Monday, 18 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1314

Bernardo Kucinski

CRÍTICA DIÁRIA

"Cartas Ácidas", copyright Agência Carta Maior

21/11/01?Lucro dos bancos dobrou na era FH?

Com essa manchete, o JB rompe hoje com o discurso complacente da mídia em relação aos lucros obscenos dos bancos. Mais que isso: o JB tomou a iniciativa de encomendar da empresa Austin Asis a pesquisa que fundamentou sua reportagem (pág. 14). Alguns dados do levantamento: o lucro anual dos 30 maiores bancos brasileiros triplicou entre 1994, ano do lançamento do Real e o ano passado; o total acumulado desses lucros é de R$ 21 bilhões, dinheiro que daria para construir 1 milhão de casas populares; as principais fontes dos lucros bancários foram operações cambiais, ou seja a especulação cambial, e as tarifas cobradas dos clientes. Conclusão: na era FH deu-se uma gigantesca transferência de renda de toda a sociedade para os bancos.

A maior taxa de juros do mundo

O lucro dos bancos também engorda graças à taxa básica de juros definida pelo Banco Central e que determina todas as outras taxas: foi a maior do mundo na média dos últimos quatro anos (de setembro de 1997 a setembro último). O calculo está no último balanço envolvendo as 40 principais economias do planeta, que acaba de ser divulgado pela Globalinvest. De novo, apenas o JB deu a informação, com destaque, na sua edição de ontem. Só a Polônia teve juro real básico comparável ao do Brasil, mesmo assim quase 1,5 ponto percentual mais baixo. A taxa de juro real básico do Brasil foi quase o dobro da de outros países com juros já bastante altos, como Argentina e China. Juro alto é sufoco interno e perda de competitividade da pequena e média empresa nos mercados externos.

O silêncio em torno da CPI do Proer

Esses dados tornam ainda mais escandaloso o auxílio do Banco Central aos bancos via Proer. O entanto os jornais tem ignorado sistematicamente os trabalhos da CPI do Proer. Inclusive o JB. Ontem era possível assistir na TV da Câmara ao depoimento de Clarimundo Santana, o ex-vice-presidente de contabilidade do Banco Nacional, um dos confessou ter criado centenas de contas ?maquiadas? para enganar clientes e acionistas, mas nos jornais de hoje, nada sobre a CPI. Nem mesmo na Gazeta Mercantil, especializada em economia e finanças.

Itamar derrotado ou um tiro no próprio pé? Predominou nos jornais de hoje a interpretação de que o a cúpula do PMDB sepultou a candidatura Itamar ao restringir a participação na prévia a menos de 4 mil filiados. ?PMDB acaba com o sonho de Itamar?, é o titulo do JB. Folha e Estadão seguem a mesma linha. Mas para analistas políticos importantes, entrevistados por Silvio Bressan, do Estadão, o governo pode ter dado ? um tiro no pé? ao estimular a derrota de Itamar pela cúpula do PMDB. Ney Figueiredo, o estrategista político de importantes entidades empresariais diz que sem Itamar na corrida sucessória, é ainda mais provável uma vitória de Lula já no primeiro turno. Principalmente pelo apoio que Lula receberia em Minas.

Discreta e importante vitória de Olívio

Os jornais de hoje praticamente ignoraram a decisão do procurador da Assembléia gaúcha de tirar Bisol do relatório da CPI. Com isso, o próprio Olívio deverá ser excluído. Não tem sentido denunciar o governador por irregularidades na área de segurança sem denunciar o Secretario de Segurança. Apesar de ser uma vitória de Olívio, e por isso quase ignorada pelos jornais, é esse tratamento mediático discreto que interessa ao PT.

Os perigos da contra-ofensiva de Olívio Dutra

Passado o primeiro momento, verifica-se que a crise do PT gaúcho, apesar de reflexos nacionais, é percebida pela opinião pública e mesmo por jornalistas como essencialmente local. Também é vista com suspeição, talvez uma trama para desgastar o PT a partir de irregularidades provavelmente não muito graves. Não interessa ao PT erigir essa crise em tema nacional. Mas é isso o que pode ocorrer com a investida de Olívio Dutra esta semana na mídia televisiva.

Olívio Dutra precisa se defender de acusações infames, delimitando o caso e evitando a dramatização da questão em escala nacional e não ao contrário. Melhor que venha bem municiado sobre as diferentes áreas de atuação de sua administração das quais possa se orgulhar, como a área de energia. E sobre as medidas concretas para corrigir irregularidades. O tom adjetivado do manifesto do governo gaúcho, que chama a oposição conservadora gaúcha de ?fascista?, também pode não pegar bem na mídia televisiva.

Não deixe de ler: – Na página 2 do Estadão de ontem, Miguel Jorge resume o relatório ? Panorama Social da América Latina 2000-2001, da Cepal. É um panorama sombrio, de miséria e estagnação. Mais de 60% dos latino-americanos vivem com até US$ 2 por dia ou menos. No Brasil, cerca de 30 % das famílias, ou 37,5% das pessoas ainda estão abaixo da linha de pobreza. Miguel Jorge cita também dados do IPEA de que o numero de pobres no Brasil subiu entre 1995 e 1999 de 50 milhões para 53 milhões de pessoas. Miguel Jorge não é nenhum ?esquerdista?. Foi diretor da VW e hoje é vice-presidente de assuntos corporativos do grupo Santander-Banespa. O título de seu artigo ampara-se no famoso livro de Galeano: A Cepal e as veias abertas da pobreza.

– A entrevista com o economista Aluísio Teixeira no JB de ontem, em que ele diz que a herança econômica de FHC foi a pior possível e que a abertura foi uma grande ilusão que desmontou a produção e não deixou nenhum benefício."