Tuesday, 26 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Experiência e muito debate

TJUERJ

Raphael Perret Leal (*)

O que faz a diferença entre nossa vidinha cotidiana de hoje e a vida de nossos ancestrais na Idade Média? A resposta é óbvia: carros, ônibus, telefones, televisão, energia elétrica e muito mais. Se hoje alcançamos um nível de evolução muito alto ? a despeito de algumas dúvidas originadas de certas irracionalidades do homem, que não fazem parte do âmbito deste texto ? é porque foram criados objetos, métodos e mecanismos que nos permitiram crescer social e tecnologicamente. Se foram criados tais objetos, métodos e mecanismos é porque alguém tentou, ousou, inovou… e conseguiu.

Quantos, antes de Edison, não tentaram a energia elétrica? Quantos, antes de Graham Bell, não procuraram se comunicar a distância? Não conseguiram ? faz parte do jogo. Escreveram seus nomes em suas histórias particulares, dos amigos e dos vizinhos, como inovadores e, quem sabe, loucos. Guardaram, porém, para si, o orgulho de terem procurado sair do status quo e conquistar objetivos que revolucionassem não apenas suas vidas, como também as de todos. Buscaram, pois, a evolução. Se ao menos tentaram, abriram portas para que outros, mais hábeis e mais sortudos, conseguissem.

Novidades surgem a cada instante, e nem sempre elas vêm prontas para o uso do homem. Precisam ser lapidadas, moldadas… mas como? Devem ser experimentadas. A internet é o exemplo mais recente. Recentíssimo. Sua disseminação ocorre meio que fora de controle. Páginas pessoais, endereços eletrônicos, serviços virtuais proliferam sem nenhum pudor. Nenhum ícone dessa nova Era Virtual se consolida com facilidade. A Microsoft é eternamente questionada. A America Online, pelo menos no início, teve dificuldades para penetrar no Brasil. Os provedores gratuitos prometiam revolucionar, e com certa razão. Resultaram em fracasso.

Em resumo, a internet ainda tem muito o que mostrar, mas talvez ainda não seja utilizada de forma ideal. Ela é "vendida" como uma novidade útil e inquestionável. Slogans tornam-se famosos, como "Compre computadores e tenha acesso à internet" e "compre seu carro pela internet", de forma que o objetivo seja "isolar" quem não tem a menor intimidade com o ciberespaço.

A profusão é desordenada, e as conseqüências tornam-se óbvias: diversos projetos virtuais submergem mais rápido que o Titanic. Achavam que a internet era um meio pronto para uso, que a fórmula era simples. Enganaram-se. É uma nova mídia que ainda engatinha, cujas nuances ainda estão sendo descobertas. Não que os tais projetos virtuais não devam existir. Pelo contrário. Porém, não apenas querendo se adaptar à rede, que ainda não detém uma forma definitiva. Esses projetos devem ser versáteis, de maneira que agreguem um objetivo maior: o da experimentação.

Doze mandamentos

Na terça-feira, 3 de julho, na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), a Faculdade de Comunicação Social promoveu um debate sobre Telejornalismo Online. Estiveram presentes Pedro Paulo Carneiro, da TVE-RJ (Rede Brasil), Luís Nachbin, da TV Globo, Cora Rónai, de O Globo, Luiz Carlos Bittencourt, professor da UFRJ, e Pedro Doria, do site no.com.br., além do anfitrião, Antônio Brasil, coordenador do TJUerj, telejornal online que estava sendo lançado oficialmente no dia do encontro.

Cada participante deu sua opinião sobre um assunto e, eventualmente, apresentou um projeto próprio que relacionasse web e comunicação.

Pedro Paulo Carneiro, diretor de TV, por exemplo, apresentou um vídeo que justificaria seu projeto, já em andamento, de uma emissora de TV exclusivamente via internet. Baseado em pesquisas e estatísticas, constatou que são necessários 12 mandamentos que um empreendedor de uma televisão online deve seguir fielmente ? baseado na existência atual de uma chamada "Geração Digital", encabeçada pelos adolescentes e intimamente ligada à interatividade e ao virtualismo:

1.
O programa deve ter 10 minutos de duração bruta
2. Conteúdo
específico e concentrado
3. Direcionado
aos jovens e adolescentes
4. Espelho
da verdade
5
.
Disponível 24 horas
6
.
Interatividade
7. Apresentadores
jovens
8. Conteúdo
jovem, arrojado e de cunho social
9. Dublagem
para inglês e espanhol
10. Constante
mutação
11. Cenários
próximos da realidade
12. Conselho
de 11 jovens

Pedro Paulo também constatou que as emissoras que estão na internet, hoje, repetem o mesmo formato da televisão convencional ? o que, realmente, não é muito inovador e algo inadequado. Faltou apenas comentar onde ficam os adultos e idosos nessa nova TV online.

A bola foi passada para Antônio Brasil. Rapidamente, fez comentários etários sobre o telejornalismo ("está envelhecendo, segundo pesquisas"), o que justificaria uma renovação na sua linguagem, e disse que a criação de um telejornal na Web é complicado porque "não se pode andar de bicicleta sem bicicleta", isto é, não há o que copiar. O pioneirismo é isso: a definição de um novo formato. Até chegar lá, vai demorar muito. Muitas vezes vamos cair da bicicleta.

Ainda em expansão

Em seguida, Pedro Doria sugeriu que nós, jornalistas, devemos procurar novas pautas, e não mais a briga de um deputado com outro, assuntos óbvios e manjados. "A internet continua sendo um espaço para se experimentar." Sugeriu também que o meio é uma ótima oportunidade para dar espaço a repórteres de áreas diferentes de Rio, São Paulo e Brasília, cidades que, segundo Doria, concentram as notícias que saem nos jornais.

Cora Rónai, mais sucinta, apenas expôs sua preocupação com a rigidez do controle sobre o conteúdo da internet. "Fechar um site fascista é uma atitude fascista", criticou. Luís Nachbin, videojornalista ? aquele que filma, escreve, fala, enfim, faz toda a matéria sozinho ? contou um pouco de suas experiências, curiosidades, mas não deixou de recomendar aos universitários: "Façam video-reportagem!" O repórter mostrou-se estarrecido com "o absurdo dos absurdos", que era o fato de recém-formados não saberem escrever textos para a TV. Sobre a internet, comentou que o preço das câmeras digitais está diminuindo. Mais acessível, esse belo instrumento pode ser eficaz para matérias "publicáveis" na web. De preferência, como video-reportagem.

Para finalizar, Luís Carlos Bittencourt falou de seu site, Telejornalismo.com, ainda não-pronto. Nele está hospedado o TJUerj <www.telejornalismo.com/tjuerj>), e da grande rede: "A internet é um campo que devemos usar para explorar novos campos profissionais. Não sabemos que empregos teremos daqui a alguns anos."

No geral, a conclusão que fica é similar à que chegamos antes dos comentários sobre o debate: a internet ainda é um meio em expansão e precisamos identificar qual a melhor maneira de a utilizarmos para nosso proveito. Algumas questões técnicas, se bem identificadas, serão úteis para determinar o melhor caminho para chegarmos ao formato definitivo de um veículo midiático quando inserido na web ? se é que o conceito de "definitivo" vale a pena, já que as modificações estéticas e tecnológicas surgem do nada, e velozmente.

Caminhos informacionais

O hipertexto, conceito difundido paralelamente à web, é uma forma não-convencional de escrita ? ou melhor, de comunicação. Em determinado ponto é permitido que o leitor/ouvinte/telespectador se dirija a diversos outros pontos, sempre relacionados de alguma forma com o anterior. Há vários caminhos informacionais sugeridos: o usuário escolhe o seu. Essa nova forma de comunicação apresenta diversas características que, apropriadamente, podem ser usadas de maneira eficaz na divulgação de informação e conhecimento:

a) O uso de links é fundamental. A informação não pode se restringir a um único sítio. Sempre há repositórios de conhecimento mais específicos ou mais abrangentes. Quebra-se a linearidade do texto, mas constrói-se um caminho mais útil ao usuário, pois é ele quem escolhe o que quer consultar.

b) As cores são abundantes. A estética e o design tornam-se atributos fundamentais para a qualidade do conteúdo. Saber destacar partes do texto, sutil ou exageradamente, é sinônimo de bom senso.

c) Há uma convergência de novas mídias. É necessário saber aplicar a melhor forma de veiculação de um fato ou opinião. Texto? Som? Foto? Vídeo? Tudo junto? Poder de síntese, obediência à verdade e qualidade de transmissão são os fatores que devem definir qual o melhor meio de comunicação para determinado conteúdo.

d) No rádio e na televisão os minutos são importantes. No jornal, os centímetros. Na web? Nada. O espaço é uma grandeza em extinção. Os links contribuem para essa expansão territorial do conhecimento. A sensatez determina os limites de um sítio: excesso de informação nauseia qualquer um.

e) Da infinidade de espaço decorre a facilidade da memória organizacional. Sistema de busca e de armazenamento de conteúdos antigos é sempre útil para se construir a informação presente e planejar a futura.

Lendo assim parece que a internet é, ao contrário do que afirmamos no início, a solução de todos os males. Ledo engano. Ainda há problemas a se resolver.

A criatividade é o meio

Fala-se muito que a internet é democrática. Será? Dados da Folha de S. Paulo ? apresentados por um espectador do debate da Uerj ? indicam que apenas 4% da população brasileira tem acesso à rede, e 80% são jovens. Como falar em democracia se há uma evidente segregação do meio?

Não podemos confundir: são poucos os obstáculos para quem deseja abrir um sítio na web. Um jornal universitário pode ocupar o mesmo espaço que um poderoso grupo de comunicação. Será ser mais competente aquele que empregar as melhores estratégias de disposição da informação. O problema, talvez, esteja na questão de quem lê/ouve/assiste: são poucos. É uma questão a se discutir, e cujo problema não está exatamente no preço do PC. Conforme afirmou sabiamente Cora Rónai, não é preciso ter computador em casa para acessar a rede. É hora quem sabe de estudar a criação de laboratórios públicos, webcafés e similares.

Outro problema visível é a conexão. A banda larga está crescendo, mas a maioria ainda usa o velho modem telefônico, que às vezes não fornece uma qualidade considerável de som e de vídeo, o que acaba inutilizando essas poderosas mídias.

E os idosos e adultos? A maior parte do conteúdo virtual é voltado aos mais jovens. Isso é pura discriminação. A geração mais antiga geralmente não se adequa ao dinamismo multitarefa dos sítios. Seria, porém, o caso de isolá-los desse novo fenômeno? Quem deve se adaptar a quem? A tecnologia ao homem ou o homem à tecnologia?

Dispomos atualmente de algumas conclusões. Afinal, sabemos do que a internet é capaz. Entretanto, saberemos de tudo? Estamos numa época em que errar, na web, ainda é possível ? imagine errar na televisão… Segundo Antônio Brasil, ou você perde audiência ou perde o emprego. Erremos, pois, e tentemos acertar, sempre experimentando, ousando, inovando. Convergiremos para um formato correto e eficiente de transmissão online de conhecimento. Mas que será versátil o suficiente para permitir modificações, com novas experiências, com o advento de novidades tecnológicas e, sobretudo, com a criatividade humana.

(*) Jornalista e analista de sistemas

    
    
                     

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