DIÁRIO DE NOTÍCIAS
"Posturas editoriais", copyright Diário de Notícias, 3/12/01
"Antes dos acontecimentos de 11 de Setembro, alguns leitores diziam encontrar no DN ?uma postura editorial de profeta da desgraça? (…) na maioria dos títulos de primeira página, ?em grandes parangonas, (…) de bota abaixo? (…) que nada contribuíam para ?um aumento da auto-estima dos portugueses e para uma cultura do civismo?. Era esta a opinião do leitor Brito Coelho.
Após o 11 de Setembro, as observações dos leitores à linha editorial do jornal reflectem a nova fase do mundo e dos media. José Tavares, residente nos EUA e leitor do DN on line, confessa-se ?desiludido? com o estilo adoptado pelo jornal: ?choca-me o belicismo (…) nas páginas e nos títulos do DN?. Títulos como ?Barril de pólvora?, ?Talibãs resistem?, ?Morto ou vivo? não correspondem, segundo diz, ?à informação e ao sentimento da imprensa séria dos EUA e do homem da ?rua?.
Outro leitor, Artur Nogueira, dirige os seus reparos ?ao facto de alguns estribilhos fáceis? e certos ?títulos e primeiras páginas (…) ecoarem em editoriais? do jornal. Para este leitor, o DN ?tem que decidir que jornal quer ser e que público pretende atingir?. Artur Nogueira confia no DN para a sua ?informação básica e (…) para a formação de opinião?, mas considera ?pouco responsável a forma como o jornal tem noticiado o ataque terrorista de 11 de Setembro?.
Um segundo tipo de reparos de leitores incide sobre os critérios de escolha dos entrevistados e dos temas da rubrica Inquérito.
João P. Tavares afirma que não o chocam os temas escolhidos, choca-o e provoca-lhe ?cansaço? o facto de ?as pessoas inquiridas serem, invariavelmente, as mesmas, com ?direito? a aparição, em alguns casos semanal ou quinzenal, o que (…) torna inútil a leitura das respectivas respostas, visto já se saber antecipadamente o que vão dizer?.
No mesmo sentido, Miriam Assor, contestou a pergunta ?Israel é um pais racista?? feita na citada rubrica no passado mês de Setembro. Segundo a leitora, ?trata-se de uma pergunta incoerente, (…) uma acusação grave e perigosa?, o que a leva a dizer que o DN não é isento ?na escolha dos entrevistados?.
Um terceiro tipo de questões colocadas por leitores, refere-se a colunas de colaboradores. Pedro C. de Menezes Cordeiro, coloca objecções ?à presença, nas páginas do DN, de artigos de opinião, de periodicidade regular, da autoria de personalidades que são candidatos em actos eleitorais iminentes?. O leitor não questiona ?o mérito dessas pessoas, (…) a importância das suas opiniões?, nem ?o direito do DN de escolher os seus colunistas?, felicitando-o por ?saber ter entre os seus articulistas gente (…) que representa bastante bem o País?. O problema que coloca ?é o de esse espaço de opinião poder ser utilizado, pelo candidato, como propaganda eleitoral (…)? ou ter esse efeito. Quando, acrescenta o leitor, entre os assuntos abordados nesses artigos ?se encontram questões relacionadas com o cargo a que se candidata o autor, a tendência será para que a expressão das opiniões constitua a publicitação das suas posições, gratuitamente, num jornal de grande tiragem?.
Dado que, segundo o leitor, apenas dois candidatos à Câmara de Lisboa escrevem semanalmente no DN e não lhe parecendo justo ?cercear a liberdade dos colunistas?, também não lhe parece justo que apenas esses ?disponham de uma tribuna que não é concedida aos demais?.
O director do DN, Mário Resendes, não concorda com as críticas, considerando algumas das observações feitas ?alusões vagas e equívocas?. Sobre a guerra, M. Resendes, afirma que ?o DN tem procurado? ? e em sua opinião tem conseguido ? ?informar com rigor, independentemente da posição editorial afirmada e das colunas de opinião que traduzem as mais diversas visões do conflito?. Diz, ainda, que ?os editoriais (…) sobre este assunto são claros sobre a posição do jornal e sobre aquilo que (a direcção) pensa estar em causa nesta conjuntura?.
No que respeita às colunas de colaboradores/candidatos às eleições autárquicas, o director sossega os leitores, afirmando: ?como é óbvio, as colunas em questão serão suspensas durante a campanha eleitoral?.
Não é suposto a provedora comentar o conteúdo dos editoriais e dos artigos de opinião publicados no DN, a não ser que não respeitem o estatuto editorial do jornal no que se refere à ?possibilidade de expressão e confronto das diversas correntes de opinião existentes no País?, o que, manifestamente, não é o caso.
Na medida em que a linha editorial do jornal não se exprime, apenas, através dos editoriais e que a primeira página diz muito sobre a sua orientação ideológica, compreende-se a relação que os leitores estabelecem entre ambos.
As colunas de opinião e comentário, são, por definição, abertamente subjectivas, assentando na honestidade intelectual dos seus autores, isto é, no seu compromisso de ?fazer jogo limpo? perante os leitores, a quem, por outro lado, é reconhecida a liberdade de resposta e crítica a esses textos. Aliás, em teoria, todo o indivíduo tem direito à liberdade de opinião e de expressão. Na prática, porém, esse direito está reservado apenas a uma ínfima parte de pessoas, entre as quais os jornalistas e os colaboradores dos órgãos de informação. Os ?novos media?, sobretudo a Internet, vieram alargar o direito à liberdade de expressão, mas a grande maioria continua excluída.
Bloco-notas
?Nuances? ? A questão da linha editorial não é encarada de uma maneira uniforme nos diversos jornais, quer no que respeita a tomadas de posição abertas e assumidas do jornal por determinadas causas, correntes ideológicas ou partidárias, quer relativamente a questões aparentemente mais técnicas, como sejam a assinatura, ou não, do editorial e a sua paginação. O editorial assinado, como é o caso do DN e, por exemplo, do Público, sugere que o que nele se exprime é a opinião do seu autor e não, necessariamente, a do jornal. Mas existem nuances. Nos acontecimentos de 11 de Setembro, os editoriais dos membros da direcção do DN coincidiram, entre si, no apoio à estratégia da coligação internacional, embora continuassem a ser assinados individualmente. Por outro lado, noutros assuntos, o mais recente dos quais é a questão da ?taxa de alcoolemia?, a direcção optou por uma posição ?institucional?, através de editoriais assinados apenas por ?A Direcção?. Mas existem outras práticas. Por exemplo, no Brasil os editoriais não são assinados.
Instituição ? De um modo geral, os editoriais são vistos pelos leitores como o espaço onde se exprime a opinião do jornal, enquanto instituição. Isso não significa que toda a redacção concorde com o que neles se diz. O estatuto editorial do DN define que o jornal ?assume a responsabilidade de emitir opinião própria, através de editoriais assinados pela direcção, sempre de acordo com uma linha editorial? que se define por um conjunto de princípios que enuncia. Já no que se refere às colunas de opinião, sejam de colaboradores sejam de jornalistas da casa, representam, apenas, a visão pessoal dos seus autores, o que não significa que não devam obedecer a determinadas regras, entre as quais respeitar o citado estatuto editorial.
O ?bom? editorial ? Não é fácil, definir o que é um ?bom? editorial. Mas o commitee do Prémio Pulitzer ? um dos mais importantes atribuídos, nos EUA, a trabalhos jornalísticos ? dá-nos uma ajuda: ?clareza de estilo?, prossecução de ?fins morais?, ?razoabilidade? e ?poder de influenciar a opinião pública no sentido que o seu autor considera ser o mais correcto?, são características que o commitee enuncia como condições para premiar um editorial. O commitee não se pronuncia sobre temas. Contudo, uma análise de alguns editoriais premiados sugere que a defesa do ambiente e dos direitos humanos, a pobreza, são os que têm merecido maior acolhimento.
Alguns exemplos ? Este ano, o Pulitzer premiou, no género editorial, David Moats, do Rutland Herald (Vt.), pela sua ?imparcial e influente série de editoriais sobre a polémica questão da união civil entre casais do mesmo sexo?. Trata-se de dez editoriais dedicados ao tema, em que o autor faz a defesa aberta e fundamentada do casamento entre pessoas do mesmo sexo. John C. Bersia, do jornal Orlando Sentinel, foi também distinguido pela sua ?apaixonada campanha editorial contra práticas de agiotagem no Estado?."