DOM HÉLDER CÃMARA
Brasília sediou nos dias 7 a 9 de novembro o II Sicom (remissão abaixo). O seminário reuniu cerca de 300 estudantes, jornalistas, estudiosos da comunicação e conferencistas de vários países. Ao final, foi entregue o Prêmio Dom Helder Câmara de Jornalismo 2002, que este ano teve como tema o "Jornalismo e cidadania na internet".
Confira os premiados, por categorias: Grande Imprensa, CorreioWeb <www.correioweb.com.br>; Governo, Receita Federal <www.receita.fazenda.gov.br>; Instituições Sociais, Ibase <www.ibase.org.br>; Site cristão, Família Cristã <www.fc.org.br>; Jornalista na web, Bernardo Kucinski, colunista do site Agência Carta Maior <www.agenciacartamaior.com.br>
Veja também
Dom Raymundo Damasceno Assis (*)
[Discurso proferido no ato da entrega do Prêmio Dom Hélder Câmara]
Neste ano em que comemoramos os 50 anos da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), instituímos o Prêmio dom Hélder Câmara de Imprensa. É uma forma também de marcarmos a celebração dos Jubileu de Ouro.
Por que Dom Hélder Câmara? E por que o símbolo do cajado do Pastor para o Prêmio?
Dom Hélder é o comunicador que registra os inícios da história da CNBB. Marca os inícios da CNBB, sendo aquele que registra a história da Conferência, como primeiro secretário-geral.
Dom Hélder é comunicador através de seus pronunciamentos. Com aparência frágil e a palavra forte, torna-se símbolo de uma nova igreja: a Igreja dos Pobres. Dezessete de abril de 1964. Dias depois do golpe militar, Dom Hélder, recém-empossado arcebispo de Olinda e Recife, divulga um manifesto apoiando a ação católica operária em Recife.
Quando, no regime militar, Dom Hélder Câmara foi proibido de falar no Brasil, passou a aceitar os convites para conferências e pregações no exterior. No final dos anos 60 e início da década de 70, o Brasil vive o período mais repressivo da ditadura militar. O padre Antônio Henrique, assessor de Dom Hélder, é preso, torturado e morto. Outros vinte colaboradores de sua arquidiocese são presos e torturados.
Em Paris, no dia 26 de maio de 1970, Dom Hélder faz um forte pronunciamento, em que denuncia, pela primeira vez no exterior, a prática de tortura a presos políticos no Brasil.
A coragem de Dom Hélder o transforma em personagem do mundo, um símbolo de resistência à ditadura. Em 1972, seu nome é indicado para o Prêmio Nobel da Paz.
O governo militar, no entanto, destrói sua candidatura: divulga na Europa um dossiê acusando o arcebispo de ter sido comunista.
A uma certa altura, o arcebispo diz:
"…quando dou pão aos pobres,
chamam-me de santo, quando
pergunto pelas causas da pobreza,
me chamam de comunista."…
A partir de 1978, o governo brasileiro inicia uma lenta abertura política. Aos poucos, cessam as perseguições . Dom Hélder dedica-se mais do que nunca a organizar as comunidades em sua arquidiocese.
Em 1985, ao se aposentar, deixa mais de quinhentas comunidades de base organizadas, que reúnem operários, trabalhadores rurais, retirantes e pescadores, em luta por melhores condições de vida. Dom Hélder participa da campanha pelas "Diretas Já". Pouco depois, durante a Assembléia Nacional Constituinte, percorre o país realizando debates e palestras de conscientização para a cidadania.
Aos 80 anos de idade, sempre atuante, Dom Hélder Câmara lança-se à articulação de uma campanha pela erradicação da miséria no país. A primeira e principal proposta é lutar por uma reforma agrária, para colocar o Brasil no caminho da justiça social.
Dom Hélder é comunicador através de livros que escreve.
Dom Helder é autor de 22 livros traduzidos para 14 idiomas, dentre eles o chinês, japonês, coreano, grego, holandês, dinamarquês e norueguês. O primeiro, Revolução dentro da paz, escrito em 1968, trata de vários temas como o papel da Igreja e a relação entre ciência e fé e países desenvolvidos e subdesenvolvidos. O último livro, lançado em outubro de 1997, chama-se Família: missão de amor. Sua publicação foi motivada pela visita do papa João Paulo II ao Brasil para o 2? Encontro Mundial com as Famílias, realizado no Rio de Janeiro, naquele mês.
Produzindo originalmente em português, francês e italiano, dom Hélder Câmara publicou textos que inspiraram peças de teatro, balés e a Sinfonia dos Dois Mundos. A sinfonia, com música de Pierre Kaelin, é uma tentativa de ajudar a conscientizar os países ricos de que, sem mudanças pacíficas e profundas nos países industrializados, as transformações no Terceiro Mundo serão impossíveis. Sobre o arcebispo existem 352 títulos publicados em vários países.
Em 1974 recebeu o prêmio italiano de "Melhor escritor sobre os problemas do Terceiro Mundo".
Em 1987 mereceu o Cristhoper Award, reservado para premiar, nos Estados Unidos, a melhor produção internacional de livros religiosos. Cidadão honorário de 30 cidades, incluindo uma francesa (Rocamadour) e outra suíça (São Nicolau), dom Hélder recebeu também 32 títulos de doutor honoris causa (em teologia, letras, direito, sociologia e economia e comércio), conferidos por universidades de nove países, principalmente do Brasil e dos Estados Unidos. A primeira a conceder-lhe o título foi a Universidade de Saint Louis (EUA), em 1969. No Brasil, coube à Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) ser a pioneira na entrega da distinção, em 4 de março de 1982.
Pacifista reconhecido, dom Hélder foi membro de inúmeras organizações internacionais voltadas para a paz e a justiça social em todo o mundo.
Pela defesa de ideais pacifistas recebeu, entre outros, os prêmios Popular da Paz (Noruega e Alemanha, ambos em 1974), Paz Victor Gollancz Humanity Award (Inglaterra, 75), Mahatma Ghandi (TV Globo São Paulo, 82), Artesões da Paz (Itália, 82), Niwano Peace Foundation (Japão, 83).
Tanto a voz como a palavra de dom Hélder estão registradas em numerosos cassetes, discos, vídeos, filmes e programas radiofônicos (Um olhar sobre a cidade, Rádio Olinda).
Dom Hélder comunica-se com os jornalistas.
"O falar franco e direto, crítico e esperançoso de Dom Helder encantava os jornalistas que o assediavam para entrevistas e reportagens.
Sua grande tribuna no Concílio, não foi a Aula Conciliar na Basílica de São Pedro, mas sim a imprensa de uma parte e, de outra, o incansável esforço de articulação cumprido por meio da CNBB, do CELAM, do Grupo da Igreja dos Pobres, da rede de amigos e colaboradores que soube conquistar para suas causas, a dos pobres e a da Igreja servidora dos pobres, aliado ao trabalho escondido nos bastidores, por intermédio de encontros pessoais, cartas, circulares."
Por que o cajado no troféu dom Helder Câmara?
Para o troféu Dom Hélder Câmara de Imprensa da CNBB, foi escolhido o bastão ou cajado.
Símbolo muito simples, este cajado está na logomarca da CNBB, lembrando a missão do Bispo.
O significado do cajado liga-se à sua origem, ou seja, à árvore, portadora da vida.
O bastão é símbolo de defesa da vida.
Moisés mandou os israelitas comerem a refeição pascal com rins cingidos, sandálias nos pés e bastão nas mãos (Ex 12,11)., O bastão significa peregrinação, e também esperança nas promessas de Deus.
No Salmo 145, o bastão é "cetro de justiça?.
Quando Jesus enviou seus discípulos, deu-lhes a ordem de que "não levassem pelo caminho nada, a não ser, um cajado" (Mc 6,8), símbolo da peregrinação na fé e pela fé.
Como o pastor que é, ao mesmo tempo, chefe e companheiro, homem forte, capaz de defender o seu rebanho (Mt 10,16), com autoridade baseada na misericórdia e no amor, na Igreja o bispo é denominado Pastor e o cajado se tornou um símbolo de sua missão, ou seja, símbolo de pastoreio. Dom Hélder foi um bom pastor que lutou e defendeu a causa dos mais fracos. Queria um novo milênio sem fome. E ao falar de fome, dom Hélder utiliza expressões que traduzem sua comunicação, como quando diz: "Melhor do que o pão é a sua partilha" .
A mensagem de dom Hélder para hoje.
Para finalizar esta referência ao Prêmio Dom Câmara de Imprensa, nada melhor do que as próprias palavras do arcebispo ditas às portas do terceiro milênio:
" A encarnação do Filho de Deus aconteceu há 2000 anos. Há ainda demasiada miséria no mundo, num mundo de riquezas! E, o que é grave e insuportável, é o fato que a minoria dos privilegiados, os mais ricos, são, pelo menos na sua origem, cristãos.
O que fizemos com a mensagem de Cristo? De que maneira a multidão dos pobres, dos excluídos, dos marginalizados, dos sem-casa, dos sem-terra, dos sem-nada, pode acreditar que o Criador é o Pai que os ama, se nós, que nos dizemos cristãos, que temos mais, continuamos a deixar o prato deles vazio, embora nos declarando em favor da Paz e do Amor?
Não sejamos somente crentes… Sejamos ACREDITÁVEIS!
Assim o mundo será como uma Hóstia voltada para o Senhor, uma imensa Hóstia de ação de graças a Deus, na felicidade de todos os Humanos.
Porque a felicidade dos Homens é a Glória de Deus.
Ainda há muito o que fazer para pôr ordem no mundo. Com as poucas forças que ainda nos restam, continuamos nosso combate à miséria, em todo lugar onde for possível.
Que seja junto com todos vocês!"
"Partir, mais do que devorar estradas, cruzar mares ou atingir velocidades supersônicas, é abrir-se aos outros, descobri-los, ir-lhes ao encontro".
Se hoje, lhe perguntássemos, o que pensa do caminho da internet para o jornalismo cidadão, com certeza ele diria o que disse uma vez:
"Gosto de todos os caminhos. Eles convidam a não parar, a sair de si, a buscar outros, a partir anunciando a Palavra de Deus".
(*) Secretário-geral da Conferência Geral dos Bispos do Brasil