Friday, 27 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Felicity Barringer

MONITOR DA IMPRENSA


professor Al gore

“Aula de jornalismo do ex-vice exclui imprensa”, copyright O Estado de S. Paulo / The New York Times, 8/02/01

“A palestra de estréia de Al Gore na Faculdade de Jornalismo da Universidade de Columbia, terça-feira, foi a ocasião para que algumas dezenas de futuros jornalistas fizessem um curso prático e intensivo sobre os detalhes do ofício.

Lição nº 1: Se uma pessoa que merece ocupar espaço no noticiário diz ou não algo de interesse em sala de aula você não pode escrever sobre isso. (Na profissão, eles chamam essa convenção de ‘em off’).

Lição nº 2: Você também não pode falar sobre isso. Pelo menos foi essa a mensagem do reitor-adjunto da faculdade de jornalismo transmitida aos alunos por meio de mensagens eletrônicas. E, mais importante, eles aprenderam a lição nº 3: Muitas empresas jornalísticas estão dispostas a pagar-lhe para ignorar as lições 1 e 2.

No final, a primeira apresentação como palestrante de Gore – ex-vice-presidente e ex-repórter de jornal – teve um aspecto maravilhosamente paradoxal. De um lado, suas palestras podem dar aos alunos uma perspectiva única sobre o jogo entre políticos e a imprensa. Por outro lado, as restrições que cercam suas palestras poderão dar-lhes uma perspectiva singular sobre como os políticos tentam controlar a imprensa.

Todas as faculdades de jornalismo buscam ensinar aos estudantes como descobrir a verdade, mas turmas de jornalismo como a de Gore são em off.

O próprio ex-vice-presidente disse ao sair: ‘Creio que as aulas normais são em off e eles querem que as aulas sejam o mais normais possíveis. Eu teria a opção de pedir-lhes para gravá-las, mas acho que os alunos terão um melhor aproveitamento se for uma experiência de sala de aula o mais normal possível.’

Ah, mas ensinar estudantes de jornalismo a não agir como jornalistas é mais difícil do que parece. Quando Gore saiu do campus, os repórteres que estavam do lado de fora correram para contatar os estudantes e descobrir o que ele tinha dito na sua palestra em off. A grande notícia é que, embora tenha entrado no prédio 35 minutos antes do início da aula, Gore chegou na classe 15 minutos atrasado.

Ao chegar lá para a primeira de várias palestras, Gore fez um aquecimento contando aos cerca de 70 alunos, professores e funcionários ao menos uma das histórias de sua campanha, disse um dos alunos. A história, sobre um colega do Tennessee, que pediu a Gore que escrevesse um obituário de alguém chamado ‘Trebla Erog’ – Albert Gore escrito ao contrário – foi uma obrigatoriedade nos discursos para grupos como a Sociedade Americana de Editores de Jornais e a Associação Americana de Jornais.

Durante a palestra de 75 minutos, Gore também falou sobre o poder da TV na formação da opinião pública, no surgimento de novos programas de entrevistas e na ênfase do que chamou de notícias ‘derivativas’, como as especulações dos jornalistas sobre os métodos, motivos e chances eleitorais de políticos.

O que aconteceu dentro da sala de aula envolveu a teoria do jornalismo. Mas, do lado de fora do prédio, aconteceu o exercício real do jornalismo. Cerca de 25 repórteres, cinegrafistas e técnicos inclinaram-se sobre o cordão de isolamento e chamaram alto o nome de Gore, que foi saudado com perguntas feitas aos gritos.

Os alunos que chegaram depois de Gore tiveram oportunidade de observar um outro aspecto do exercício da profissão: apontaram-lhes microfones e perguntaram-lhes se estavam indignados porque o acesso às palavras de Gore foi negado aos leitores e telespectadores dos EUA.”

 

hollywood

“Hollywood corre o risco de ficar sem roteiros e sem fala”, copyright Valor Econômico / Financial Times, 6/02/01

“No hit de cinema humorístico dos anos 80 ‘Apertem os Cintos, o Piloto Sumiu’, quando um dos passageiros fica histérico, meia dúzia de outros fazem fila para estapeá-lo ou socá-lo.

Jerry Zucker, um dos três escritores-diretores do filme, sentado num escritório de Los Angeles, em 2001, recorda que o público adorou a cena desde sua primeira apresentação. Além de ser engraçada, ela mostrava a solução de uma crise na base do faça-você-mesmo: as partes envolvidas, em fila, aplicando um tratamento de choque no criador de caso em crise nervosa.

Uma crise nervosa – mais apocalíptica – pode estar iminente em Hollywood agora. Mas ninguém, à beira do que pode ser a maior crise industrial da história do cinema, consegue concordar sobre quem são os criadores de caso, os solucionadores e qual é a melhor solução, se um sopapo ou um bate-papo.

A semana passada assistiu ao início de negociações cruciais entre as administrações, representada pela Alliance of Motion Picture and Television Producers (AMPTP), e a comunidade de escritores para cinema, representada pela Writers Guild of América (WGA, o sindicato dos escritores).

Essas conversações ocorrem depois da paralisação de seis meses do ano passado, conduzida pela Screen Actors Guild (SAG, o sindicato dos atores) sobre pagamentos de royalties residuais por publicidade em TV a cabo – ‘a mais longa greve na história desta cidade’ – como afirmou, com orgulho, o presidente do SAG, William Daniels.

Os escritores, armados de 42 reivindicações para renegociar seus contratos trienais com os produtores, são os mais novos agitadores e parecem tão combativos quanto os atores no ano passado. Eles estão ameaçando parar à meia-noite de 1º de maio, deixando a indústria cinematográfica sem roteiros e sem fala. Esta quinzena de conversações, iniciada na segunda-feira da semana passada, pode ser a última chance de um entendimento antes da guerra.

Para complicar as coisas, os atores têm o próprio prazo – até 30 de junho – para discussões de contratos, o que faz a batalha do SAG do ano passado parecer brincadeira.

Se qualquer um desses sindicatos entrar em greve, a indústria poderá parar semanas ou meses. Nada de filmes novos. Nada de séries de televisão frescas. Nada da oferta regular de fofocas, frivolidades e cultura pop que chamamos de ‘Hollywood’.

E, se os chefões acham que sobreviver a 2001 significará a salvação, o Directors Guild of América (DGA, o sindicato dos diretores) está preparando suas negociações para renovação de contrato com os estúdios de 2002. O DGA vem endurecendo sua posição numa disputa fraterna com o WGA, cujas reivindicações incluem a abolição do crédito possessório do diretor (‘um filme de fulano’) e um acordo para garantir que eles possam participar de toda a produção do filme, da primeira leitura à estréia mundial.

O clima está tão quente que um porta-voz dos produtores disse: ‘O nível retórico de atores e escritores tem sido tão alto que pela primeira vez na história do setor, nós realmente acreditamos neles.’

Mike Mahern, o tesoureiro-secretário do WGA, diz que a greve dos atores do ano passado clareou uma verdade insofismável das relações de trabalho na capital do cinema: ‘Nós temos um poder de barganha excepcional porque ninguém pensa seriamente em recorrer à mão-de-obra temporária para substituir escritores, atores ou diretores.’

Mahern está certo, é claro, e os estúdios estão justamente preocupados. Não se pode simplesmente percorrer agências de emprego dos Estados Unidos e trazer os trabalhadores para Hollywood dizendo: ‘Seja Tom Hanks, ou Michael Crichton, ou Francis Ford Coppola.’ E também não é possível convocar o Exército, pois os filmes dificilmente seriam considerados serviços essenciais, exceto para nós, críticos de cinema, que estamos roendo as unhas até a raiz como todos os demais.

No plano financeiro, as reivindicações dos escritores envolvem pagamentos residuais por exibições em TV estrangeira, o mercado americano de cabo e DVDs e vídeos. Eles modestamente esperam, por exemplo, dobrar os 4 centavos que ganham com a venda por US$ 10, de um DVD ou vídeo.

Some-se a isso as queixas paralelas de atores sobre residuais defasados e o arrocho da remuneração dos atores médios de cinema para um mínimo de US$ 8 mil em resposta a honorários de US$ 20 milhões de superastros e pode-se perceber que, para os estúdios, o cenário está abarrotado de exércitos hostis.

Serão os chefões capazes de comprar a paz? Será que desejarão isso? Os lados contrários já se desentenderam sobre o custo de um acordo – os produtores dizem que seria de US$ 2,5 bilhões em três anos, os sindicatos defendem que ele custaria um terço disso, US$ 725 milhões. Mahern comenta, com humor negro, que ‘Hollywood está sempre à beira da falência quando há uma negociação de contrato’.

Uma fonte próxima aos estúdios replica que não há dinheiro escondido. ‘Somos companhias públicas com acionistas, agora. O fato é que a maioria de nossos filmes não dá lucro. O filme de estúdio médio custa US$ 55 milhões com custos de marketing de US$ 25 milhões. A bilheteria doméstica média não chega a isso. Então, o que estamos escondendo?’

Já as corporações donas de estúdio – Vivendi da Universal, Viacom da Paramount, Newscorp da Fox e o restante – estariam tão pessimistas com a lucratividade dos filmes que muitas poderiam facilmente dizer a seus chefões de estúdio : ‘Façam greve.’ (Tradução de Celso M. Paciornik)”

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