Monday, 23 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Em busca do tempo perdido

COBERTURA INTERNACIONAL

Não vai ser fácil desenvolver, de uma hora para outra, um jornalismo internacional de qualidade dentro de uma mídia acostumada a olhar o umbigo de seu país. Para alguns, o desafio é recuperar a seriedade no trato de notícias internacionais. Para Jim Rutenberg [The New York Times, 24/9/01], é duvidosa a competência da imprensa americana em informar o público sobre fatos importantes no Oriente Médio, além da luta entre israelenses e palestinos. Dessa forma, a audiência está pouco preparada para entender os processos que levaram aos ataques.

Alguns executivos da mídia americana chegam a procurar consolo na hipótese ? pouco provável ? de que a atenção do público pelo lado dos terroristas seja efêmera, de forma a não ser necessária a cobertura da guerra além-mar. Mas não tem jeito: o trabalho será árduo. De acordo com Tyndall Report, que monitora conteúdo de notícias na TV, em 2000 as agências internacionais foram responsáveis por apenas um terço do tempo nos telejornais das grandes redes em relação a 1989 (ano que registrou o pico de notícias internacionais).

As emissoras cortaram substancialmente o número de correspondentes além-mar, confiando em peso do que provém das sucursais de Londres. A ABC News, por exemplo, tinha 17 sucursais estrangeiras há 15 anos. Hoje, tem apenas sete. Em artigo publicado no Le Monde, o presidente da CNN International, Chris Cramer, escreveu que o fato de as concorrentes da CNN se aterem à cobertura nacional é "o pior crime jornalístico", porque abandonam o compromisso de "tornar interessante o que é importante."

Tom Wolzien, analista de mídia da Sanford C. Bernstein, disse que um conflito prolongado poderia pressionar as emissoras a organizar uma operação conjunta para conter gastos: seria o princípio do que mais se deveria evitar na imprensa de guerra: restrição de fontes e imagens.

EXPERTS DO TERROR

Desde 11 de setembro, a expressão "especialista em terrorismo" tem sido atribuída a cerca de três dúzias de acadêmicos, diplomatas, antigos militares e funcionários da inteligência americanos. O termo se refere aos experts que apareceram nos telejornais ou foram citados em veículos impressos. Mas o que a expressão omite, segundo Felicity Barringer [The New York Times, 24/9/01], são os interesses políticos e comerciais que estão por trás das fontes primárias de jornalistas que cobrem terroristas.

A tarefa de separar o que é conhecido do que é desejado ou acreditado, para depois tornar compreensível o material à audiência, atém-se a um grupo mínimo de jornalistas que fazem do terrorismo seu assunto preferido. No momento, estão no coração do que pode ser a reportagem mais importante de suas carreiras. Podem esclarecer por que aconteceram os ataques, contra quem o país lutará e o que os americanos devem temer.

Como suas fontes, chegaram aonde estão de formas diversas. Pela experiência cobrindo Oriente Médio e Irã, como Robin Wright, do Los Angeles Times, e Judith Miller, do New York Times; de reportagens policiais, como John Miller, da ABC News, que passou anos cobrindo a máfia em Nova York; de interesses pessoais, como Peter Bergen, da CNN, que é fascinado pelo terrorismo afegão desde a adolescência; ou de cobertura sobre inteligência, como Vernon Loeb, do Washington Post.

Além das empresas americanas, há a BBC, na Inglaterra, que cultivou conhecimento em movimentos terroristas. Al-Quds al-Arabi, jornal árabe sediado em Londres, e Ha?aretz em Israel, também fizeram desse tipo de cobertura uma rotina. Informações sobre terroristas, de acordo com o especialista Brian Jenkins, da Rand Corporation, tendem a ser filtradas por diferentes prismas. Ao mesmo tempo, "há a escola apocalíptica do ?você ainda não viu nada?, que inclui pessoas que há anos alertam sobre a ameaça de armas químicas e biológicas, de destruição massiça", afirma Jenkins. Para ele, a preocupação é legítima, mas no momento é apenas uma distração a mais. "Há, ainda, o fã-clube de Osama bin Laden", diz Jenkins, o que faz do "chefão" um suspeito no ataque do dia 11.

Jenkins diz que os jornalistas são treinados para dar sentido aos eventos e criar uma narrativa. Esse imperativo pode ser deformado inadvertidamente. "Os jornalistas contam histórias coerentes", diz. "A realidade é bem menos coerente. Para fazer uma reportagem coerente, repórteres podem contar a história errada."

    
    
                     

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