Tuesday, 19 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1314

Carta aberta aos analistas políticos

HISTÓRIA ESQUECIDA

Chico Bruno (*)

O episódio das eleições para a presidência do Senado e da Câmara deixa lições importantes para os analistas políticos brasileiros.

A principal lição é que é preciso recorrer à história. Nenhum analista se deu ao trabalho de rememorar a festa de aniversário de Aécio Neves, em fevereiro de 2000, e estavam quase todos no regabofe, que contou com a presença maciça de tucanos, peemedebistas, ministros e do presidente Fernando Henrique. Na oportunidade, comemoravam, além do aniversário de Aécio, a formação do bloco PSDB/PTB, um golpe de mestre, que deu maioria ao tucanato na abertura dos trabalhos legislativos de 2000. O ponto alto da noite foi o discurso de Fernando Henrique, que deu a senha para a candidatura de Aécio à presidência da Câmara ao afirmar: "A partir de agora o Aécio está credenciado para seguir em frente e postular a presidência da Câmara". Um fator importante no evento, às margens do Lago Paranoá, numa noite de fevereiro regida pelo signo de Aquário, foi a total ausência de pefelistas – nem os caciques do partido por lá passaram.

Em setembro de 2000, Aécio se lançou candidato mas nenhum dos analistas políticos presentes ao regabofe escreveu uma linha sequer lembrando o episódio da senha dada por Fernando Henrique. Ao contrário, creditaram o lançamento da candidatura de Aécio às divergências entre Jáder e ACM, que estavam enfraquecendo a candidatura de Inocêncio de Oliveira à presidência da Câmara. Ninguém escreveu que Aécio era o candidato de Fernando Henrique desde fevereiro de 2000, usando como ponto de partida a festa de aniversário do tucano.

Talvez não o tenham feito pelo atropelamento diário dos fatos políticos e pressionados pelo fechamento das colunas, dirá alguém ao ler essa carta aberta. Discordo, e cito outro exemplo. Ao iniciar seus ataques a Jáder, que se tornaram mais consistentes após as denúncias de Veja, o senador ACM não foi questionado por nenhum analista político sobre sua poderosa Rede Bahia de Comunicação, construída a partir de 1975 com a inauguração do jornal Correio da Bahia e ampliada, ainda no governo Figueiredo, com a instalação da TV Bahia e suas cinco afiliadas no interior baiano – retransmissoras, à época, da Rede Manchete de Televisão e que, a partir de 1986, numa ocorrência, até hoje, nebulosa, passou a retransmitir a Rede Globo. Coincidentemente, ACM era ministro das Comunicações e estava envolvido no episódio da NEC.

Ora, Jáder e ACM são seres semelhantes. Sempre viveram de cargos ou empregos públicos. O paraense, pelo menos, nunca foi biônico, já o baiano foi prefeito e governador por duas vezes por indicação dos ditadores de plantão. Disputou apenas três eleições em sua vida, para deputado estadual, federal e governador. Não se tem notícia de que Jáder tenha agredido eleitoras ou xingado jornalistas, já ACM é do conhecimento público a sua truculência. Infelizmente nenhum analista da cena política brasileira rememorou nada disso. Ao contrário, a grande maioria carregou nas tintas contra Jáder.

Para velhos e jovens

Quero deixar claro que não estou defendendo Jáder, estou exercendo o direito de alertar os colegas sobre o direito sagrado do leitor de ter uma informação imparcial sobre os acontecimentos.

Por fim, quero lembrar aos analistas políticos um outro fato. Ninguém até agora escreveu uma linha sobre o fato de um dos candidatos tucanos à liderança do PSDB, o deputado federal Jutahy Magalhães, ter apoiado e feito dobradinha com Lula em 1994, desprezando a candidatura de Fernando Henrique, e em 1998 ter feito campanha solo para deputado sem pedir voto a Fernando Henrique, quase perdendo, por esse gesto, a eleição. E luta para expulsar do PSDB baiano dois deputados federais que, seguindo a orientação nacional do partido, apoiaram, em 1998, a candidatura de César Borges e Paulo Souto. Hoje participam com um secretário tucano do governo baiano. Pois ninguém procurou analisar o perigo que o PSDB corre em ter um líder com o perfil anti-FHC já exposto por Jutahy.

É por essas descritas e outras que defendo sempre uma análise histórica, quando se vai escrever e analisar as coisas da política. A nós, jornalistas, cabe sempre reavivar a memória dos leitores mais velhos e informar aos mais novos a trajetória dos envolvidos nos imbróglios políticos, para que eles possam avaliar corretamente o que se passa nos bastidores da política.

(*) Jornalista

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