MÍDIA GAÚCHA
Paulo C. Barreto (*)
Qual é a diferença entre spam e não-spam? Pergunte aos homens de toga.
O jornalista gaúcho Diego Casagrande foi condenado por spam. Não prometeu dinheiro fácil; não distribuiu mensagens com vírus nem correntes contra vírus; não indicou sites de sexo nem cassinos online; não enviou uma só linha a quem não estivesse interessado. Sua infração: distribuir um boletim informativo aos assinantes que optaram por recebê-lo. A história completa está em <www.diegocasagrande.com.br>.
Enquanto nós, usuários, não conseguimos chegar a um consenso sobre o que seja spam, aparentemente o juiz Martin Schulze, da 3? Vara de Feitos da Fazenda Pública, não apenas sabe o que nenhum internauta sabe: tem absoluta certeza.
A decisão surpreende? Claro que não. Casagrande ganhou notoriedade pela contundência das críticas que faz ao governo de seu estado. Por isso, cometeu um erro irrecuperável: contar com os serviços da estatal Procergs (Companhia de Processamento de Dados do Estado do Rio Grande do Sul) para a distribuição de seu boletim.
Como a Procergs era a primeira a saber que o jornalista tinha 25 mil assinantes, daí era um pulinho para que alguém no Palácio Piratini tomasse ciência do alcance da newsletter. Foi isso? Talvez sim, talvez não. Eis as duas hipóteses: ou o magistrado sabia do que estava julgando e se deixou usar como instrumento de retaliação do Poder Executivo gaúcho, ou o juiz decidiu na escuridão, sem saber lhufas de internet, e-mail, newsletters e spam. Ou é manipulado, ou é inepto.
Diego Casagrande não foi o único jornalista do Rio Grande do Sul a passar maus bocados nos tribunais. Ainda recentemente, José Barrionuevo e Marcelo Rech também foram condenados por críticas ao governo gaúcho. Diante do desagravo de jornalistas e intelectuais, o Piratini contra-argumentou numa nota oficial que diz que….
Vexame imerecido
"…o governo Olívio Dutra defende com veemência a liberdade de imprensa, porém, entendemos que, quando manifestações passam das críticas para o campo da difamação, o Poder Judiciário é o espaço para buscar o reparo às ofensas. Tanto é assim que jornalistas ou empresas de comunicação quando sentem-se ofendidos também recorrem ao Judiciário para a sua defesa". Por fim, criticou os que se dizem "defensores da liberdade de imprensa" e, ao mesmo tempo, "atacam a autonomia e independência do Poder Judiciário, garantia da existência do Estado Democrático de Direito".
E onde está a Federação Nacional dos Jornalistas quando mais se precisa dela? Defendendo a posição do governo estadual. Curiosamente, nem precisei ir à internet em busca desses dados. Veio tudo num boletim da CUT/RS que me foi enviado de uma caixa postal eletrônica da UFRGS (eu mesmo, como contribuinte federal, pago por isso!), sem que tivesse sido solicitado. Esse, sim, é um spam deslavado.
E não é o único. Da mesma forma, há meses tenho sido regularmente bombardeado por boletins do Fórum Social Mundial, invariavelmente originados de <rs.gov.br>. Para esses, independentemente do conteúdo, o juiz Martin Schulze vai se comportar como a gente espera que se comporte um magistrado?
Duvido que isso ocorresse com tal desfaçatez entre cariocas, paulistas ou brasilienses: diante de fatos escandalosos ocorridos na terra dos pampas, lá embaixo no mapa, longe do Equador, tudo que dizem no fantasioso eixo cultural brasileiro é: "ainda bem que não sou gaúcho." O belo e valente Rio Grande do Sul não merece esse vexame.
(*) Jornalista especializado em informática; newsletter: http://br.groups.yahoo.com/group/pcbarreto/