EGITO
Attiyat al-Abnoudi, cineasta egípcia pioneira, acaba de terminar seu último filme. O trem núbio mostra a viagem de uma composição de 15 vagões de segunda classe atravessando o Egito, a partir de Alexandria. Ela sai uma vez por ano, levando para casa os núbios que moram na cidade para o maior feriado islâmico. A obra quase não pôde ser filmada, pois no dia anterior à saída outro trem pegou fogo, incinerando centenas de passageiros. A polícia, para não se arriscar depois da má repercussão do desastre, confiscou luzes e geradores de Attiyat. Mas ela rapidamente conseguiu nova iluminação alimentada por baterias, em locadoras especializadas.
As dificuldades nunca desanimaram a cineasta em sua missão de denunciar a realidade social do país. Imbuído do espírito dos anos 60, seu estilo inflama os críticos, que a acusam de alcançar sucesso internacional às custas da pobreza dos egípcios. “Não há necessidade de se mostrar a pobreza de maneira tão feia. Não sou contra mostrar miséria, mas os filmes deveriam ser mais simpáticos, não com todas essas moscas e criancinha pelada com nariz cheio de catarro. Não me mostrem pessoas que vivem como animais”, reclama Hosn Shah, do jornal Al Akbar.
Os filmes de Attiyat ganharam mais de 30 prêmios, vários deles na Europa. Contudo, sua obra não tem espaço na TV egípcia, apesar de já ter sido entrevistada diversas vezes por canal estatal. Ela lamenta as críticas: “Tínhamos o sonho de que poderíamos mudar nossa sociedade. Achamos que poderíamos mudar o mundo mostrando às pessoas como vivem e que, mostrando a eles, os inspiraríamos a fazer uma revolução. Ao invés disso, nos odeiam porque não querem ver a realidade em que vivem”.
A diretora é da geração que se beneficiou da política
de modernização do presidente Gamal Abdel Nasser, que ampliou
o acesso à educação. Em 1968, após estudar direito
na Universidade do Cairo, fez pós-graduação no então
recém-criado Instituto de Cinema da capital, onde os professores, em
grande parte estrangeiros, enfatizavam o aspecto do diálogo social que
o filme promove. Em 1971, Attiyat faria seu primeiro curta-metragem, Um Cavalo
de Lama, que mostra a fabricação mal-remunerada de tijolos
com lama do Rio Nilo por mulheres analfabetas. Hoje, segundo Neil MacFarquhar
[The New York Times, 22/6/02], 25 filmes compõem o currículo
da cineasta.
CANADÁ
A demissão de Russell Mills, publisher do Ottawa Citizen, provocou uma crise no império midiático CanWest Global Communications. Em protesto, três mil leitores do jornal cancelaram assinaturas, funcionários retiraram seus nomes dos créditos e houve pedidos de instalação de inquérito sobre a concentração da propriedade de meios de comunicação no Canadá.
O presidente da corporação, Leonard Asper, veio a público negar os rumores de que Mills teria sido despedido por interferência do primeiro-ministro Jean Chrétien; antes da demissão, o Citizen estava cobrindo supostas violações éticas do governo. "Nenhum político, homem de negócios ou partido, incluindo anunciantes, tem a capacidade de influenciar quem empregamos nesta companhia e o que eles escrevem", declarou Asper. O publisher teria sido demitido por uma série de conflitos com a CanWest, e a "gota d?água" foi o editorial de 1? de junho pedindo a Chrétien que deixasse o cargo.
"O que ele escreveu não está em questão", esclarece o presidente, para quem o texto, se assinado, poderia sair na página de opinião. "O que ele fez, em nosso nome, foi dizer que o premiê deveria se demitir. Tudo o que afirmamos é, o espaço editorial não assinado pertence ao proprietário e temos o direito de decidir o que vai neste espaço em nosso nome."
"Acho que é justo pedir do editor e do publisher de um jornal que, se eles vão tomar uma posição tão séria, teriam que fazer a cortesia de ligar ao dono, em nome de quem esta declaração está sendo feita ? se for feita no espaço editorial ? e consultá-lo para ver se está tudo bem." Asper também acrescentou que Mills foi mandado embora por não "providenciar uma diversidade de vozes e pontos de vistas" no Citizen.
Jennifer Wells [The Toronto Star, 21/6/02] conta que, em anúncio de página inteira, funcionários do jornal protestaram contra a demissão do chefe, mas pediram aos leitores que não cancelem assinaturas.