Thursday, 28 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1316

Débora Cronemberger

O POVO

"Novamente, conclusão precipitada", copyright O Povo, 11/11/01

"Na última terça-feira, O Povo deu a seguinte manchete: ?Bomba em prédio da Caixa?. Era a quarta vez, desde 1999, que o prédio da Caixa Econômica Federal, na rua Sena Madureira, se deparava diante da possibilidade de explosivos. Isso mesmo, possibilidade. Não era bomba o artefato caseiro encontrado na Caixa, o que significa que o jornal publicou duas manchetes erradas em menos de uma semana. O erro anterior foi publicado no dia 1? de novembro, com a manchete sobre a polêmica em torno da legalidade do feriado do Dia de Finados. O Povo assegurou na capa: ?É lei: amanhã é feriado?. O assunto foi inclusive comentado nesta coluna no último domingo.

A matéria sobre a bomba (ou melhor, a ameaça de bomba) na Caixa Econômica Federal mostrava insuficiência de dados para chegar à conclusão da manchete. O título da página interna também foi conclusivo: ?Bomba esvazia prédio da Caixa?. Logo no resumo da matéria, abaixo da manchete de página, o discurso mudou. ?Vinte dias depois do último trote, os funcionários da Caixa Econômica voltaram a ser retirados do prédio sob ameaça de bomba. Na vistoria feita por peritos da Polícia Federal e PMs do Gate, foi encontrado um artefato de fabricação caseira?. Ou seja, a informação divergia das manchetes de capa e da página. Já não era mais uma bomba, mas uma ameaça.

A contradição ficou evidente para o leitor que comparou as matérias do O Povo e do Diário do Nordeste. O Povo atribuía a peritos da Polícia Federal a informação de que foi encontrado um artefato que simulava uma bomba caseira. No Diário, a declaração do perito da Polícia Federal, Fernando Mota, foi direta: ?Não era uma bomba e não explodiria?. Na edição seguinte, O Povo admitiu o equívoco das duas manchetes (capa e página interna) na seção ?Erramos?.

Faltou tirar dúvidas com especialista

Conforme observei no comentário interno, aparentemente é fácil, depois da publicação do erro, apontar caminhos alternativos que teriam evitado o problema. Mas duas manchetes erradas em menos de uma semana exigem reflexões urgentes sobre os procedimentos que têm sido tomados para oferecer aos leitores informações fiéis aos fatos.

Nos dois erros recentes na manchete principal – feriado legal ou não, e existência de bomba ou não -, o que causou problemas não foi declaração polêmica de entrevistados que posteriormente negaram as informações. Tampouco foram denúncias com inconsistência de provas. Simplesmente foram conclusões apressadas com base em matérias que não diziam o que estava destacado nas manchetes. Uma consulta a uma fonte especializada teria evitado o uso de palavras equivocadas nos dois casos.

O diretor-executivo da Redação, Carlos Ely, admitiu a falha de procedimento. ?A Redação não soube traduzir uma linguagem técnica a respeito do artefato. Houve uma conclusão errada de que era uma bomba. A todos nós, fica uma obrigação ainda maior de sermos rigorosos com a apuração das matérias. Aos editores, um cuidado redobrado na leitura e releitura das matérias para verificar qualquer brecha ou incoerência?, afirmou.

Significados das palavras

Na última semana, O Povo publicou uma série de reportagens a respeito de uma das maiores obras do Ceará: o Metrofor. É uma das mais expressivas sob todos os pontos de vista, não só pelo impacto que terá na vida da cidade, mas também pelo natural e enorme impacto causado pela própria execução do projeto. Em meio a tantas matérias, envolvendo tantos detalhes, a cobertura atingiu um grau de excelência sob a perspectiva da amplitude de entrevistados. Os pontos de vista, prós e contras, estavam lá, à disposição para as conclusões dos leitores.

A falha, em meio a todo esse material, foi o uso de uma palavra inadequada na matéria da última sexta-feira. A matéria informava um projeto da Secretaria da Cultura do Estado (Secult), que pretende projetar, a partir da estação João Felipe, no centro da cidade, o terceiro pólo de eventos de artes plásticas do Brasil. Os outros dois grandes pólos são a Bienal de São Paulo e a Bienal do Mercosul, em Porto Alegre. O projeto da Secult vem sendo chamado de Parque da Bienal. O problema: a matéria classificou o projeto de megalomaníaco.

Ambicioso com certeza, megalomaníaco não. Megalomania é delírio de grandeza, associada a planos magníficos que não costumam ser viabilizados. Se o projeto da Secult vai atingir essa meta de ser voltado para as três Américas, como disse o secretário Nilton Almeida, está cedo para assegurar, mas sonhar alto é preciso. Se o projeto será viabilizado, o tempo é que vai dizer.

Outra palavra teve o uso contestado, dessa vez pela Assessoria de Imprensa do Metrofor. O questionamento foi direcionado para o título de uma das matérias da edição de quinta-feira: ?Obra mais cara: US$ 502,2 milhões?. A Assessoria do Metrofor contestou o uso da palavra ?cara?. ?Na verdade, orçado em US$ 502,2 milhões, o Metrofor é o projeto de maior investimento público no Ceará. A diferença entre mais caro e maior investimento é bastante relevante?, comentou a jornalista Ana Maria Xavier, assessora do Metrofor, acrescentando que, entre outros metrôs do Brasil, o de Fortaleza tem o menor custo por quilômetro implantado.

Discordo da avaliação: o uso da palavra não implica necessariamente uma carga pejorativa. No Dicionário Michaelis, há uma explicação sobre ?caro? que até embasa a preocupação do Metrofor: ?cujo preço excede o seu valor real?. Mas não é a única opção para explicar o sentido da palavra: ?que custa alto preço?, ?que custa sacrifícios ou grandes despesas?, ?a um alto preço?. Portanto, o uso da palavra é fiel ao contexto e não significa uma carga negativa obrigat&oacuteoacute;ria."