TEORIA & PRÁTICA
Brent Cunningham (*)
"Mero conhecimento, como mera escrita, é um equipamento de tão pouco valor para o jornalista quanto metade de uma tesoura é para o alfaiate que está tentando fazer um terno." [Talcott Williams, primeiro diretor da Escola de Jornalismo de Colúmbia, 1912]
A idéia de equilíbrio parece ser uma boa maneira de começar minha viagem pelo ensino de Jornalismo, já que em muito do que foi dito e escrito sobre isso recentemente faltou um pouco de reportagem.
O que escolas de Jornalismo devem ensinar? Um equilíbrio entre conhecimento e prática foi claramente o que Joseph Pulitzer tinha em mente quando pensou em criar uma escola ? ainda que de graduação ? em Colúmbia num comunicado de 1902. Mas, quando Lee Bollinger, novo presidente de Colúmbia, interrompeu a busca pelo novo reitor da escola de Jornalismo em julho deste ano e declarou que era preciso repensar sua missão, ele atiçou as chamas de um debate existente desde os dias de Pulitzer, nunca inteiramente resolvido. Um artigo do New York Times de 1932, por exemplo, sobre a inclusão de "instrução profissional" no currículo da escola, citou o reitor Carl Ackerman: "Nós acreditamos que devemos tentar superar a lacuna entre o ambiente protegido da educação e o ambiente desamparado da vida num jornal…". Outro artigo do Times, este de 1983, começa desta maneira: "A administração e os professores da Escola de Jornalismo da Universidade de Colúmbia estão envolvidos num debate sobre o que a instituição, a mais conhecida do país, deveria estar fazendo e como deveria estar fazendo".
Minha própria concepção de ensino do Jornalismo foi tudo, menos equilibrada. Quando aprendi a escrever para jornais nos anos 80, as escolas de jornalismo ainda ensinavam a pirâmide invertida e a noção (hoje aparentemente fora de moda) de que um repórter, armado de um bloco de notas, uma caneta e ceticismo saudável, poderia cobrir qualquer coisa; de que você sai e aprende o que precisa saber a cada matéria.
Jornalismo, afinal, não é um corpo de conhecimento da mesma maneira que Direito, Física ou História. É um processo de investigação cuidadosa. Nosso trabalho é tentar entender as coisas, e para isso às vezes é útil fazer uma pergunta desinformada.
Então, quando Bollinger disse que ensinar "prática" era útil, mas insuficiente, minha reação inicial foi recolher-me à segurança da caverna dos preconceitos. Eu fiquei preocupado com que ele transformasse Colúmbia num lugar onde os estudantes não cubram mais as vidas dos pobres do South Bronx, mas sentam-se para discutir coisas como "os efeitos dos links, os tipos de matéria e as variáveis da personalidade na percepção dos leitores e o uso da reportagem de crime em jornais online".
Meus editores, no entanto, insistiram em que eu descobrisse que coisas revolucionárias estavam ocorrendo em outras escolas de Jornalismo, para ter uma idéia do que Bollinger tinha em mente. No começo eu resisti. Estava em conflito por três razões, argumentei: como formado pela escola de Jornalismo de Colúmbia, como editor-administrativo desta revista [Columbia Journalism Review] e como integrante do corpo docente auxiliar da escola. Mais razão ainda para prosseguir, eles responderam.
A matéria realmente pareceu oportuna. O fim do século 20, e o aumento correspondente da internet, estimulou experimentações na academia. Todo mundo está testando algo novo, e na maioria dos lugares isso é tratado não como uma tentativa herética de reescrever textos sagrados, mas um processo evolucionário para assegurar que o ensino de Jornalismo mantenha-se em dia com o mundo em mudança. (Ei, mídia de Nova York, vocês sabiam que a Northwestern?s Medill School acaba de começar ? sem fazer barulho ? uma revisão de seu currículo?) Este debate não é novo em Colúmbia, também. Nos últimos cinco anos, houve dois grandes estudos de comitês externos sobre como melhoria da escola. Agora mesmo, enquanto Bollinger tenta persuadir uma força-tarefa formada por estrelas a virar uma máquina eficiente de repensar o currículo, um grupo de professores e administradores da escola está usando 500 mil dólares do gabinete do reitor para desenvolver um programa experimental de mestrado de dois anos, para talvez uma dúzia de estudantes ao ano.
Quanto mais eu me aprofundava no assunto, mais percebia que nunca fiquei totalmente à vontade com minha posição inicial de defesa. Por um lado, o debate sobre o ensino de Jornalismo sempre foi encarado como acadêmicos versus praticantes, como se o que os jornalistas fazem é menos rigoroso intelectualmente do que acontece na academia ? o que é ridículo, principalmente quando você considera que os jornalistas têm o fardo de fazer sua pesquisa inteligível ao resto do mundo.
No entanto, se você não pode repensar numa universidade, onde poderá? O mundo está interconectado agora de tantas formas, e o ritmo e o volume da informação é assustador; a contabilidade evasiva da Enron, bioterrorismo, aquecimento global, islâmicos radicais ? tudo requer uma certa sofisticação só para saber que perguntas fazer. "Não sei se dá mais para dizer que, se eu sei como reportar, editar e escrever, posso penetrar em coisas como estas", diz Trevor Brown, que dirige a Escola de Jornalismo de Indiana. Ao mesmo tempo, coisas como a internet, propriedade pública e fusão estão fundamentalmente mudando a mídia ? e nem sempre para melhor. Jornalistas e o ensino de Jornalismo devem tentar entender, explicar e navegar (ou em alguns casos resistir a) nestas ondas.
Todo mundo precisar ir à escola de Jornalismo? Claro que não. Mas nestes dias, quando a maioria das redações não investe muito tempo em treinamento, as escolas não são irrelevantes. A questão então é: o que os jornalistas precisam saber e quanto se pode esperar que as escolas ensinem?
1. Ponto de partida
Antes, uma palavra ou duas sobre o que realmente acontece em Colúmbia. Sugerir, como alguns críticos fizeram, que os estudantes aprendem aqui pouco além de como escrever leads e entrevistar fontes não é exato.
Reportagem e Escrita I, a alma do programa de Colúmbia, na qual estudantes passam o primeiro semestre cobrindo notícias dos bairros de Bronx a Coney Island, pode ser um campo de treino rico ? muito melhor do que um trabalho de iniciante que pode plantá-lo numa sucursal suburbana onde se espera que você produza duas matérias por dia para um editor que ou não é bom ou não tem tempo nem inclinação para ensinar. Meu bairro era o East Harlem. Durante o semestre ? sob a orientação habilidosa da minha professora LynNell Hancock (veterana de Village Voice, Daily News e Newsweek) ? eu escrevi sobre coisas como a taxa de casos de asma do bairro, que está entre as maiores do país; a tentativa de bloquear o fluxo de lojas como Costco e Wal-Mart; o relacionamento complicado entre os missionários ingleses que dirigiam programas sociais úteis ao desenvolvimento do East Harlem nas décadas pós-Segunda Guerra, e o crescimento das lideranças latinas. Não eram matérias de uma única fonte, escritas na forma da pirâmide invertida. Eram lições de realidade em desenvolvimento urbano, saúde pública, política, raça e questões de classe, além de exercícios sofisticados de escrita.
Outro professor, Samuel Freedman, cria debates de duas horas sobre os tópicos que os alunos de Reportagem I estão cobrindo. Os debatedores da aula de 6 de setembro sobre imigração foram típicos: Somini Sengupta, repórter do New York Times, Philip Kasinitz, professor de Sociologia do Cuny Graduate Center, e Chelley Gordon, advogada de imigração da Diocese Católica do Brooklyn. Um pouco além de "quem, que, quando, onde e por quê", embora os estudantes aprendam isso também.
Meu colega da Columbia Journalism Review Mike Hoyt, também professor auxiliar, observa que as perguntas com que os estudantes voltam das aulas de Reportagem I não são nada básicas. Na semana em que nos falamos, um estudante queria seu conselho sobre como se aproximar de uma prostituta de 17 anos vítima de estupro; outro precisava de ajuda para lidar com a reportagem sobre um professor famoso de escola pública que confessara ter problemas emocionais e nenhum relacionamento fora da sala de aula. Um terceiro queria uma maneira de descobrir o que acontece nas audiências secretas do Serviço de Imigração.
O regime de Colúmbia oferece uma educação pelo menos tão valiosa quanto a que você pode obter lendo um livro ou ouvindo uma palestra (estudantes fazem isso, também). Você aprende como as coisas realmente funcionam, e não como deveriam ser. O corpo docente é formado por jornalistas da ativa. Eles ensinam o que sabem. Por que não aceitar que isso seja o mais importante em qualquer escola que treina pessoas para serem jornalistas?
Nada disso é para dizer que não há muito a ser feito para melhorar o programa de Colúmbia. A qualidade da experiência de Reportagem I pode variar dependendo do professor, por exemplo; e os estudantes vêm para a escola de Jornalismo com uma grande variedade de necessidades, então agrupá-los num único caminho num pacote de 10 meses pode não ser a melhor solução.
Eu comecei a dar uma olhada ao redor, ver o que as outras escolas estão fazendo.
2. Novas idéias
Muito da experimentação nas escolas de Jornalismo (limitei-me aos programas de pós-graduação) caem em duas categorias: aumentando e aprofundando os assuntos estudados, ou dando aos alunos flexibilidade para montar seu próprio curso. O tipo anterior meio que necessita deste último.
Usar os recursos de uma universidade maior é uma maneira óbvia de expandir o currículo. Há várias maneiras de fazer isso. As escolas estão exigindo cursos de métodos de pesquisa quantitativa e qualitativa, por exemplo, e desenvolvendo programas de pós em conjunto com Direito, Saúde Pública, Religião, Administração e Artes. Acrescentar uma proficiência em língua estrangeira está entre as coisas que a escola de Medill considera em sua revisão de currículo. Em algumas escolas, professores de Jornalismo lecionam em outros departamentos. Na USC, Michael Parks, ex-editor do Los Angeles Times que dirige o Departamento de Jornalismo, terá uma entrevista na Escola de Relações Internacionais, onde está desenvolvendo com um professor um curso chamado Negociando e Cobrindo a Mudança Global.
Isso chamou minha atenção. Esses cursos híbridos ? se dados por um jornalista e por um acadêmico ? parecem uma boa maneira de adaptar o assunto às necessidades de um jornalista. Robert Schmuhl montou um programa interessante na Notre Dame envolvendo essa proposta interdisciplinar. Lançado em 1997, a John W. Gallivan Program in Journalism, Ethics and Democracy é um programa para estudantes de graduação (não há mestrado ou pós em Jornalismo na Notre Dame). Os alunos têm cinco disciplinas, e não mais do que duas podem ser de reportagem e técnicas de escrita, e um estágio. O resto é selecionado de uma quantidade de opções, incluindo disciplinas desenvolvidas para estudantes de Jornalismo por professores de outros departamentos. A aula de Ética, por exemplo, é dada pelo Departamento de Filosofia; História do Jornalismo, pelo Departamento de História. Estas classes misturam alunos de Jornalismo e de outros cursos, o que ajuda a enriquecer os debates.
No Missouri eles tentam fundir o acadêmico e o prático em tudo o que fazem. Por exemplo, cada projeto de mestrado ? o equivalente jornalístico de uma tese ? deve ter um componente de pesquisa, e o comitê da faculdade que avalia o projeto deve incluir um acadêmico. Educar em equipe é outra maneira de fazer isso. Esther Thorson, reitora associada de pós-graduação, ministra um curso sobre reportagem com uma abordagem de saúde pública junto com um redator de ciência free-lance, um especialista em saúde pública, um expert em jornalismo online e um repórter investigativo. "Para mim", diz Thorson, "a escola de Jornalismo dos sonhos é a que esteja ligada a acadêmicos, estudantes de doutorado, redações, gente na linha de frente. O isolamento é a pior coisa que pode acontecer a uma escola de Jornalismo."
Em Berkeley, o reitor Orville Schell diz que estava incerto sobre a escola de jornalismo quando chegou em 1996. Desde então, ele tentou criar o que chama de "um laboratório em que os estudantes podem fazer residência". Isso requer uma abordagem mais solta, mas que permaneça ancorada ao ensino de reportagem e redação. "Basicamente, sou a favor de qualquer coisa que um professor queira ensinar", diz Schell, "contanto que isso ajude a produzir jornalistas instruídos e conscienciosos". Para este fim, Schell deu uma aula sobre leitura de Shakespeare e diz que gostaria de ministrar uma para ouvir e refletir sobre música clássica. Há também matérias sobre romances políticos, cobertura de intervenções humanitárias e filantropia e redação de "perfis heróicos sobre pessoas comuns". Diz ele: "O desafio para as escolas de Jornalismo é os professores se perguntarem: como aprendemos a nos tornar jornalistas? Eu aprendi após inúmeras horas de trabalho com editores talentosos do New Yorker. Muitos não aperfeiçoaram a idéia do aprendiz desde a Idade Média".
3. Um tamanho não serve para todos
Para aproveitar toda essa profundidade e amplitude, no entanto, os estudantes precisam de um espaço de manobra. Em 1999, a escola de pós-graduação da Universidade da Carolina do Norte tinha substituído seu tradicional currículo seqüencial com o que Patrícia Curtin, coordenadora do programa de mestrado, chama de "estilo cardápio chinês". Os estudantes que entram ? de 25 a 30 por ano ? trabalham com conselheiros para traçar um plano de estudo baseado em seu objetivo e histórico. Em Illinois e Medill, estudantes que demonstram capacidade de fazer reportagens básicas e escrever notícias podem pular os cursos do primeiro semestre.
Os estudantes também precisam de tempo. Medill acrescentou um trimestre opcional ao programa para permitir que os alunos possam viajar para trabalhar. A começar no ano que vem, a Universidade de Boston vai adicionar um terceiro semestre obrigatório ao programa de mestrado em Jornalismo Impresso, Online e Fotográfico. Ela já tem o que é chamado de Programa de Estudos Avançados em Jornalismo, que permite que os estudantes que tenham terminado o mestrado (ou jornalistas profissionais que queiram aprofundar conhecimentos e habilidades) cursem mais um semestre de especialização. "Há tantas disciplinas eletivas na escola de Jornalismo, para não mencionar o resto da universidade, que os estudantes não tinham tempo para cursar", diz Nancy Day, que leciona em Boston. Os estudantes de Colúmbia experimentam uma frustração parecida.
Acrescentar esses semestres e cursos traz complicações de tempo e dinheiro, o que é parte do quebra-cabeça, especialmente num lugar como Colúmbia, onde a mensalidade já é cara. Isso me faz pensar o que acontece com o treino de habilidades. Missouri coloca seus estudantes de mestrado em Jornalismo Impresso no campus duas semanas antes do começo do semestre, para um intensivo de 12 dias de reportagem e redação. "Assim", explica Esther Thorson, "não ficamos repetindo a pirâmide invertida durante o semestre". A idéia parece atraente, mas meus estudantes deste semestre ? mesmo aqueles que chegaram com experiência profissional ? estão apenas agora, após dois meses, mostrando avanços reais na reportagem e na escrita.
Não é de surpreender que eu tenha descoberto que esta nova reflexão sobre a escola de Jornalismo coincidiu com o crescimento da internet. Nos anos 90, as escolas criaram centros de mídia online. O próximo passo, em alguns casos, foi renovar o currículo em torno da idéia de convergência, ou ensinar os alunos a trabalhar e pensar em "plataformas múltiplas".
Ao que me consta, um currículo convergente significa ensinar os estudantes a escrever tanto para televisão quanto para veículos impressos, saber se virar com uma câmera de vídeo e com um sítio de internet, e pensar tanto visualmente quanto textualmente. A Universidade do Kansas fez isso em 1999 (apesar de alguma resistência do mestrado em Jornal Impresso); a USC introduziu currículo convergente este ano, e Medill está falando sobre isso. Berkeley e USC agora oferecem aulas sobre web logs, ou blogs. "De certa forma, estamos preparando estudantes para trabalhos que não existem", diz James Gentry, reitor da Escola de Jornalismo do Kansas. "Mas sabemos que estão chegando."
Tudo soava muito bem. Então liguei para Jay Rosen, chefe do Departamento de Jornalismo da Universidade de Nova York (e autor do livro Para que servem os jornalistas?), onde o debate sobre o que ensinar dividiu os professores no fim dos anos 90. Rosen argumenta que criar novos cursos e centros não é suficiente. O jornalismo precisa primeiro ser "redefinido", diz, e só então pode ser estudado de uma nova forma. "Não acho que a descrição tradicional do que jornalistas fazem é correta. Reportagem, precisão, equilíbrio, critério de notícia ? isto obviamente faz parte do que os jornalistas fazem. Mas eles também legitimam pessoas e idéias, e tiram o crédito de outras. Eles formulam discussões. Eles são cronômetros, placar de contagem, amplificadores. Mas estas coisas geralmente não são ensinadas nas escolas de Jornalismo." Rosen diz ter idéias de como traduzir esta filosofia em educação, mas quer tentar antes com seus estudantes da NYU antes de dividir com os leitores da CJR.
Colega de Rosen e experimentador da NYU, Mitchell Stephens estava mais disposto a dividir. Eu assisti a uma aula de Stephens este semestre chamada Repensando o Jornalismo. É uma aula de graduação com quatro estudantes, na qual, de acordo com a descrição do curso, "os alunos pensam sobre as limitações do jornalismo contemporâneo (…) e experimentam com matérias ? para impresso, vídeo e web ? planejadas para superar tais limitações".
Os alunos lêem não-ficção e romances, de Nickel and Dimed, de Barbara Ehrenreich, a Insustentável leveza do ser, de Milan Kundera. Eles produzem vídeos, montam sítios de internet e tentam, como Stephens diz, "encontrar um caminho de usar este novo meio para dizer algo mais profundo". No dia em que estive lá, os estudantes leram os primeiros parágrafos de uma matéria do New York Times e discutiram a voz, ou a falta de voz, no texto. Então eles leram trechos de Tom Paine, Ernie Pyle, Ernest Hemingway e outros, e discutiram como o artigo do Times poderia ser reformulado com uma voz diferente, e se eles queriam isto do jornal diário. "Não estou certo se a resposta para tornar o ensino do jornalismo mais intelectual, ou algo assim, é apenas acrescentar um punhado de cursos de filosofia e história", disse Stephens mais tarde. "É tê-los lendo gente como Virginia Woolf e ver o que eles podem nos dizer sobre o que fazemos hoje. Temos a responsabilidade de experimentar com maneiras de fazer isso melhor.?
4. Capital intelectual
Além da parte profissionalizante, a outra crítica às escolas de Jornalismo tem sido a de que, ao contrário dos cursos de Direito ou Administração, elas não são think tanks da profissão, lugares onde se produzem novas idéias úteis e ajudam jornalistas da ativa a resolver problemas.
A razão para isso é que os acadêmicos ? especialmente teóricos da comunicação de massa ? tipicamente não entendem a redação, e as redações estão cientes dessa crítica de fora, em especial de professores de jornalismo.
Há tentativas dentro da academia de mudar isso, de produzir idéias e pesquisa que são úteis a jornalistas na linha de frente. Phil Meyer, que leciona na Universidade da Carolina do Norte, está tentando desenvolver uma maneira de quantificar o jornalismo para que possa ser usado por analistas e investidores como fator de avaliação das ações de uma empresa jornalística. Jay Harris, ex-editor do San Jose Mercury News, dirige o novo Center for the Study of Journalism and Democracy na USC; na lista de coisas a fazer está encontrar meios de a mídia engajar as pessoas civicamente. E o Centro de Pesquisa Social Avançada da Escola de Jornalismo do Missouri, trabalhando com o Tampa Tribune, está começando um projeto de pesquisa em convergência que tentará resolver o "problema de ritmo" ? que significa que a academia se move como uma geleira, enquanto a redação quer para ontem. Estudantes de doutorado vão fazer parte do trabalho, e alguém do centro vai avaliar o projeto diariamente, conferindo o progresso e fazendo ajustes. "Este será o protótipo de um projeto de pesquisa, e veremos se funciona", diz Esther Thorson.
Suponho que estas são coisas que escolas de Jornalismo deveriam estar fazendo, mas continuo voltando a algo que James Carey, especialista em jornalismo que leciona em Colúmbia, disse: "Eu quero manter o foco no ensino de Jornalismo no mundo lá fora, não dentro da profissão", diz ele. "O teste, tanto para a pesquisa dos docentes e seus esforços criativos quanto para o currículo, é se isso melhora a educação do jornalista."
5. Minha escola dos sonhos
Após falar com tantas pessoas e refletir mais em um mês sobre ensino de Jornalismo do que em todos os anos anteriores, eu me vi construindo um esboço do meu ideal de escola. Aqui está:
** Ela deve funcionar com menus, para que os estudantes, com ajuda de conselheiros, possam montar um programa que faça sentido para eles. Tal abordagem reconhece que as pessoas procuram a escola com necessidades diferentes. Eu vim com cinco anos de experiência num jornal diário, mas não queria me especializar. Queria trabalhar com redação para revista e ficar ligado à indústria de revistas, mas para fazer isso tive que tolerar alguma redundância.
** Haveria um núcleo obrigatório do currículo, o menor possível, e isso também poderia variar com o aluno. Se alguém tem o diploma de Direito talvez não precise de aulas de Legislação Jornalística. Mas se ele quer ser um correspondente no exterior e fala apenas inglês terá que ter aulas de línguas estrangeiras. A maioria dos estudantes teria que ter aulas de estatística e métodos de pesquisa ? ambas adaptadas às necessidades de um repórter ? e reportagem assistida por computador. Poderia haver disciplinas sobre coisas como interatividade e movimento de open source [grupos que pregam a liberação do código-fonte dos programas de informática, em contraposição ao código proprietário, como no modelo Microsoft] (ministrado por pessoas que possam ligar o tema ao jornalismo); mais importante, a idéia da educação tecnológica filtraria tudo, para que os estudantes possam ao menos trabalhar com mídia convergente.
** Haveria opções de um ano ou dois, e talvez períodos intermediários e complementares, como um certificado da Universidade de Boston. Se alguém quisesse ficar um ano e focalizar o básico da reportagem e da escrita, poderia. Se um estudante decidir, na metade de um programa de um ano, que quer ficar mais um para se especializar, e puder justificar isso, poderia. O processo de admissão seria mais direcionado para assegurar que os vários caminhos tenham uma massa crítica de estudantes.
** Haveria graus duplos disponíveis em qualquer coisa que tivesse sentido ? Direito, Administração, Relações Internacionais, Religião, Economia. Mas também haveria cursos híbridos e uma ampla seleção de disciplinas eletivas disponíveis tanto na escola de Jornalismo quanto fora, que permitisse aos estudantes aprofundar-se em matérias que se aplicam ao seu programa de estudo. Por exemplo, parece óbvio que a Escola de Jornalismo de Colúmbia tenha algo a ver com o Hechinger Institute, da Teachers College, que trabalha para melhorar a cobertura da educação. O mesmo com os institutos, centros e programas no campus. Acha que o pessoal do Institute of War and Peace Studies pode saber uma ou duas coisas que interessam a um repórter? Que tal o Center for Urban Research and Policy? Ou a ala de saúde pública da Escola Médica?
** Haveria opções de fotojornalismo e filme-documentário, e um componente de educação continuada, com cursos curtos e programas mais longos como o Arts Journalism de Colúmbia e as bolsas da Knight-Bagehot. Parcerias com a mídia nesta área assegurariam uma provisão de estágios curtos e longos.
** Estudantes poderiam ter seu próprio jornal, sítio de internet, emissora de rádio e operação de notícias de TV.
** Finalmente, haveria um think tank ligado à escola, afiliado ao programa de Ph.D. e relacionado a outros acadêmicos da universidade; seria um lugar onde pensadores procurariam maneiras de melhorar a prática do jornalismo, tanto como negócio como editorialmente, e também onde organizações de mídia procurariam ajuda para assuntos imediatos. Poderia envolver a busca por um modelo de administração do jornalismo online, ou uma exploração das implicações da explosão da banda larga.
Mas o núcleo da escola ? e do professorado ? seria sobre a boa reportagem e a redação.
6. A essência do assunto
Talvez o debate sobre o que as escolas de Jornalismo devem ensinar nunca tenha sido resolvido porque não deveria ser. Se jornalismo é dar sentido ao mundo, e o mundo está sempre mudando, então deveriam sempre existir pessoas procurando maneiras de melhorar o jornalismo. Mas, ao mesmo tempo, a alma do bom jornalismo ? reportagem robusta, extensa e redação clara ? nunca mudou, e não deveria. Jornalistas, diz James Carey, são pessoas com as quais a sociedade conta para dizer: "O que diabos está acontecendo na economia? O que raios acontece com o sistema educacional?"
Mesmo se a interatividade da internet mudar radicalmente a relação entre jornalistas e o público, ainda haverá repórteres que investigam corrupção no conselho escolar, que nos dizem como nossos impostos estão sendo gastos, explicam as complicações da religião, do dinheiro ou da ciência. Quem fará isso se não os repórteres? Equipes de vigilantes armados com toda a informação acessível e o poder de comunicação não tornarão os jornalistas obsoletos.
Então, sim, eu quero Jay Rosen em minha escola redefinindo o jornalismo; e quero Mitch Stephens experimentando com interatividade. Mas quero LynNell Hancock, uma repórter que passou toda a carreira escrevendo sobre injustiça, me ensinando a descobrir as muitas maneiras como os pobres são maltratados nesta sociedade; e quero Samuel Freedman me ensinando a escrever um livro sobre isso.
Boa reportagem analítica e redação não são fáceis; não são coisas que você pega ao longo do caminho. Se não podemos conseguir que nossos estudantes cheguem a nossas melhores escolas de pós-graduação com ao menos uma educação sólida em artes liberais ? e talvez não possamos ?, então temos um problema muito maior do que se pode esperar que uma escola de Jornalismo resolva. Mas, como James Boylan, editor-fundador da Columbia Journalism Review, que está escrevendo um livro sobre a história da Escola de Jornalismo, diz: "Ninguém disse a muitos desses estudantes que escrever bem importa, que escrever mal, ou de forma confusa pode destruir o mais lúcido pensamento". Isso é importante ter em mente, já que muitos educadores com que conversei disseram que cada vez mais os estudantes em programas de pós-graduação têm pouco ou nenhum background em jornalismo. Não podemos dar aos estudantes conhecimento especializado em tudo que eles provavelmente vão cobrir em suas carreiras, mas podemos dar a eles valores, critérios e as ferramentas que os guiarão enquanto eles se educam sozinhos.
O ensino de Jornalismo continuará mudando, expandindo aquilo que as escolas sempre fizeram ? ensinar pessoas a reportar, escrever e pensar. O básico. "É interessante: quando você começa a experimentar, quantas velhas regras aparecem", disse Stephens, quando se viu criticando o trabalho de seus estudantes na aula de Repensando o Jornalismo com coisas como "Mostre, não conte", e "Não há o suficiente na matéria para sustentar o lead".
Então, sem dúvida, vamos continuar a repensar. Mas, nesta afobação impetuosa de revolução, deveríamos nos assegurar de que ainda podemos ser diretos e sinceros.
(*) Texto publicado na Columbia Journalism Review, nov/dez 2002; tradução da redação do OI
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