E-NOTÍCIAS
FEBRE DIGITAL
Carlos Plácido Teixeira (*)
"É-inevitável". Não há como deixar de perceber que tudo no mundo atual, conectado à internet, tenha virado um "e-algumacoisa". Além dos óbvios e quase gastos "e-business" e "e-commerce", e além do "e-mail", "é-claro", a originalidade dos nossos criativos "e-tecnólogos" e "e-marketeiros", ao lidar com a lúdica língua do "e-", chancela com o símbolo eletrônico praticamente tudo. É um "e-tudo". Virou argumento de "e-vendas", de "e-distribuição", de "e-armazenamento", de "e-vida", de "e-lazer", de "e-trabalho".
Curioso é, entretanto, que nesta onda não se fale em "e-comunicação", ou "e-communication", como preferirão "e-consultores" disponíveis no mercado. A ausência de uma expressão que sintetize a comunicação eletrônica reflete claramente a distorção da análise sobre o papel desempenhado pela internet. Poucos reconhecerão a verdade, mas predomina no mercado uma dificuldade em perceber a rede mundial como um meio de comunicação, uma grande teia por onde trafegam informações e não apenas produtos e serviços à venda.
A exaustiva utilização da referência ao comércio eletrônico, o "e-commerce", retrata a visão limitada da abrangência da internet, em que a tecnologia – o meio – prevalece em relação ao objetivo final, que é a disseminação e troca de informações. E do ponto de vista do "e-commerce", a internet não passa de um grande shopping center.
Numa uma analogia com o mundo da construção, a maioria dos projetos desenvolvidos para a rede tem dois profissionais em atividade: um engenheiro, responsável exclusivamente pelas obras de fundações (ou seja, a tecnologia envolvida na colocação da página na rede), e um decorador, que deixa a página esteticamente bonita e funcional. Nada contra decoradores, apenas constato que ninguém entrega a construção de uma casa – que inclui projetos hidráulico e elétrico, distribuição de cômodos e gerenciamento da obra, entre outras atividades – a um decorador.
Link para o JN
Ainda no mundo das comparações, se o comércio eletrônico fosse o mais importante elemento da internet seria possível imaginar que o Shoptime, aquele canal de televisão especializado em vendas de produtos, seria o líder de audiência da TV a cabo.
Tudo bem que há quem tenha dinheiro para ficar consumindo o dia inteiro e algum distúrbio de comportamento para ficar vendo apenas aquela seqüência interminável e repleta de repetição de ofertas sensacionais de produtos, propagandeada por atores que cumprem eficientemente o papel de simpáticos vendedores. Mas as pessoas que representam a média da população – ou normais, como queiram – buscam na televisão mais do que a propaganda de bens. Aliás, diga-se, se há um desafio comum à Globo, ao SBT e a todos os canais televisivos é o de fazer com que o telespectador não dispare seu controle remoto ou sinta vontade de ir ao banheiro exatamente na hora dos nossos (deles) comerciais.
Apesar das evidências, no cotidiano do desenvolvimento e apresentação de projetos para a internet os potenciais investidores reforçam simplesmente a expectativa de desempenho dos catálogos de vendas – definidos, por sinal, como conteúdo. Para eles, outras informações são apenas um recheio. Se colocados diante do desafio de comandar uma rede de comunicação, muitos desses investidores colocariam, por exemplo, um link para o Jornal Nacional entre dois anúncios.
O ator principal
Quem teve a experiência de passar por negociações com potenciais investidores sabe que terá de responder à pergunta: o que vamos vender?, reforçando a visão exclusivamente "e-comercial" dos empreendimentos. E contrariando o discurso de que o cliente na nova onda é o mais importante, não fazem qualquer pergunta sobre o público-alvo. E muito menos sobre as estratégias de gerenciamento da página. Não percebem que o desafio não é colocar uma página na rede – colocar por colocar, qualquer um faz –, mas fazer com que o leitor-consumidor volte sempre ali, hoje e no final de 2005.
Claro que os projetos devem ser viabilizados economicamente, como geradores de receita. Nos dias de hoje são poucos os que fazem algo, inclusive na rede, por diletantismo. Mas os resultados de empreendimentos dependem da percepção de que se está criando meios de comunicação, e não lojinhas quaisquer. Alguns casos de lançamento de portais são exemplos de sucesso que tiveram origem no desenvolvimento e na estruturação baseados na "e-comunicação".
Percebido que o comércio deve ser coadjuvante, e não o ator principal da internet, fica evidente o fato de que está na hora de identificar a "e-comunicação" como elemento vital em projetos desenvolvidos para a rede.
(*) Jornalista, pós-graduado em Gestão de Recursos Informacionais, especialista em informática e negócios, editor do site Tecnoportal <www.tecnoportal.com.br>
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