IMPRENSA LUSÓFONA
Sônia Ribeiro (*) e Erasmo de Freitas Nuzzi (**)
Durante 60 anos ? de 1580 a l640?, Portugal viveu sob o jugo da Espanha. A supremacia da coroa espanhola ante a portuguesa impedia Portugal de advogar suas próprias causas, ou assenhorar-se daquilo que lhe era de direito. De certa forma, usurpava-se do povo português o sentido de nação ao ignorar ou renegar os interesses e os ideais lusitanos.
Analisando os fatos do ponto de vista da historiografia portuguesa, naquele momento urgia a restauração da soberania de Portugal. Durante o ano de 1641 ocorreram embates entre as duas nações, e grande destaque, do lado lusitano, foi a decisiva participação popular. Em meio a esses conflitos, os patrícios de Camões vislumbraram a oportunidade para noticiar, periodicamente, a combatividade de seus civis e militares em prol das causas nacionais; e, ato contínuo, conclamar e congregar a população no fortalecimento do governo que se formaria.
Sob esses auspícios, em novembro de 1641, nasceu em Lisboa a Gazeta, que abaixo do título informava ser um veículio "em que se relatam as novas todas, que ouve nesta corte, e que vieram de várias partes no mes de novembro de 1641". Foi o primeiro "jornal", digamos assim, escrito em língua portuguesa do mundo.
Terceira língua
Essa imprensa de língua portuguesa não ficou circunscrita a Lisboa, tampouco aos países lusófonos. Cresceu e multiplicou-se ora pelas mãos dos primeiros empreendedores, ora pelas dos seus descendentes. Isso porque o espírito aventureiro daqueles que acreditavam que navegar era preciso ? e que ainda se faz presente em muitos de seus filhos ? tão logo aportava em algum rincão do planeta, sacava da bagagem a predisposição para criar um jornal.
Em razão disso, de novembro de l641 até hoje, centenas de jornais e revistas em língua portuguesa surgiram pelo mundo afora. Atualmente, existe imprensa lusófona em 154 países ? ou 82% dos países do planeta.
Essas publicações são a ineqüívoca demonstração da importância da imprensa como repositária e incentivadora da expansão do idioma português; marcam, a ferro e a fogo, a presença dos valores e das tradições lusitanas, interligando o mundo lusófono aos demais países.
A pujança dessa imprensa leva a dois novos raciocínios: 1) como veículos de comunicação, registram notícias não só de Portugal como de outros países ? assumindo, com isso, um duplo papel: de arauto dos acontecimentos e de intérprete desses fatos; 2) ao ajudar a propagar a língua-mãe, ratifica-se a posição do português como terceira língua mais falada no Ocidente e a sexta mais difundida no planeta. Por somar mais de 210 milhões de falantes, em tese essa condição lhe asseguraria o direito de ser uma das línguas oficiais das Nações Unidas.
Lugar no mundo
Na Argentina, África do Sul, Austrália, Luxemburgo e no Japão, também em outras regiões dos cinco continentes, encontramos jornais e revistas impressos no nosso idioma. Por retratarem, sobretudo, o dia-a-dia dos luso-descendentes radicados nesses respectivos países, recebem a denominação de "jornais de imigração". Vale ressaltar que o Canadá e os Estados Unidos são os países que apresentam a maior diversidade de títulos. Até outubro de 2000 eram 19 publicações canadenses e 22 americanas. De um modo geral, são trabalhos bem estruturados embora nem todos mereçam a denominação de "grande imprensa". De qualquer maneira, o que importa é publicar periodicamente, e em língua portuguesa. Esses dois fatores tornam essas publicações comprometidas com o jornalismo e, por extensão, com a história da comunicação. O jornalista Alexandre José Barbosa Lima Sobrinho, sábio falecido aos 103 anos, em sua última entrevista, sentenciou: "Ainda que pequenos e nem sempre bem acabados, esses jornais e essas revistas prestam relevante serviço ao jornalismo, sem contar que, quem hoje é pequeno, amanhã poderá ser um gigante".
Evidentemente que essa imprensa não é a única responsável em promover a divulgação e a perenização das tradições de um povo; mas ela seguramente registra os pensamentos, os ideais e os sentimentos desse mesmo povo. Proporciona o conhecimento das diferentes gerações, estabelecendo uma ponte entre o passado e o presente. Por fim, gera discussão a respeito deu seu lugar no mundo da comunicação social.
Estão em língua portuguesa o segundo e o terceiro mais antigos jornais em circulação no Ocidente, respectivamente o Diário de Pernambuco e o Jornal do Commércio, ambos brasileiros.
(*) Jornalista e professora no Departamento de Comunicação Social da Unitau. E-mail <soniacinturao@ecosfera.com.br>
(**) Jornalista, decano dos professores de jornalismo na América Latina, diretor da Faculdade de Comunicação Social Cásper Líbero-SP. E-mail <erasmo@facasper.com.br>