Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Diretores desconfiavam de Gilligan

INQUÉRITO DE HUTTON

A BBC sofreu um forte desgaste no dia 12/8, durante o inquérito de Hutton, com a revelação de que editores seniores da corporação e até mesmo diretores demonstraram preocupação com relação às reportagens de Andrew Gilligan sobre as armas de destruição em massa no Iraque.

Kevin Marsh, editor do programa Today ? no qual foram transmitidas as matérias de Gilligan ? disse em e-mail particular que a percepção do repórter de como o governo trabalhou o caso foi "desfigurada por jornalismo falho" e concluiu que "o maior peso" para a corporação foi "o uso irresponsável da linguagem". Ele prometeu aplicar mudanças ao método de trabalho de Gilligan, forçando-o a ir ao escritório, banindo ou controlando sua redação a outras organizações e impedindo-o de falar no ar o que lhe vem à cabeça.

Segundo Matt Wells [The Guardian, 13/8/03], os diretores da BBC também foram críticos, expressando desaprovação à falha de Gilligan em aplicar "linguagem cuidadosa" e preocupação quanto à cultura jornalística de Today.

As declarações põem a BBC na difícil posição de ter de explicar por que deu apoio incondicional e público a Gilligan enquanto sérias dúvidas eram expressas em particular.

Susan Watts, repórter do programa Newsnight, denunciou tentativas da BBC de "modelar" suas reportagens como, acredita ela, uma estratégia "errônea" de "corroborar" a reportagem polêmica de Andrew Gilligan.

Julia Day [The Guardian, 13/8] conta que no dia 13/8, durante o inquérito de Hutton, ela revelou ter se sentido compelida a procurar representação jurídica devido à pressão de seus chefes na BBC para que dissesse que David Kelly, o cientista da biodefesa britânica que era fonte de Gilligan e se suicidou recentemente, era sua principal fonte, a fim de concordar com o repórter no olho do furacão.

"Senti uma pressão considerável da BBC. Também senti que a proposta daquilo era corroborar as alegações de Gilligan; não havia nenhum fim noticioso", disse Susan. "Senti que havia diferenças significativas entre minhas reportagens e as dele."

Susan descreveu como fora pressionada, em dois encontros distintos, um com seu editor George Entwistle, em 30/6, e outro com o diretor de notícias da BBC Richard Sambrook, alguns dias depois. Ambos tentaram arrancar a confissão de que Kelly era sua fonte também.

Andrew Gilligan não tomava notas "completas ou aprofundadas" de seus principais encontros com David Kelly. A revelação, feita durante o inquérito de Hutton em 12/8, é mais um ponto negativo para a BBC nas discussões sobre o famigerado dossiê e sua repercussão na corporação.

No entanto, as anotações de Gilligan apontam que foi Kelly quem primeiro disse o nome de Alastair Campbell e as afirmações de que foram feitas mudanças no dossiê para torná-lo mais "atraente".

Segundo Julia Day [The Guardian, 12/8], Gilligan desafiou a prestação de contas feita por Kelly antes de morrer. Há diversos pontos de conflito sobre a relação entre o repórter e o cientista. Gilligan disse que dos três encontros que Kelly disse ter feito com o repórter para discutir a situação no Iraque, dois não ocorreram, e o terceiro durou mais do que Kelly havia dito a seus chefes.