AGÊNCIA CÂMARA
Patricia Roedel (*)
Há três anos, tive o privilégio de participar da criação de um novo serviço de comunicação pública, que, à época, imaginávamos capaz de traduzir, em termos concretos, o conceito da democracia. A Agência Câmara de Notícias surgiu como contraponto à cobertura convencional que a mídia de mercado faz da Câmara dos Deputados, ao divulgar atividades que historicamente vêm merecendo pouca atenção da imprensa privada.
Esse contraponto é necessário porque a notícia negativa é sempre "mais notícia" do que a positiva, e, com essa teoria, diariamente os meios de comunicação nos defrontam com uma enxurrada de informações que deterioram o Parlamento ? induzindo-nos, de forma simplista, a concluir que a instituição é a extensão de um e outro que a compõem. O processo é perigoso porque entre a conclusão generalista de que "os deputados são corruptos e ociosos" e a de que o Legislativo é desnecessário ao país passa apenas uma linha tênue, ameaçadora ao sistema representativo democrático.
Ao contrário da cobertura política convencional, a Agência Câmara não dá guarida a disputas político-partidárias ou às conversas de bastidores, que nem sempre se concretizam em fatos. Seu material restringe-se à parte substantiva do trabalho parlamentar ? os fatos e decisões que ocorrem no Legislativo. A agência norteia-se pelo conceito de comunicação pública, em contraposição à assessoria de imprensa dos parlamentares, que deve ser providenciada por seus gabinetes, e não pela estrutura permanente da Casa.Com essa linha, e enfatizando o trabalho legislativo que ocorre nas cerca de 30 comissões temáticas em funcionamento, a agência mostra que o plenário vazio não necessariamente reflete parlamentares ociosos. É no chamado "corredor das comissões" que tudo acontece: os projetos são debatidos, decididos, e seus contrapontos, explicitados. Divulgando o passo a passo da tramitação dessas propostas antes que sejam votadas, a agência contribui efetivamente para o processo democrático, auxiliando veículos de comunicação, entidades de classe, empresas e órgãos do governo a identificar projetos de seu interesse.
Debates reais
Sabendo da existência de projetos que lhe dizem respeito, a sociedade organizada e os formadores de opinião encontram as ferramentas necessárias para fazer o legítimo lobby (hoje, advocacy) em defesa de seus interesses e pugnar pela aprovação ou rejeição de um projeto. Assim, a sociedade passa a participar do processo legislativo de forma concreta e presencial, diferentemente de quando só tinha acesso ao que acontecia na Câmara por meio da mídia privada.
Até então, a capacidade de acompanhar temas de interesse restrito na Câmara era privilégio ? e não, direito ? de empresas e entidades patronais que podiam manter um funcionário no Congresso à cata das informações "escondidas" pelo desinteresse da mídia.
Um projeto de lei que interessasse a apenas um segmento social não seria noticiado pela mídia, ou, se o fosse, a notícia seria posterior à sua aprovação ou rejeição. Não se trata de má vontade dos veículos de comunicação: com um ou dois profissionais cobrindo Câmara e Senado, torna-se impossível fugir da previsível cobertura de plenário e CPIs, mesmo que outras dezenas de comissões estejam aprovando leis importantes.
Vale lembrar que a maioria dos projetos tramita em caráter conclusivo pelas comissões, não precisando ser votada pelo plenário caso todas elas o aprovem. Assim, numerosos projetos passam ao largo da mídia, que está focada naquilo que se faz (ou não se faz) no plenário.
Com essa linha editorial, a Agência Câmara vem cumprindo o papel a que se propôs como veículo de comunicação pública. Divulgando apenas projetos em tramitação, audiências públicas, debates e votações em plenário, a agência edita, em média, 90 notícias por dia. Como a imprensa convencional também necessita desse noticiário, a agência vem apresentando, nesses três anos, excelentes resultados na divulgação dos trabalhos da Câmara. Diariamente, cerca de 300 sítios na internet, além de diversos jornais, rádios e TVs do país, reproduzem parcialmente nosso noticiário ou o utilizam como pauta para suas matérias. Uma mostra de que é possível iniciar a inversão do processo do privilégio à informação pública, inserindo no cotidiano da sociedade organizada os debates reais que se travam no Parlamento.
(*) Editora-chefe da Agência Câmara de Notícias <http://www.agencia.camara.gov.br>