GOVERNO GAÚCHO
Luis Milman (*)
Há mais ou menos um mês fui contratado pela IstoÉ para fazer uma reportagem sobre a CPI da Segurança Pública da Assembléia/RS (ora em curso). A matéria foi feita a quatro mãos (Cláudio Camargo, editor de Internacional, de São Paulo, trabalhou comigo), e publicada na edição de 30 de junho.
Pois bem, no dia 27 Cláudio recebeu e-mail (em anexo) da jornalista Denise Montovani, que trabalha no Palácio Piratini. A jornalista, mulher de Larte Meliga, chefe de gabinete do governador Olívio Dutra, tenta, escandalosa e inacreditavelmente, levantar suspeitas e impedimentos para o exercício de meu trabalho.
No e-mail, a jornalista alega que depus na CPI ao lado de Jair Krischke, presidente do MJDH. Mentira. Sou conselheiro do MJDH e, juntamente com outros dois conselheiros, auxiliei Jair em seu longo depoimento, que detalhava a denúncia feita pelo mesmo MJDH (que também subscrevi) à Assembléia.
A jornalista alega que participo de programas como acusador do governo. Mentira! Participei de um programa de debates, no qual defendi minhas posições, com argumentos e, quando provocado ou mesmo caluniado por representante do governo, defendi minhas opiniões com veemência e mesmo indignação.
A jornalista prossegue e afirma que estou muito envolvido no assunto como conselheiro do MJDH e que, por isso, não tenho isenção para fazer a matéria!
Que isenção tem ela para tentar desqualificar-me? Ela é paga pelo governo!! O que faço, com o que me envolvo, as opiniões que defendo, como e onde as manifesto, em nada me tornam "suspeito" para exercer o jornalismo com dignidade e com respeito aos princípios que orientam o exercício desta profissão.
O e-mail que a Cláudio fala por si! A jornalista exerce a ação de censora ante-fato, no caso, de uma matéria que sequer tinha sido publicada! E o faz, sem nenhum escrúpulo ou vergonha, levantando suspeitas sobre um profissional junto aos seus colegas e ao veículo que, ao contratá-lo, lhe empresta a indispensável credibilidade.
Com isso, a funcionária do governo tenta obstruir diretamente a divulgação de meu trabalho. Este procedimento é tipificado, em nosso Código de Ética, como "delito contra a sociedade".
Desonra a nossa profissão esta jornalista e, por isso, estou representando contra ela junto à Comissão de Ética do Sindicato dos Jornalistas do RS.
Há 11 anos me dedico à carreira universitária. Eventualmente, a convite de algum veículo e a meu critério, faço reportagens, no pleno exercício do direito de exercer uma profissão para a qual estou habilitado.
Nunca fui chapa-branca e envergonho-me de, depois de 23 anos de profissão e inúmeras reportagens no Brasil e no exterior, ter sido ao mesmo tempo alvo e testemunha desta barbárie, em minha própria terra. Outros colegas, por agentes deste mesmo governo, já foram vítimas de ameaças e intimidações e, como conselheiro do Movimento, as denunciei.
A ditadura avançava sobre a liberdade das pessoas, do jornalismo e da sociedade, mas não o fazia em nome de um "governo democrático e popular"!
Por considerar repugnante o fato, resolvi informar ao Observatório.
(*) Jornalista, professor universitário e conselheiro do Movimento de Justiça e Direitos Humanos. E-mail: <milman.voy@terra.com.br>
O e-mail de Denise Montovani à IstoÉ
"Data: Wed, 27 Jun 2001 18:36:09 -0300
De: dmontovani@piratini.rs.gov.br
Para: ccamargo@istoe.com.br
Assunto: CPI ? RS
Prezado Cláudio. Estou enviando uma cópia de um relatório que fizemos sobre o tema em debate. Não vai dar para te enviar os anexos pelo e.mail porque são documentos que não tenho em disquetes, mas estou providenciando o envio por correio urgente.
Também aproveito para enviar documento distribuído agora à tarde pelas bancadas do PT e PCdoB na Assembléia Legislativa que recebi e foi entregue à imprensa local. Da mesma forma remeto manifestação do Ministério Público sobre as declarações do dirigente do Movimento, veiculadas no noticiário local.
Gostaria de te expressar uma preocupação: Soube hoje que há um jornalista gaúcho, Luis Millmann, que está buscando fazer algumas entrevistas em nome da revista para a reportagem que estás trabalhando. Não sei se é verdade, mas gostaria de te expressar minha preocupação porque o Luis é parte extremamente envolvida neste assunto: além de conselheiro do MJDH, ele participou do depoimento do presidente Jair Krischke na Assembléia Legislativa, sentando à mesa como depoente ao lado do Jair. Atualmente, ele tem dividido com o Jair a tarefa de participar de debates em veículos de comunicação locais como acusador. É difícil para uma pessoa com este grau de envolvimento ser um repórter com a isenção que a função exige. No mais, estou procurando retornar tua solicitação ainda pela manhã desta quinta-feira. Qualquer dúvida, ou detalhe a mais, estou à disposição. Um abraço, Denise"
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