante o II Fórum Social Mundial, no início do ano – para em almoço no Palácio Miraflores, sede do governo.
O encontro foi realizado no dia 15, pouco depois da criação da seção venezuelana do Media Watch, que reúne jornalistas, intelectuais e membros da sociedade civil para um trabalho de monitoramento e crítica da imprensa local. Participaram da reunião jornalistas de 12 países, representando veículos como Le Monde Diplomatique e Radio France Internacional (França), El Mundo (Espanha), Il Manifesto e IPS (Itália), Página 12 (Argentina) e The Guardian (Inglaterra). Agência Carta Maior e O Pasquim 21 representaram o Brasil.
Prometendo falar pouco, Chávez fez uma saudação de cerca de uma hora aos convidados, relatou episódios do golpe de Estado e da reação popular e militar dos setores que saíram às ruas em defesa do governo. O presidente disse esperar que o Media Watch Venezuela contribua para a existência de uma imprensa livre, soberana e imparcial no país.
Não faltam fundamentos à crítica de Chávez. Durante a tentativa de golpe contra seu governo, os principais veículos de comunicação do país, tanto dos meios eletrônicos quanto impressos, adotaram um claro posicionamento favorável aos golpistas, cobrindo com destaque a rápida ascensão do líder empresarial Pedro Carmona. Analistas venezuelanos declararam que os grupos de comunicação participaram ativamente do movimento. Quando a revolta popular exigiu o retorno de Chávez ao poder, as principais televisões decidiram não mostrar imagens da mobilização, alegando que não queriam incentivar uma possível guerra civil.
Seria inevitável que o almoço se transformasse em uma coletiva de imprensa. Respondendo a El Mundo, da Espanha, o presidente da Venezuela informou que seguiria no mesmo dia para a Cúpula de Madrid, onde pretende buscar apoio junto a governos europeus. Il Manifesto, de Itália, perguntou se há risco de outra tentativa de golpe no país. Chávez afirmou que sim, não afastando a possibilidade de tentativas de homicídio contra ele, mas que não será fácil para os golpistas realizar novo ato.
Primeiro, porque sofreram um revés inesperado, perderam credibilidade e estão sendo investigados por suas ações. Segundo, porque o governo está fazendo um enorme esforço para acalmar o país, convidando ou mesmo convocando todos os setores da sociedade para um novo diálogo. Em especial, estão sendo abertas negociações com grupos empresariais, meios de comunicação, igrejas, sindicatos e outros setores populares. Os empresários da mídia, porém, já anunciaram que não participarão mais das conversações conciliatórias propostas por Chávez."
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"ONG deverá chegar à Itália, Colômbia e Argentina", copyright Agência Carta Maior, 17/5/02
"Criado durante o II Fórum Social, o Media Watch Global começou a operar efetivamente nesta última semana. Na segunda-feira (13), um encontro a Universidade de São Paulo com a delegação de jornalistas e intelectuais estrangeiros selou a criação do Media Watch Brasil, a seção local da ONG. Foi organizado também um comitê internacional encarregado de dirigir a ONG até sua completa legalização. Participam Roberto Sávio (IPS), Ignacio Ramonet diretor do (Le Monde Diplomatique), Jair Borin (diretor do Departamento de Jornalismo da ECA-USP), Joaquim Enesto Palhares (Agência Carta Maior), Bernardo Kuncinki (professor titular da ECA-USP e colunista da Agência Carta Maior) e Carlos Tibúrcio (membro do Comitê Internacional do Fórum Social Mundial). No dia seguinte, a delegação seguiu para Caracas, onde se juntaram a profissionais venezuelanos para organização do Media Watch Venezuela. Novas seções da ONG deverão ser criadas na Itália, Colômbia e Argentina.
Em uma de suas intervenções, Ignácio Ramonet defendeu o Media Watch como uma maneira de o cidadão comum ter acesso à crítica de imprensa, que tende a ficar restrita aos meios acadêmicos e eventos específicos, como o Fórum Social. ?Durante muito tempo a informação foi colocada como um quarto poder, que deveria defender os cidadãos dos abusos dos outros poderes. Mas a globalização econômica criou conglomerados midiáticos que tal porte que o objetivo de informar foi diluído entre outros interresses?, disse. ?Daí que é preciso fortalecer um quinto poder, que seria representado pela sociedade civil e deveria contrabalançar os outros poderes. É nesse contexto que o Media Watch deve ser pensado, como mais um passo do movimento popular que nasceu em Seattle e criou o Fórum Social de Porto Alegre?, afirmou Ramonet.
O método de trabalho no Media Watch ainda está sendo planejado, mas o provável é que seus membros se debrucem sobre o estudo de casos polêmicos. No encontro na USP, foram discutidos possíveis temas, como a cobertura da imprensa nas próximas eleições brasileiras, a partir da insistente vinculação do nome do candidato petista à Presidência, Luis Inácio Lula da Silva, às oscilações das bolsas de valores, o quase monopólio dos meios italianos de comunicação mantido pelo primeiro ministro Sílvio Berlusconi, a ausência de imprensa livre na África, além, é claro, da conivência da mídia venezuelana com a tentativa de golpe de Estado contra Hugo Chávez."
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"Imprensa venezuelana destacou Media Watch", copyright Agência Carta Maior, 17/5/02
Para Cristina Quitanda, professora de Comunicação da Universidade Central da Venezuela, o caso venezuelano merece ser analisado tanto pelos sinais de omissão da imprensa durante a tentativa de golpe quanto pelos estragos causados na credibilidade da mídia do país. ?Chegava o final de tarde e as bancas ainda estavam com pilhas de jornais, o que mostra que havia uma massa crítica funcionando e a população já não confiava no que os jornalistas escreviam?, disse Cristina.
Os jornalistas venezuelanos Andrés Izana, repórter de rádio e TV, e Azalia Venegas, diretora da Escola de Comunicação Social da Venezuela, deram testemunhos sobre os recentes acontecimentos em seu país. Andrés contou que se viu obrigado eticamente a pedir demissão da Radio Caracas Televisión, em protesto contra a proibição determinada pela direção das emissoras de difundir informações apuradas pelos repórteres durante o período de reação ao golpe de Estado no país. O clima político no país permanece muito tenso. O interesse dos profissionais e dos meios de comunicação venezuelanos pela Media Watch Global revela a importância da iniciativa para o país. O jornal El Universal publicou na terça-feira (14), em sua seção de política, matéria de destaque anunciando o evento.
O diretor do Le Monde Diplomatique deixou claro também que todo cidadão pode se filiar ao Media Watch Global. Mas lembrou de algumas categorias, que considera, fundamentais para o seu bom desempenho: jornalistas; professores, pesquisadores e estudantes de comunicação; e advogados e juristas especializados no assunto.
Ramonet sugeriu também que o Media Watch Global de cada país convide personalidades democráticas, de grande respeitabilidade ética, para compor Conselhos da entidade, dando-lhe a devida autoridade moral para cumprir as suas funções. O diretor do Le Monde Diplomatique deixou claro também que o Media Watch Global não é uma instituição contra ou hostil aos meios de comunicação e às empresas. É um movimento, disse ele, voltado para aperfeiçoar a qualidade da informação na sociedade, o que interessa aos meios de comunicação."