Monday, 18 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1314

Angélica Santa Cruz


CASO ABRAVANEL

"Atropelos ao vivo", copyright No. (www.no.com.br), 30/08/01

"A libertação de Silvio Santos – feito refém em sua própria mansão – foi o final feliz de uma sucessão de erros. As negociações para livrar o empresário da mira do seqüestrador Fernando Dutra Pinto fugiram do padrão recomendado pelos especialistas na área. A participação direta do governador Geraldo Alckmin, do Secretário de Segurança Pública, Marcos Vinicius Petreluzzi e do comandante da Polícia Militar, Rui César Melo, por exemplo, é vista como um precedente perigoso. O empresário telefonou pessoalmente para o governador, que participava da inauguração de obras no interior do Estado, e pediu a sua presença. Uma hora depois, Alckmin estava na mansão. O pedido do empresário, dizem os especialistas, era de se esperar. A reação do governador é que foi surpreendente.

A reportagem de no. conversou com quatro especialistas que estudam o assunto e participaram de negociações do gênero – três deles ligados a Polícias Militares de outros Estados. Como são ligados à corporações, eles pediram para não ser identificados. Todos apontaram atropelos na ação policial paulista. ?A presença do governador é boa para impressionar os eleitores. Mas um equívoco estratégico. Nos últimos dois anos, foram 160 seqüestros em São Paulo. Como ele vai fazer agora? Aparecer para negociar em todos os que estão em curso??, argumenta um especialista gaúcho, com experiência em negociações em dez seqüestros em quatro Estados brasileiros.

Os erros, dizem os especialistas, começaram ainda na libertação da estudante Patrícia Abravanel. Isso porque as autoridades permitiram que ela, ainda sob os efeitos psicólogicos de um cativeiro de sete dias, desse entrevistas elogiando os seqüestradores. ?É um comportamento muito comum entre os reféns. È preciso que eles só falem depois de passar por uma acompanhamento psicológico que os faça entender que sequestradores não são bonzinhos?, explica um integrante da PM paranaense. De Brasília, o ex-delegado Romeu Tuma fez coro com a tese. ?Quando você elogia um seqüestrador e explica o que ele fez por razões sociais, ele se sente incentivado para fazer outros seqüestros?, diz ele

Ferido depois de participar de um tiroteio que resultou na morte de dois policiais civis, sem dinheiro e em pânico, Fernando Dutra Pinto optou por voltar à mansão do Morumbi. ?Fez isso porque achou que ia morrer e foi para o único lugar onde teria garantias de que isso não aconteceria. Mas sabia que ali existia uma certa simpatia, no mínimo religiosa, por ele?, diz um dos especialistas.

Depois do atropelo da entrevista, os erros se espalharam pelo segundo capítulo do calvário de Silvio Santos. Em negociações do gênero, a polícia costuma mandar negociadores sem grande autonomia de decisões. Isso porque, nas primeiras horas, os seqüestradores reproduzem um comportamento catalogado pela Swat – Special Weapons And Tactics – como parte da fase do ?eu quero?. Nos momentos iniciais, fazem pedidos desencontrados. Fernando Dutra Pinto fez exatamente isso. Depois de transformar o empresário em refém, pediu um helicóptero. Depois, exigiu conversar com o governador. Mudou de idéia e pediu a presença de um juiz. Em seguida, voltou a pedir a presença do governador. Nessa fase, os policiais costumam alegar que não têm poder suficiente para dar essas garantias. ?Dizer que é preciso consultar um superior é uma maneira de arrastar as negociações e esperar que o sequestrador saia do momento de pânico?, explica um negociador da polícia civil de São Paulo.

A fase seguinte é a que os especialistas chamam de ?identificação?. Em geral, acontece duas ou três horas depois da ação inicial do sequestrador. Nesses momentos, os policiais costumam levar familiares do bandido para participar da conversa. Foi o que se fez em São Paulo. A irmã de Fernando, Lilian, e seu pai, Antônio, estiveram na mansão ajudando a tranqüilizar o seqüestrador.

Até esse ponto, o drama de Silvio Santos parecia seguir o roteiro esperado para negociações do gênero, algumas duram até dias. ?Cada hora a mais de conversa, é um alívio para quem negocia porque aumenta as chances do refém sair ileso?, conta um militar gaúcho. Uma hora depois, no entanto, os espectadores que acompanharam ao vivo a cobertura do cativeiro do empresário viram a chegada do secretário de segurança pública, Petreluzzi, e do comandante da Polícia Militar. ?A partir daí, o seqüestrador se sente na autoridade de pedir a presença até do governador?, explicou à reportagem de no. o especialista da Polícia Militar do Rio Grande do Sul. Minutos depois, de fato, as televisões anunciaram a ida de Geraldo Alckmin à mansão do apresentador.

Enquanto se desenrolavam as negociações para livrar Silvio Santos das mãos do seqüestrador de sua filha, outra família foi mantida refém a duas ruas dali. Um comerciante, um estudante e um aposentado eram ameaçados por duas pessoas que exigiam o pagamento de um resgate em jóias. ?Agora eu pergunto: porque o governador não deu um pulo até lá também??, indaga um dos especialistas."

 

"Seqüestro reacende debate sobre ética na imprensa", copyright Acesso.com (www.acesso.com.br), 30/08/01

"O seqüestro de Patrícia Abravanel, filha do apresentador e proprietário do Sistema Brasileiro de Televisão (SBT), Sílvio Santos, reacendeu as discussões sobre a divulgação de crimes desse tipo pela imprensa. Patrícia ficou uma semana em poder de seqüestradores e, durante esse período, a grande maioria dos jornais paulistas respeitou o pedido da família Abravanel e esperou o fim do drama para noticiá-lo. O jornal ?Correio Braziliense? tomou a mesma atitude, assim como a revista ?Isto É? e as Redes Record e Bandeirantes. Os veículos justificaram o silêncio como respeito ao pedido de Sílvio Santos, além de uma atitude de proteção à vida da vítima. Os veículos das Organizações Globo, o ?Jornal do Brasil? e a revista ?Veja?, por outro lado, optaram por divulgar o fato, alegando que o silêncio em casos de seqüestros só beneficia os criminosos. Alguns veículos, em especial sites, chegaram a divulgar a notícia mas, diante do pedido da família, voltaram atrás.

Os diferentes posicionamentos éticos dos veículos geraram uma grande discussão envolvendo autoridades policiais, juristas e analistas de mídia. De forma geral, acredita-se que o pedido da família deve ser sempre respeitado. O secretário de Segurança Pública de São Paulo, Marco Vinício Petrelluzzi, mostrou-se contra a divulgação e afirmou que, em função do vazamento do seqüestro, a polícia recebeu muitos trotes. Para o presidente do Instituto São Paulo contra a Violência, Eduardo Capobianco, a divulgação dos seqüestros deve ocorrer ?desvinculada da família da vítima?, para não parecer que a mesma está estimulando o noticiário. Capobianco acredita também que ?a imprensa deve ser um mecanismo para a solução do caso?. Longe dessa idéia, a Rede Globo procurou defender que ?não se deve dar tratamento diferenciado a quem tem acesso aos donos de jornais?, e que a política do grupo, adotada em 1990, é noticiar sempre. ?E se a vítima pertencesse à família Marinho, proprietária das Organizações Globo? Publicaríamos?, diz o diretor da Central Globo de Comunicação, Luis Erlanger. Em editorial, a TV Bandeirantes repudiou o posicionamento da rival, afirmando que ?não é tolerável que, em nome do vale-tudo, da busca do sucesso fácil, se queira transformar um episódio doloroso como este em mais um escândalo vulgar?.

?Exposição irresponsável?

A Rede Globo foi recentemente condenada pela Justiça de São Paulo em função da divulgação de seqüestro. Em março de 2000, o filho de 12 anos do empresário Luiz André Matarazzo foi seqüestrado e, conforme parecer do juiz Teodozio de Souza Lopes, a emissora ?expôs de forma irresponsável e dolosa (com intenção) a vida de uma criança que estava em cativeiro, desrespeitando o direito à intimidade dela e da família?. A determinação da Justiça é que a Globo pague uma indenização correspondente ao tempo que usou para noticiar o crime. Durante a defesa, a Globo informou que é ?dona da própria ética? e que não teve intenção de prejudicar a vítima.

Guerra de audiência

Durante a entrevista que Patrícia Abravanel deu para contar à imprensa como foi o seqüestro, quem mais obteve audiência foi a Rede Globo – pico de 25 pontos às 16h28min, horário em que a emissora normalmente tem 14 pontos. O jornalismo da Globo fez três entradas ao vivo. O SBT teve, no mesmo período, média de 11 pontos, enquanto Band e Record ficaram com 5 pontos cada. Para o colunista do ?Jornal do Brasil?, Eugênio Bucci, ?a Globo tem dificuldade em duas áreas: falta povo e auditório. Conseguiu resolver isso com o discurso religioso da menina e a aparição de Silvio Santos. A Globo conseguiu trazer para sua programação a Record e o SBT, daí os bons índices de audiência?. Para o crítico de TV e jornalista Gabriel Priolli, ouvido pelo ?JB?, a cobertura foi hiperdimensionada, com todas as emissoras abertas transmitindo a coletiva. ?Isso acontece não pelo interesse jornalístico, mas comercial?.

Show na TV

A repercussão da entrevista coletiva de Patrícia Abravanel é unânime em um ponto: o discurso religioso da filha de Sílvio Santos, que é evangélica e pronunciou 53 vezes a palavra Deus em 22 minutos de discurso, além de sua aparente alegria, surpreenderam a todos. Para o ?JB?, ?as imagens eram típicas de último capítulo de uma novela exibida pelo SBT, sempre fiel ao estilo dos dramalhões mexicanos: a moça rica, na sacada da mansão, com a multidão a registrar um final feliz?. Para o articulista da ?Folha?, Marcelo Coelho, muito da euforia e do sorriso inabalável de Patrícia se assemelha à forma como Sílvio Santos apresenta seus programas. ?De algum modo, o poder de recriar a realidade através do otimismo, do sorriso, da animação, é algo que Patrícia deve tanto à religião quanto a seu pai?.

Resgate contraditório

O pagamento ou não do resgate gerou um tópico dúbio do noticiário. O secretário de segurança de São Paulo diz que a família Abravanel pagou R$ 500 mil pela liberdade de Patrícia. A moça negou, dizendo que foi ?salva pela força de Deus?. Os veículos monitorados por ?AcessoCom? deram destaque também ao bate-boca entre as secretarias de segurança do Rio de Janeiro e São Paulo. A primeira ofereceu ajuda ao Estado vizinho para a solução do caso. O secretário paulista entendeu como ofensa e criticou a política de segurança do Rio, alegando que o governo carioca mascara os números da violência urbana."

 

"Leitores do Último Segundo acham que jornal não deve noticiar seqüestro", copyright Último Segundo, 29/08/01

"Pesquisa realizada Diga-me pelo Último Segundo mostra que os leitores aprovaram a decisão do jornal de não publicar a notícia do seqüestro da filha de Sílvio Santos até a solução do caso.

Dos 1772 internautas que votaram até a manhã de hoje, 73,9% aprovaram a atitude do jornal, 20,6% desaprovaram e 5,5% não quiseram opinar sobre a decisão do jornal.

Depois de noticiar o seqüestro na manhã de terça-feira, dia 22, o Último Segundo retirou as notícias do ar e suspendeu a publicação de reportagens sobre o caso atendendo pedido da família, que alegou risco de morte. O jornal manteve a cobertura e sua reportagem estava de plantão em frente à casa da família de Sílvio Santos no instante em que Patrícia chegou.

Os principais jornais de São Paulo, tradicionais e online, atenderam o pedido da família. Os maiores jornais do Rio de Janeiro mantiveram a cobertura. O site O Dia On-line, parceiro do iG Rio, noticiou o seqüestro."

    
    
                     

Mande-nos seu comentário