Friday, 27 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Asterix contra Hollywood

GÁLIA IRREDUTÍVEL

Em matéria de 2/2/02, Charles Bremner, correspondente do Times de Londres em Paris, conta que a nova produção Astérix et Obélix: Mission Cleópatra, a mais cara do cinema francês ? 45,23 milhões de dólares ?, estreou em 900 cinemas na semana passada e representa o desafio dos gauleses às legiões de Hollywood. No primeiro dia de exibição na França, já destronou Harry Potter. O filme ressuscita o subsídio, pelo governo, da indústria do cinema francês, meio parado há três anos. Pela primeira vez em duas décadas há quatro produções francesas entre as grandes bilheterias do país, e a participação de Hollywood no mercado francês caiu abaixo dos 60%.

Astérix, flagelo dos invasores romanos ? hoje representados pelos americanos ?, vira assim o símbolo da resistência francesa à cultura dos EUA. "O filme é maravilhoso", disse Le Nouvel Observateur, a bíblia semanal da intelligentsia. "As hordas anglo-saxônicas de O senhor dos anéis e de Harry Potter haviam destronado nossa Amélie" (referência ao filme O fabuloso destino de Amelie Poulain, comédia que quebrou recordes de exportação e se transformou no maior sucesso do cinema francês nos Estados Unidos.

O novo Astérix, de Alain Chabat, tem piadas diretas, para atrair os jovens. Numa cena, um romano chamado Itineris ? nome de uma estatal francesa de telefonia celular ? chega ofegante e anuncia: "Você tem duas mensagens." Noutra, Júlio César diz: "Veni, vidi, vici, vivendi". Referência à Vivendi Universal, o conglomerado de mídia franco-americano cujo chefão, Jean-Marie Messier, causou tempestade ao anunciar em dezembro que "a lei francesa de protecionismo cultural está morta" (a lei restringe a exibição de material cultural não-europeu na França, e suscita permanente conflito entre EUA e Europa). Afirma Messier que sua frase significava que a cultura francesa pode sobreviver sem proteção, mas foi vista como "heresia" num país que se considera a "irredutível aldeia gaulesa" contra o poderio de Hollywood. "Agora, somos todos gauleses", afirmaram dois sociólogos ao Libération.

Bollywood e o amor à pátria

Catherine Philp, também do Times de Londres, conta de Nova Déli [2/2/02] que a indústria indiana de cinema, ou Bollywood (fusão de Bombaim, a capital do cinema indiano, e Hollywood, seu modelo), aproveita a guerra contra o Paquistão, em disputa pela Caxemira, para estimular o "amor à pátria". Heróis cobertos de sangue apontam metralhadores e lançadores de granada contra guerrilheiros traidores, que caem como moscas no chão coberto de neve, enquanto a platéia grita e aplaude.

Uma nova onda de nacionalismo varre a Índia, enquanto crescem as tensões com o país vizinho. Os filmes de "amor à pátria" estão em toda parte: em todos, o herói indiano estilo Rambo derrota o terrorista estilo bin Laden. Que agora tem nome paquistanês. Um dos filmes, sem sutileza, vai se chamar A Caxemira é nossa. Quatro filmes estão sendo produzidos sobre a vida de Bhagat Singh, o mais famoso herói da independência da Índia contra os ingleses, em 1923.