RADICAIS DO PT
Victor Gentilli
Os quatro ou cinco deputados e senadores petistas que dão conhecimento público à quase convicção de recusar-se a votar a proposta de reforma da Previdência enviada pelo governo ao Congresso são chamados pela mídia de radicais. Com ou sem aspas, dependendo do caso. Seriam eles, de fato, radicais? Vejamos:
1) Aceitam, disciplinadamente, o superávit fiscal
O governo opera desde a posse com uma política econômica baseada no superávit fiscal. No passado, seja remoto, seja recente, não há registro de momento algum em que o PT tenha aceito este modelo de política econômica, sequer como transitória ou como opção tática.
2) Aceitam, disciplinadamente, a atual política de juros
Se outro governo, qualquer outro governo, tratasse os juros como o atual governo trata as bancadas petistas, em uníssono, estariam se esgoelando na crítica. O vice-presidente não é petista. Qual o petista que condena tal política, explicitamente? O ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, flagrado inadvertidamente, não sabia que sua crítica à política econômica estava sendo ouvida por jornalistas.
3) Aceitam, disciplinadamente, o pagamento regular da dívida externa
Aliás, eis um assunto que simplesmente saiu do noticiário da grande imprensa. Afinal, não interessa a ninguém. O governo paga e a imprensa gosta de que o governo pague. Se é verdade que mais de 90% da população brasileira, no plebiscito organizado pelo PT e pela Igreja Católica em 2001, não apóiam este pagamento, por que este silêncio absoluto?
4) Os supostos “radicais” não se manifestam sobre a reforma tributária nem sobre inúmeros outros pontos polêmicos da reforma da Previdência
Os chamados “radicais” silenciam disciplinadamente sobre a reforma tributária e até mesmo sobre a reforma da Previdência. Todo o alarde midiático fecha o foco num ponto específico da proposta de reforma, que é a taxação dos inativos.
Seriam eles, de fato, radicais?
O epíteto estaria adequado a seus perfis políticos?
Inquietações abrandadas
Tenho dúvidas. Há indícios e evidências de que o grupo de parlamentares incomodados com a política do governo para a reforma da Previdência é muito maior do que os quatro ou cinco em destaque na mídia. Não é improvável que a imprensa, tradicional defensora desse tipo de reforma, esteja “ajudando” a cúpula governista fazendo a opinião pública crer que o desconforto no PT com a atual política governista limite-se a “quatro ou cinco” indisciplinados.
O documento subscrito por oito dos 14 senadores petistas, que resultou na crise
logo resolvida da liderança de Tião Viana, pode ajudar
a compreender o quadro político para além dos aspectos
meramente episódicos do impasse. A fala tímida e nada
estridente, mas firme e decidida, do senador Paulo Paim mostra que
os radicais, a mídia e a cúpula do governo
parecem apropriar-se da conjuntura com a mesma tática.
Tivéssemos uma imprensa menos conservadora e menos governista, saberíamos o que acontece.
Os jornais precisam explicar por que não explicam o que de fato acontece. E, igualmente, explicar o que se passa no país.
Enquanto os jornais silenciam sobre o essencial, o desconforto do governo cresce na mesma proporção. Que outro motivo justificaria o fato de o presidente Lula manter-se silencioso diante de jornalistas por quase 150 dias, como observou primeiro o jornal Valor Econômico, depois a Folha e, mais recentemente, o sítio Comunique-se?
O problema, a rigor, não é do presidente Lula. Ele certamente quer falar, até porque gosta de falar e sabe que sua fala convenceria, que seus argumentos seriam entendidos. Lula saberia explicar, justificar. As inquietações certamente estariam abrandadas.
E a sociedade, agradecida, saberia o que está acontecendo agora.