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ENTREVISTA / WASHINGTON NOVAES
Luiz Egypto
A edição da revista Science de 19 de janeiro publicou um estudo que ganhou repercussão imediata nos meios científicos e entre ambientalistas [veja remissões abaixo]. Sob o título "O futuro da Amazônia brasileira", a revista publicou um estudo de William Laurance, do Smithsonian Tropical Research Institute de Panamá, e Mark Cochrane, da Universidade do Estado do Michigan ? com apoio de pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia e da Universidade do Oregon ?, no qual alertam sobre os riscos potenciais do programa "Avança Brasil" ao ecossistema amazônico. Segundo os pesquisadores, em se mantendo as metas do programa e seu ritmo de implementação, até 2020 nada menos que 42% da floresta amazônica estarão destruídos. A matéria da Science repercutiu nos jornais The New York Times, The Guardian e The Independent, entre outros, provocando a reação do governo brasileiro por intermédio de suas embaixadas nos Estados Unidos e na Inglaterra.
Para comentar a polêmica, o Observatório da Imprensa entrevistou, por e-mail, o jornalista Washington Novaes ? um pioneiro na cobertura de questões ambientais na imprensa brasileira e, também por isso, reconhecido como navegador de longo curso no mar proceloso em que esse tema se converteu. A seguir, suas informações:
Washington Novaes ? Depende do ponto de partida, a taxa anual de desmatamento que se adote. Há divergências entre os cálculos do governo brasileiro e o dos cientistas, porque o primeiro exclui de seus cálculos taxas mais antigas (mais altas, e que puxam a média para cima), enquanto os cientistas as incluem e prevêem a possibilidade de entre 28 e 42% estarem desmatados. O fato é que já temos 11% da Amazônia desmatados. Mesmo com taxas um pouco mais baixas atualmente, na melhor das hipóteses chegaremos a 20% ou um pouco mais. O problema é que os projetos do programa "Avança Brasil", ora em curso, abrem novas frentes agropecuárias na Amazônia e aceleram o desmatamento e a substituição da floresta pela pecuária e pelo agribussiness.
Desde as primeiras discussões sobre a Agenda 21 brasileira, em 1999, vem sendo apontada por numerosos especialistas a inconveniência da abertura dessas frentes, até mesmo porque a quase totalidade dos solos amazônicos é inadequada para a agropecuária. Mas os planejadores oficiais têm feito ouvidos moucos, embora se diga que os projetos estão sendo revistos pelo ângulo ambiental ? o que parece pouco provável, porque essa abertura de novas frentes está entre os itens do orçamento da União com maior índice de execução.
Com 20%, 28% ou 42% da Amazônia desmatados por uma agropecuária insustentável e uma exploração florestal também fora de controle (BIRD e Ibama admitem que 80% da extração de madeira na Amazônia são ilegais), estaremos no centro de uma polêmica mundial.
W. N. ? Ainda que fossem 8% (mais 8%, com os quais chegaríamos a 20% no total), já seria muito ? centenas de milhares de quilômetros quadrados, dimensão de muitos países. E para uma ocupação inadequada. Não precisamos esperar que o estrago se consume para chegar a essa conclusão. Levamos 30 anos para concluir que era inadequado fazer reforma agrária na Amazônia. Mas enquanto isso, 88,15% das terras destinadas a esse fim, durante 30 anos, eram áreas florestadas, onde os projetos fracassaram. E ainda se esconde essa inadequação (não apenas o governo, mas também os defensores da reforma agrária), apontada em 1997 por uma comissão especial da Câmara dos Deputados, relatada pelo deputado Gilney Viana (PT). Com isso, a reforma agrária responde por metade do desmatamento já ocorrido na Amazônia (felizmente as autorizações para novos assentamentos em áreas florestadas foram suspensas). Da mesma fora, fazemos de conta que não ouvimos as advertências do núcleo da Embrapa que monitora a Amazônia por satélite, que diz que há 1.500 pontos novos de urbanização na Amazônia, que não estão no mapa mas avançam a cada dia.
A quantas andam os estudos de zoneamento ecológico-econômico da área amazônica que receberá projetos do "Avança Brasil", encomendados pelo presidente da República ao Ministério do Meio Ambiente à época do lançamento do programa?
W. N. ? Atrasados, com certeza. Em que estágio, só o próoacute;prio governo pode dizer. Mas é tarefa complexa, que exige a reunião de numerosos especialistas e estudos.
A comunidade científica do país tem participado dessas discussões? Foi consultada sobre os impactos ambientais do "Avança Brasil"?
W. N. ? Também só o governo pode informar qual foi o nível de participação. Aparentemente, foi pequeno, porque só há poucas semanas o governo anunciou que faria a revisão ambiental dos projetos ? embora continuando a implantação orçamentária, em muitos casos, mesmo em alguns projetos que já têm estudos alternativos mostrando sua inconveniência e inutilidade, como é o caso da hidrovia Araguaia-Tocantins.
A mídia brasileira tem acompanhado esse problema e cumprido seu papel de informar sociedade sobre os desdobramentos do projeto?
W. N. ? Muito pouco. Só quando se abre alguma polêmica, em geral a partir de notícias do exterior. Na verdade, meio ambiente não é tema prioritário da mídia em geral. Muito menos levado para onde deveria estar ? no centro e no início de qualquer política, como a realidade demonstra todos os dias ser fatal, com as informações sobre mudanças climáticas, escassez de recursos hídricos, insegurança alimentar, novos vírus e bactérias e novas epidemias (em geral por causa do desmatamento e invasão do habitat desses agentes e sua urbanização), esgarçamento da camada de ozônio, poluição do mar e depleção de seus recursos, inviabilização das metrópoles por fatores ambientais, poluição urbana etc.).
W. N. ? Reações de apreensão e críticas ao Brasil, com certeza. A Science é uma revista com muita credibilidade. E certamente ? como fazem todas as publicações desse tipo ? submete seus artigos, antes de publicá-los, à revisão de muitos cientistas e especialistas. Não é com bravatas, nem tentando desqualificar os autores do artigo ? como costuma ser hábito por aqui ? que se vai desfazer o clima. É com informação competente. E ações concretas e eficazes, a partir dessas informações.
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