Nos códigos que regem a redação dos obituários, além do indispensável respeito é indispensável a busca da verdade. As matérias publicadas pela imprensa no domingo, segunda e terça (9, 10 e 11/02) souberam reconhecer que a história de sucesso do Jornal do Brasil, iniciada em 1956 sob a batuta do seu falecido diretor-presidente, ficou comprometida com algumas opções políticas do jornal nos anos 80. Sobretudo o apoio ao candidato Paulo Maluf nas eleições presidenciais indiretas de 1985, contra Tancredo Neves.
Está correto. Mas se não havia espaço para analisar aquela situação num necrológio espremido numa edição de domingo, conviria registrar aqui que Paulo Maluf jamais mediu esforços e meios para influir nos meios de comunicação. Tanto na mídia conservadora como progressista, tanto na grande imprensa como em novos projetos jornalísticos. Tanto no passado remoto como num passado recentíssimo. E raras vezes foi mal-sucedido.
Isto posto, conviria acrescentar que a opção malufista do JB sucedeu a uma outra, dez anos antes, quando o jornal entregou-se ao projeto da dupla Geisel-Golbery e não apenas no que tinha de positivo ? a distensão gradual e segura ? mas também no que tinha de cesarista e tribal.
Não foi somente a construção do fabuloso prédio da Avenida Brasil, 500, junto ao cais do porto do Rio, e o investimento em novas máquinas que comprometeram a saúde financeira da empresa. Foi a fascinação pela TV. A direção do JB desviou a atenção da sua razão de ser (o jornal) para a miragem que se descortinava com a concessão de dois canais (Rio e São Paulo).
O raciocínio foi este: para bater O Globo com o suporte da Rede Globo só um Jornal do Brasil amparado por uma Rede JB. Esqueceram que dois anos antes ? naquele fim de semana histórico quando o jornal da família Marinho passou a circular aos domingos e o jornal da condessa Pereira Carneiro, às segundas-feiras ?, apesar do formidável reforço da propaganda televisiva, o Jornal do Brasil superou O Globo em circulação, publicidade e reconhecimento público.
Graças a um arsenal provido de uma única arma: qualidade.
Na condição de testemunha, este Observador pode afirmar que a marca de Nascimento Brito como publisher e empresário de comunicação está contida numa frase que não cansava de repetir: “Quero que todas as manhãs entre na minha casa o melhor jornal do país”.
Foi coerente: não fez economias em papel, contratações e, sobretudo, em treinamento. O JB foi o primeiro jornal brasileiro a implementar uma política de formação que envolveu todos os escalões. Isto em meados dos anos 60.
Diversificada a atenção da empresa para duas áreas ? mídia impressa e eletrônica ? dividiram-se as prioridades e impôs-se a fascinação pela TV. Com os inevitáveis movimentos-envolvimentos políticos. Catastróficos.
Obituários são também biografias que também são ensaios de história. Impossível desenhar a trajetória de um indivíduo desdenhando outros, desligando-o das circunstâncias e conjunturas, sobretudo ignorando a irremediável imperfeição da condição humana.
(*) Editor-chefe do Jornal do Brasil de 1962 a 1973