QUALIDADE NA TV
ASPAS
GUERRA DA AUDIÊNCIA
"TV Globo escala Manoel Carlos para salvar ibope", copyright Folha de S. Paulo, 6/04/01
"Encerrada a novela ?Laços de Família?, que levantou a audiência da Globo em 2000, o autor Manoel Carlos iria tirar férias de um ano. Iria. Ele foi convocado pela Globo, na última terça, para colocar no ar, já em agosto e setembro, a minissérie ?Presença de Anita?.
Com apenas 20 capítulos, a minissérie terá a missão de resgatar a liderança da Globo no horário das 22h. A emissora voltou atrás da decisão de não exibir minisséries neste ano porque a nova programação do horário -com ?Brava Gente?, ?A Grande Família? e ?Sexta Super?- vem perdendo no Ibope para o SBT.
Inspirada em personagens de romance de Mário Donato, que Manoel Carlos leu escondido em 1948 -o livro foi perseguido pela Igreja Católica-, a série se passará na última semana de 2000.
A trama central é a de ?uma jovem transgressora de 17 anos, que leva um homem e um menino à loucura?. ?Perto de ?Presença de Anita?, ?Laços de Família? vai parecer um conto de fadas?, diz Manoel Carlos, já prevendo problemas com a igreja.
Os capítulos, prontos desde 93, estão sendo atualizados por Manoel Carlos. Dirigida por Ricardo Waddington, a minissérie deverá ser gravada em Bragança Paulista."
"Os crimes do sensacionalismo", copyright Folha de S. Paulo, 8/04/01
"Foi uma tragédia familiar. O filho sofre um acidente e é internado no hospital Pedro Sanchez, de Poços de Caldas. Lá, constata-se morte cerebral. É transferido para a Santa Casa e os pais autorizam a doação de órgãos para transplantes. É feita.
Terminado o processo, o hospital Pedro Sanchez encaminha a conta para a família. Seis meses depois o pai do menino, ainda traumatizado pela perda, começa uma campanha contra os médicos que receberam os órgãos para transplante e que eram da Santa Casa local, nada tendo a ver com o Pedro Sanchez. Não se deu conta de que a doação foi feita para a Santa Casa e a cobrança, pelo hospital Pedro Sanchez.
Amplie-se essa confusão de pai sofrido em um programa de larga audiência -o ?Fantástico?- e não há quem repare o mal feito. Um falso escândalo está colocando em risco todo um grupo de transplantes que transformou a vida de todo doente renal da região.
A ampla e necessária burocratização dos sistemas de doação por vezes acaba atropelada pela urgência do dia-a-dia. Mas o grupo começou a praticar o transplante no início dos anos 90 e sempre se esmerou em trabalhar dentro do maior rigor ético -feito reconhecido pelas sucessivas fiscalizações ocorridas. Mais: dos 174 transplantes feitos até agora, 169 foram pelo SUS. É o único centro transplantador do sul de Minas, o segundo do Estado.
Na cidade, o grupo é conhecido pela dedicação. Não raras vezes médicos da equipe levam doentes, rins, exames de sangue até Campinas, a sua própria custa.
O médico Álvaro Ianhez -acusado nessa história- foi vítima do mesmo sensacionalismo que quase liquidou outro grupo pioneiro e dedicado -os médicos paranaenses especializados em transplante de medula, liderados pelo extraordinário dr. Pasquini. Os transplantes eram feitos pelo SUS. Mas havia a necessidade de localizar doadores em bancos de dados. Uma falsa denúncia de cobrança por fora, a vontade da repórter de buscar o sensacionalismo, entrevistas editadas para reforçar a tese, uma entrevista com uma autoridade falando sob hipótese e -pronto!- reputações jogadas na lama, processos de transplante interrompidos, doentes correndo risco até se esclarecer a situação.
Esse mesmo quadro se repete agora, tendo como autores as mesmas pessoas, o mesmo programa de televisão e os mesmos métodos. Nesse jogo baixo pela audiência pouco importa se inocentes são sacrificados, se doentes são prejudicados e se a verdade é imolada no altar do Ibope.
Está na hora de haver um mínimo de consciência nessa busca obsessiva pela audiência."
RÁDIO RATINHO
"Ratinho compra rádio e quer montar rede de FM", copyright Folha de S. Paulo, 7/04/01
"O apresentador e empresário Carlos Massa, o Ratinho, fechou anteontem a compra de sua primeira emissora de FM, a Rádio Melodia, de Curitiba, que opera na frequência 97,9 MHz. A emissora era ligada à igreja do Evangelho Quadrangular.
Os planos do apresentador do SBT são ambiciosos. ?Quero montar uma rede nacional com 300 emissoras?, afirma. Jovem Pan, Transamérica e Band, juntas, não possuem 300 afiliadas.
Ratinho está disposto a investir R$ 5 milhões no projeto. Mas, para alavancar a rede, ele terá de comprar FMs ou fazer parcerias com emissoras de São Paulo e Rio, principais mercados publicitários. Em São Paulo, concessões de FM estão avaliadas em US$ 8 milhões. O arrendamento não sai por menos de R$ 100 mil mensais.
O plano de Ratinho é montar uma programação na FM de Curitiba, colocar o sinal em satélite e atrair afiliadas de todo o país.
A programação, segundo o apresentador, terá três músicas de sucesso e um bloco de jornalismo. ?Notícia vai ser prioridade?, afirma. Ratinho quer inaugurar a rede em seis meses e irá participar da programação, a cada hora, de um estúdio em São Paulo, fazendo comentários."
DIGITAL
"Novela da TV digital é esticada e ganha 18 meses", copyright Folha de S. Paulo, 4/04/01
"Para evitar o risco de se enfraquecer nas negociações com a Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) pela escolha do padrão de TV digital a ser adotado no Brasil, a Globo teve de recuar em uma reivindicação que faria ao governo e acatar decisão das emissoras concorrentes.
Nas últimas reuniões entre as TVs e a Anatel, a Globo defendia junto à agência que as emissoras fossem liberadas a transmitir programação digital assim que recebessem a concessão e se equipassem para a transmissão. A idéia era ser a primeira a exibir seus programas no novo sistema.
Mas SBT, Record, Bandeirantes e Cultura queriam que fosse estipulado pelo governo um prazo mínimo, antes do qual as emissoras não poderiam transmitir no sistema digital, isso para que todas pudessem se equipar e passar ao sistema simultaneamente.
Depois de muita negociação, a Globo decidiu se unir ao bloco das concorrentes. Em fevereiro, Globo, SBT, Record, Bandeirantes e Cultura entregaram ao presidente da Anatel, Renato Guerreiro, um documento em que defendem seus interesses na regulamentação da TV digital.
No documento, as emissoras pedem um prazo mínimo de 18 meses para o início das transmissões digitais após a regulamentação. Assim, a novela da TV digital ganha mais um ano e meio de duração. Como o governo adiou novamente a decisão inicial do processo -a escolha de qual padrão será adotado pelo país, prevista para março ou abril-, as primeiras transmissões digitais no país deverão ocorrer só a partir do segundo semestre de 2003.
Isso levando em consideração que o final do processo de escolha, com a regulamentação, seja concluído ainda em 2001. No ano passado, previa-se que as primeiras transmissões seriam em 2002.
?As outras emissoras não estavam de acordo com a Globo, que teve de voltar atrás. Se não voltasse, ficaria sozinha e a gente poderia fazer o que bem entendesse no resto (das negociações)?, afirma Luiz Eduardo Borgerth, que trabalhou na Globo durante 30 anos e atualmente é consultor do SBT.
Fernando Bittencourt, diretor de engenharia da Globo e coordenador do grupo SET/Abert (Sociedade de Engenharia de Televisão e Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e TV), disse que a emissora não teve problemas em aceitar a decisão das concorrentes. ?Na questão da TV digital, todas as emissoras estão unidas. Percebemos que não havia motivo para querer transmitir antes de todo mundo?, afirmou.
Nesse documento enviado à Anatel, ao qual a Folha teve acesso, as emissoras resolveram evitar o lobby pela adoção do padrão japonês, defendido pelo grupo SET/Abert. A estratégia foi a de não mostrar uma pressão à Anatel, já que a relação entre a agência e as emissoras se abalou em novembro de 2000, quando o grupo das TVs criticou publicamente o adiamento da decisão sobre o padrão a ser adotado no país.
Em março, a TV digital voltou a ser debatida entre as emissoras e a Anatel. O motivo foi a transmissão digital experimental que o grupo SET/Abert realizou no Rio. O padrão usado foi o japonês, apontado como o melhor tecnicamente por testes realizados pelas emissoras entre 1999 e 2000.
Para a demonstração, o grupo colocou, em um hotel do Rio, um aparelho de TV que custa em torno de R$ 25 mil, capaz de captar os sinais digitais. Nesse aparelho, foram transmitidas imagens em alta definição. Um televisor de 14 polegadas foi usado para mostrar a diferença entre a transmissão analógica e a digital.
Além disso, o grupo equipou um ônibus com um aparelho de TV analógico e um digital, para mostrar a capacidade da transmissão móvel do sistema. O veículo circulou por ruas do Rio.
Durante o percurso feito pela Folha, o aparelho analógico perdia o sinal em vários momentos, já o digital funcionou perfeitamente.
Na palestra dada durante a demonstração, engenheiros do grupo SET/Abert afirmavam que o padrão japonês e o europeu serviriam para os objetivos das emissoras brasileiras.
Preocupados com a repercussão dessa demonstração, um grupo de executivos americanos ligados ao padrão ATSC (o sistema de TV digital dos EUA) esteve em março em São Paulo e se reuniu com autoridades do governo federal em Brasília."
"Definição de TV", editorial, copyright Folha de S. Paulo, 5/04/01
"Num momento em que no mundo todo ocorre uma transformação acelerada e profunda em todos os sistemas de comunicação, o debate sobre a televisão digital, em particular sobre a TV de alta definição, patina sobre uma falsa questão: a escolha do padrão tecnológico.
É verdade que também está em jogo uma decisão cujos critérios são técnicos. Mas a ênfase excessiva na tecnologia, como aliás já vem ocorrendo com a Internet e com outras redes, tem o efeito de empobrecer o debate sobre os vários aspectos econômicos, sociais, políticos e culturais, em suma, ?humanos?, das opções tecnológicas em jogo.
A Internet tem vivido impasses análogos. O exemplo mais claro é o da busca ainda inconclusa do modelo de negócios a ser adotado. Modelo de negócios que envolve aspectos de regulação econômica e política, tais como a defesa da competição e a democracia no acesso.
Há dimensões técnicas nessa questão econômica, como por exemplo o critério de distribuição de espaço na ?banda? (intervalo de frequências de rádio ou formas de uso de fibras óticas). Dependendo da opção, será mais ou menos difícil abrir espaço para empresas pequenas (regionais ou mesmo locais) de produção de conteúdo para rádio, televisão, Internet etc. Nesse sentido, é importante registrar a disposição da Rede Globo de aceitar o adiamento da decisão em benefício de mais debate.
Pode-se dizer que há, também nesse terreno, uma espécie de ?reforma agrária?, em que é preciso aprofundar o debate sobre os ?sem-banda?.
Ou seja, é preciso avaliar, entre outros tópicos, o risco de monopólio tanto na infra-estrutura quanto na produção e na distribuição de conteúdo. Está em jogo a capacidade de uma sociedade criar novos sistemas de comunicação mais democráticos que os atualmente vigentes em vários setores. A TV pode até ser de alta definição, mas estão em questão definições que vão muito além do padrão tecnológico em si."
"Equívocos na questão dos atores negros", copyright Jornal da Tarde, 5/04/01
"Está equivocada a discussão em torno do trabalho de atores negros na televisão, no cinema e no teatro produzidos no Brasil. A polêmica gira em torno do projeto do deputado petista Paulo Paim – e só gira em torno, sem ir ao centro da questão. O projeto pretende criar uma cota de 25% de atores negros na televisão, teatro e cinema, e de 40% na publicidade. Foi aprovado há uma semana na Comissão de Ciência e Tecnologia da Câmara dos Deputados. Há muitos palpites dos interessados, pouca análise. Pior é que a discussão não é levada pela televisão ao seu público. Parece que nem é com ela. Ou então ela não quer que o assunto chegue ao telespectador. Não quer que ele tenha consciência crítica da exclusão."
Qualidade na TV ? texto anterior